I. A Natureza do Juízo Declarativo. A - Teorias Clássicas do Juízo Declarativo - 4

15 Outubro 2020, 12:30 António José Teiga Zilhão

Teoria Kantiana do Juízo Declarativo - 3

 
3.1. A tese kantiana de que nem todos os juízos a priori seriam analíticos: em particular, os juízos matemáticos (aritméticos e geométricos) seriam juízos sintéticos a priori. Fundamento desta tese: por um lado, os juízos matemáticos seriam necessários e, portanto, a priori; por outro lado, a simples análise dos conceitos que os constituiriam não seria suficiente para determinar a verdade da relação predicativa neles estabelecida entre o sujeito e o predicado; para esse efeito, seria necessário recorrer a uma síntese, suportada numa intuição; logo, eles seriam também sintéticos.  
 
3.2. Ilustração da tese kantiana de que os juízos matemáticos seriam sintéticos por meio da consideração de dois exemplos.  
3.2.1. Exemplo Aritmético. Considere-se um qualquer juízo que indique correctamente uma soma. A recondução analítica das parcelas dessa soma ao conjunto das unidades que as comporiam, e da operação de soma à junção dessas unidades numa nova totalidade, não nos proporcionaria, só por si, o conhecimento do número de unidades que comporiam a nova totalidade dela decorrente; para obter esse número, seria ainda necessário proceder à contagem das unidades da nova totalidade; mas, para o fazer, seria necessário representar numa intuição o conjunto das unidades da nova totalidade; só assim o seu número poderia ser efectivamente determinado. Neste sentido, mesmo que um juízo aditivo verdadeiro não possa não ser verdadeiro, e, portanto, seja verdadeiro a priori, o mesmo não deixa de ser sintético.        
3.2.2. Exemplo Geométrico. Considere-se a demonstração da primeira proposição dos 'Elementos' de Euclides: 'Sobre qualquer segmento de recta pode traçar-se um triângulo equilátero'. Nesta demonstração, Euclides recorre apenas a postulados, definições e noções comuns (regras lógicas) introduzidas no início da obra; logo, a verdade da sua conclusão seria necessária e a proposição que a exprimiria seria verdadeira a priori; mas a determinação da mesma exigiria também a exibição numa intuição específica dos pontos, segmentos de recta, circunferências e triângulo aos quais se faz apelo na demonstração, por forma a que as relações espaciais nela estabelecidas entre eles pudessem tornar-se inteligíveis para o sujeito cognoscente. O juízo que a teria como conteúdo seria assim também sintético

3.3. O problema colocado pela tese de que existiriam juízos sintéticos a priori. A filosofia kantiana afirma as seguintes três teses: i) toda a intuição é sensível, ii) todo o conhecimento sensível é empírico e iii) nenhum conhecimento empírico pode ser necessário. Como é então possível que existam juízos sintéticos a priori, i.e., juízos que, simultaneamente, seriam necessários e cuja verdade seria apenas determinável pelo recurso à intuição?