Nós, as crianças e as emoções

20 Setembro 2018, 18:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

Das três obras sugeridas na aula anterior para leitura sistemática, e como introdução ao que desejamos fazer numa primeira fase – sensibilizar uma espectação tão bem apetrechada quanto possível no que diz respeito ao nosso conhecimento do funcionamento do corpo e da mente -, escolhemos para leitura comentada e em voz alta a pequena conferência de Georges Didi-Huberman, intitulada Que emoção! Que emoção? e que o filósofo apresentou, em 2013, em Montreuil (França), no âmbito de um ciclo de contributos dedicados prioritariamente a «crianças com mais de 10 anos e a seus acompanhantes». Chamava-se este ciclo Luzes para Crianças. (vd. Didi-Huberman, 2015: 67)

 

Esta informação pode fazer-nos pensar que aquele público seria pouco comum na escuta de um filósofo. E é provável que muitas das referências enunciadas por Didi-Huberman pouco ou nada digam ao auditório infanto-juvenil que o acompanhou. Apesar disso, na expressão Luzes para Crianças encontramos um princípio que pode ser esclarecedor no que diz respeito ao acto de tornar claro, abrir novos horizontes, de iluminar, como foi, aliás, apanágio de uma corrente do pensamento europeu no séc. XVIII, designada de Iluminismo.

Curiosamente nesta conferência o acto de iluminar centra-se na explícita valorização das emoções, questão que não só teve difícil entendimento da parte de muitos ideólogos deste movimento europeu (Ex: Kant, pp. 22-23), como também terá tido justificação explícita na tradição aristotélica e platónica (p.p. 20-13), que parece ter fundamentado o facto de a dimensão emocional do comportamento humano não se equiparar ao potente horizonte que foi sendo traçado ao longo de séculos para a razão.

Esta dicotomia, em termos filosóficos, só veio a diluir-se no pensamento de Schopenhauer e de Nietzsche (sé. XIX), mas também no pensamento literário de um Lenz, um Goethe juvenil e de alguns estudiosos da fisiologia dos humores ou da observação aturada da expressão do rosto e gestualidade, como aconteceu com o teólogo, poeta, filósofo e fisionomista suíço, Johann Caspar Lavater (1741-1801), preciosa fonte informativa para Charles Darwin, e que é abundantemente referido por Didi-Huberman na sua conferência.

 

Prosseguiremos a nossa aproximação a Didi-Huberman, discutindo as suas proposições e dando atenção ainda ao capítulo de perguntas e respostas com que termina o livro. As perguntas são das crianças. O filósofo procura com as suas respostas a luz que as crianças merecem.

 

Leitura recomendada:

DIDI-HUBERMAN, Georges 2015. Que emoção! Que emoção?, tradução de Mariana Pinto dos Santos, Lisboa: KKYM.

FRAZZETTO, Giovanni 2014, Como Sentimos – O que a Neurociência nos pode – ou não – dizer sobre as nossas emoções, Lisboa: Bertrand Editora, pp. 176-213.

MENDES, Anabela, Notas para uma sociologia das artes do espectáculo – Reflexão sobre a utilização de parâmetros cognitivos aplicados a públicos de teatro e outras artes in: Maria Helena Serôdio (Dir.), Sinais de Cena 17, Junho de 2012, pp. 60-69.