"Maria do Mar" e as matrizes futuras do cinema português
23 Fevereiro 2016, 12:00 • Mário Jorge Torres Silva
Conclusão do visionamento comentado de Maria do Mar (Leitão de Barros, 1930): as variações ficcionais sobre as rivalidades familiares de Romeu e Julieta de William Shakespeare, mas também sobre Amor de Perdição de Camilo Castelo Branco; os modos de integração da intriga amorosa na visualização complexa de uma Nazaré entre a mitografia folclórica e uma certa antropologia dos costumes; os tropos do filme de mar - naufrágios, coscuvilhices, trajos e interiores estereotipados, mercados, lutas de mulheres; sinos a rebate, funerais, a estilização das redes de pesca; o contexto da festa no filme, abrindo inclusive para a comédia salazarista, com marchas à fulambó, balões, procissões, ranchos folclóricos ou cantigas; a especificidade de um universo representativo português e as influências de um cineasta modernista de profunda cultura cinematográfica, assimilada a um imaginário próprio - as sombras do Expressionismo Alemão, os grandes planos e a montagem do Formalismo Soviético, a visão do mar inspirada pela vanguarda francesa, sobretudo Jean Epstein; a importância da liberdade de fazer um filme mudo, fora de tempo, sem grandes condicionalismos orçamentais; o final conciliador e a força dramática de objecto estético, pensado como tal, num momento em que o Cinema Português se inscrevia numa estratégia vanguardista e artística europeia.