A definição da monarquia papal: a reforma gregoriana, o Venerabilem e a Unam Sanctam.

8 Outubro 2019, 14:00 Rodrigo Furtado

I.                Por que razão não era evidente uma resposta para a relação ‘hierárquica’ entre imperador/rei e os bispos?

1.      O Cristianismo como religião oficial (380): o edicto de Tessalónica. Problema: se o Império tem de ser cristão, quem assegura que isso aconteça? E se não assegurar?

 

II.              O princípio de Agostinho de Hipona / Gelásio I

1.      Agostinho de Hipona (bispo: 395-430): cidade de Deus / Cidade da Terra: dualismo humano (corpo/alma) / dualismo socio-político (império/igreja). A superioridade do espiritual sobre o temporal, mas sem submissão de um ao outro.

2.      Gelásio I (papa/bispo de Roma: 492-496): potestas vs auctoritas. O poder temporal trata das coisas carnais/inferiores para que o espiritual possa tratar das coisas da alma – a porta aberta para a intervenção unilateral.

 

Há duas ordens, ó Augusto imperador, através das quais este mundo é governado: a autoridade sagrada (auctoritas sacrata) dos pontífices e o poder real (regalis potestas). Contudo, o fardo colocado sobre os sacerdotes é o mais forte, porque são eles que têm de prestar contas no Juízo divino, mesmo pelos reis dos homens. Fica a saber, ó filho mais clemente, que, embora tenhas precedência na raça humana em dignidade, mesmo assim dobras o teu pescoço em submissão devota aos que presidem sobre as coisas divinas, e olham pelos meios da salvação. Participando dos sacramentos celestes. . . reconheces que estás sujeito à ordem da religião em vez de governá-la. . . Pois se os ministros da religião, reconhecendo que o teu governo lhes foi dado pela disposição divina, obedecem às tuas leis para que não pareçam obstruir o curso correto dos assuntos mundanos, com que boa vontade, ora, tu deves obedecer àqueles que foram encarregados da dispensação dos santos mistérios?

 

III.             Situações equívocas:

1.      As unções/coroamentos:

1.1   A unção dos reis visigodos pelo bispo de Toledo; o IV Concílio de Toledo e a deposição de Suíntila (633);

1.2   Carlos Magno e Leão III: 25 de Dezembro de 800.

1.3   Luís I e a coração de 814 pelo papa Estêvão IV: com a coroa com que Silvestre teria coroado Constantino.

2.      O poder do bispo de Roma:

2.1   Uma autoridade que se vai construindo: Leão I (440-461) e a primazia petrina.

2.2   Vai ganhando poder político: a representação da longínqua Constantinopla (até 751 em Roma e em Ravena): jurisdição civil e religiosa. 

2.3   Quando tudo muda: a Donatio Constantini – explicar retroactivamente o dia de Natal do ano 800. Uma falsificação extraordinária.

2.3.1        Concede ao papa Silvestre e sucessores poder imperial, dignidade de glória, força e honra;

2.3.2        Concede ao papa Silvestre domínio sobre toda a Igreja

2.3.3        Constantino oferece ao papa a coroa imperial; o Papa recusa-a e, por sua livre vontade, devolve-a a Constantino.

2.4   Os Estados do Papa: a plena jurisdição territorial. E fora daí, o papa tem jurisdição?

 

IV.             Conflitos de jurisdição:

3.1   Entre o sacro imperador Romano-Germânico e o papa: quem elege o papa? As contínuas intervenções do Imperador.

3.1.1        A regulação da eleição (1059).

 

3.2   Gregório VII (1073-1085) e a monarquia papal vs. Henrique IV – papas e antipapas. A questão das investiduras – importância política e simbólica. A submissão ao papa.

 

Eu te digo: Tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do Abismo nada poderão contra ela. Dar-te-ei as chaves do Reino do Céu; tudo o que ligares na terra ficará ligado no Céu e tudo o que desligares na terra será desligado no Céu.» (Mateus 16, 18-19).

 

3.2.1        A intervenção ratione peccati (por causa do pecado);

3.2.2        A autoridade régia depende da autoridade papal;

3.2.3        A Igreja tem poder de supervisão e comando;

3.2.4        A Igreja tem poder de sagração e de deposição.

 

3.3   O que sempre faltou ao papa? Poder político e militar suficientemente forte e independente para se impor de forma definitiva.

 

V.              O decreto Venerabilem (1202):

1.      O contexto: Inocêncio III (1198-1216) e a intervenção num conflito pela sucessão imperial alemã.

2.      O Venerabilem:

2.1   Papa confirma, unge, consagra e coroa o imperador;

2.2   Em caso de ausência/falta de imperador, o Papa escolhe;

2.3   Pode transferir propriedade do pecador para o justo = aplica-se ao imperador pecador.

2.4   Função do Imperador: proteger a Igreja.

3.      O IV Concílio de Latrão (1215): o papa como ‘vigário de Cristo’: o governante de iure de toda a terra. A teoria do sol e da lua.

 

VI.             A Vnam Sanctam (1302):

1.      Contexto: conflito entre Bonifácio VIII (1294-1303) e Filipe IV, o Belo, rei de França;

2.      ‘Declaramos que é absolutamente necessário para a salvação que toda a criatura humana esteja sujeita ao Pontífice Romano’.