Como evoluem as espécies: Netos de Gungunhana e Estranha Ordem das Coisas

13 Novembro 2018, 18:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

NOVEMBRO                        3ª FEIRA                               15ª Aula

 

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Saída de Campo – São Luiz, Netos de Gungunhana inspirado na trilogia de Mia Couto, Areias do Imperador, encenação de João Brites, Teatro O Bando, 9.11.2018, 21:00-23:00

 

Demos início à discussão sobre o espectáculo assistido em conjunto e que escolhemos como o primeiro de três seleccionados do que poderia ser visto na cidade de Lisboa.

Este trabalho conjunto poderá prolongar-se por algumas aulas, uma vez que reservamos para cada uma das unidades curriculares um tempo de reflexão para obras incluídas no programa.

Ressalvo o facto de no espaço de uma semana termos assistido a três espectáculos. Talvez que esta concentração de objectos artísticos de grande diversidade entre si possa criar alguma perturbação nos alunos para deles se apoderarem verdadeiramente e sobre eles produzirem discurso.

Não consegui apurar se o diário de bordo recomendado a todos tivera algum proveito. Tendo explicado aos alunos que este instrumento de trabalho pessoal teria a função de melhor integrar a opinião de cada um na discussão colectiva, apercebi-me de que a participação oral foi intermitente, parca e muito rodeada de silêncio.

Do espectáculo Netos de Gungunhana teremos acesso, por gentileza do Teatro O Bando, a um vídeo geral do qual talvez possamos visionar alguns momentos para clarificação de posições que me pareceram especialmente intuitivas entre os alunos e que com esse visionamento parcelar talvez adquiram melhor sustentação opinativa.

Apurei que para alguns dos intervenientes a dramaturgia de texto e a dramaturgia de cena foram o mais difícil de seguir. Algumas das vozes até pareciam zangadas. Na opinião de alguns este espectáculo não era para o São Luiz mas para espaço aberto. Outros, entre os quais me incluo, manifestaram-se favoráveis a um espectáculo de maior intimidade. Pessoalmente fez-me falta um espectáculo com cheiro e suor. É verdade que estou a ficar surda e da 2ª plateia muita coisa dita me escapou, como aliás foi referido por algumas alunas também. Mas não é por essas minhas fragilidades do corpo que não desejei escutar melhor o texto do Mia Couto. Talvez esta agora limitação que chega com a idade seja ainda assim uma questão antiga da minha experiência de leitora do escritor moçambicano. Para mim, e especialmente nesta trilogia, ele é menos o escultor da língua e mais a expressão do sensível de uma África que conheço, que amo e da qual sou próxima.

Neste começo de conversa estivemos a debater-nos sobre o que é óbvio e não é: linguagem e comunicação. Optámos por falar da abertura do espectáculo como mote para tudo o resto a partir das duas línguas europeias, as de um primeiro (o português) e segundo (o inglês) colonialismos, e com os cruzamentos de outros linguajares.

Também houve quem se manifestasse sobre NETOS ser um espectáculo muito longo. Julgo que os alunos tiveram razão. Imagino que não tenha sido fácil criar e articular cenas de três grossos e muito substanciais volumes que permitiam várias opções. Útil teria sido conversar sobre esta questão com o dramaturgista Miguel Jesus e com o encenador João Brites.

Do agrado dos alunos foi a funcionalidade mas também a simbologia do cenário, o trabalho de corpo que muito valorizaram e a relação cénica entre os actores. Não se pronunciaram ainda sobre a música e a luz. Os figurinos foram apreciados consensualmente. Acho que em futuras conversas poderemos ir um pouco mais longe. Só espero que o espaço mental nos seja favorável.

Ocupámo-nos ainda da compreensão do conceito de homeostasia na óptica de Damásio em A Estranha Ordem das Coisas que nos proporcionou acesa discussão, tão proveitosa quanto inquietante, na relação biológica que nos envolve entre a cooperação e a competição. Tendo esta relação biológica existido primeiro entre bactérias, e que esteve na origem do processo de regulação da vida, que em nós tem representação na evolução das espécies, fenómeno que ajuda todos os organismos no processo de selecção, considerando que a sobrevivência resulta das estratégias mais produtivas. Este padrão geral  mantém-se e repete-se relativamente ao comportamento humano.

Leitura recomendada:

DAMÁSIO, António 2017, A Estranha Ordem das Coisas – A Vida, os Sentimentos e as Cultura Humanas, Lisboa: Temas e Debates / Círculo de Leitores, pp. 227-332.