Bases de construção de uma 'fortuna crítica' de obra de arte, com 'estudos de caso'.
15 Outubro 2015, 10:00 • Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão
Exemplificação de leitura analítico-descritiva e interpretativa de uma obra de arte recorrendo a dois exemplos. O primeiro é a famosa pintura 'Os Esposos Arnolfini', de Jehan Van Eyck, 1434, National Gallery, Londres. O artista – o mais célebre dos Primitivos Flamengos e nome maior da pintura proto-renascentista nórdica -- nasce c. 1488 em Masseik (Holanda), recebe influência da escultura tardogótica (Broedeldam, Sluter, foi provável discípulo do Mestre de Flémalle (Robert Campin e deve a sua inovação ao citado ‘atrevimento’ no modus operandi. Usa o óleo como diluente com secagem rápida e os preparados de branco para conferir à película cromática um brilho intenso. Serviu João da Baviera, conde de Holanda, em Liège, de 1422 a 1424. Mas em 1425 é já pintor de câmara do Duque Filipe o Bom, instala-se em Lille por cinco anos, viaja a Espanha e Portugal em missões do duque, e só em 1430 se fixa definitivamente em Bruges. É ainda obscuro o que Jan deve a seu irmão Hubert van Eyck, com quem teria trabalhado como miniaturista-iluminador e no retábulo de Gand, começado c. 1420 por Hubert. Outro irmão, Lambert, foi também pintor. Hubert, que a lenda pinta como pintor celebrado no seu tempo, é ainda uma incógnita e tem escassa obra segura. Jehan van Eyck, ou jɑn vɑn ɛik, nasceu em Maaseik pouco antes de 1390 (quase de certeza em 1488) e faleceu na cidade flamenga de Bruges a 9 de Julho de 1441. Ele é, reconhecidamente, a mais fortes e mediatizada personalidade da Pintura do Renascimento do Norte durante. É autor de obras celebérrimas como o Políptico de Gand (em colaboração com seu irmão Hubert van Eyck), a Virgem com Van der Paele, as iluminuras do Livro de Horas Turim-Milão. Devem-se-lhe seguramente de vinte e cinco pinturas executadas de 1432 a 1439, dez delas assinadas com a fórmula em caracteres gregos ALS IK KAN (Assim pelo melhor modo que eu (Eyck) posso). Filipe o Bom, Duque de Borgonha, conditor Belgii, governador dos Países Baixos de 1417 a 1467, tornou o território da Bélgica durante meio século um pólo fundamental da estabilidade europeia. À frente de uma Flandres que governa com o seu chanceler Nicolas Rolin a partir de Bruges ou de Bruxelas e que inclui os conselhos de Namur, Hainaut, Brabante, Limbourg, Somme, Luxemburg, e os principados episcopais de Liège e Cambrai, o tempo de Filipe o Bom é uma espécie de chefe da cristandade, afirma as virtudes cavaleirescas, cria uma corte luxuosa onde se protegem as artes e letras e que atrai a Bruges (então com 150.000 habitantes) mercadores, banqueiros e artistas. O ambiente estável propicia o desenvolvimento das artes. No retrato dos Arnolfini, atesta-se o chamado milagre eyckiano expressa-se nesse profundo humanismo, na densidade do real, no apelo às forças vivas, no realismo do modelado, na concepção em profundidade, que o retrato do casal mostra e reflecte em alto cume... O segundo exemplo é uma 'Natureza Morta' holandesa da autoria de Jacob van Es (Antuérpia, 1596-1666). Ambas as pinturas são interpretadas à luz das suas qualidades históricas, iconográficas, estéticas, formais, iconológicas e comparatistas, seguindo o seu percurso trans-contextual.