João de Ruão e a escultura renascentista em Coimbra -- o ciclo do calcário.

24 Outubro 2019, 10:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

O escultor e também 'arquitecto' João de Ruão já está em Portugal em 1528, ocupado nas obras do portal da igreja da Atalaia, residindo em Coimbra a partir de 1529 e até à sua morte em 1580. Transforma-se no grande mestre escultor do calcário, material nobre e maleável, de fácil labor e com condições de transporte através da navegabilidade do Mondego. O artista era gaulês, de origem normanda, e pode ser rastreado logo em 1523 na Península Ibérica. Surge no nosso país trabalhando no âmbito mecenático de D. Pedro de Menezes, primeiro na igreja da Atalaia (1528) e depois na capela da Varziela (1529-1531), mas terá chegado algum tempo antes. Na documentação, de 1530, em Coimbra, publicada em 19223 pelo cónego Prudêncio Quintino Garcia, já aparece como sendo casado com Isabel Pires, filha do mestre régio de carpintaria Pedro Anes sendo, portanto, cunhado de Marcos Pires (o arquitecto que sucede a Boytac em Santa Cruz de Coimbra) e de Cristovão de Figueiredo, o pintor do Cardeal-Infante D. Afonso, o que atesta as relações privilegiadas com a cultura artística da corte. Inicia-se aqui a sua relação com a cidade do Mondego, aqui vivendo e trabalhando até 1580, quer para os crúzios quer para outros encomendadores de monta. 

João de Ruão reserva a inovação para estruturas reais, quer dizer para as estruturas retabulística e para o traçado de sacrários, assim como para a traça de arquitectura, com recurso às ordens e a uma inventiva notável, atribuindo a maior eficácia do seu discurso escultórico à figura humana. No relevo opta por representar estruturas de reconhecida eficácia, juntando vistas de cidade, com paisagem de modo a acentuar a composição e amiúde acentuar a perspectiva. Os seus discípulos, como Tomé Velho, continuam o seu modo, actualizando os motivos decorativos de acordo com a nova estética maneirista.