Nós, os que somos contra qualquer tipo de escravatura

20 Dezembro 2018, 18:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

DEZEMBRO                                   5ª FEIRA                                          26ª Aula

 

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Concluímos a parte lectiva do nosso programa, após a realização do 2º teste de avaliação, com uma proposta artística de festa, também ela legítima num quadro de horror e sofrimento e que serviu de inspiração a um grupo de músicos e cantores que escolheram dedicar as suas artes a um assunto que despromove a relação entre povos: a escravatura. Seremos nós espectadores sado-masoquistas quando nos aventuramos por caminhos que nos narram e perante nós exibem Rotas da Escravatura 1444-1888 como espectáculo pluri-racial, pluri-religioso, pluri-cultural, pluri-artístico perante tudo aquilo que se objectiva em tortura, humilhação e desprezo pela essência e valores éticos humanos? Serão os conflitos entre seres da mesma espécie e relacionados com este assunto insolúveis, nomeadamente como formas de exercício de poder em que o espírito democrático se esboroa perante interesses de natureza económica, social e política há tantos séculos? Onde situar verdadeiramente um pós-colonialismo que em muito se dilui em formas de colonialismo que persistem ainda e sempre fazendo de uns escravos e de outros senhores?

A algumas destas perguntas fomos tentando responder com vários textos dos nossos autores como Damásio, Rancière e Byung-Chul Han.

 

Hoje tomámos o rumo de Jordi Savall, conceituado gambista catalão e estudioso de música antiga de várias paragens do mundo, que entendeu dedicar obra ao assunto da escravatura. Este atravessa os tempos da História desde há milhares de anos e sabemos nós hoje também que o ano de 1888, que criou como oficialização o fim da escravatura, não passou infelizmente de uma espécie de acto politicamente correcto.

Com os seus colaboradores de diversas regiões do globo, Savall intuiu a necessidade de fazer despertar consciências a partir da arte instrumental e vocal.

Assistimos, assim, a um espectáculo em diferido, realizado ao vivo e pela primeira vez, em 2015, na abadia de Fontfroide em Narbonne, França. O lugar escolhido para exibir Rotas da Escravatura ganhou aliás uma conotação simbólica, isto se pensarmos, por exemplo, no processo de cristianização em África e na América do Sul onde algumas ordens religiosas foram colaboracionistas dos regimes coloniais europeus de manutenção de pessoas em situação de escravos.

Perante nós tocaram-se vários instrumentos europeus e não-europeus, cantou-se em várias línguas, vestiram-se trajes tradicionais de vários países e, no caso de europeus, usou-se o negro tradicionalmente escolhido para palco, nomeadamente para homens neste tipo de espectáculos. Dançou-se com alegria em palco. Os ritmos contagiantes operaram milagres. Quatro séculos da história da escravatura foram sendo narrados sempre por actor negro que carregou na voz a tragicidade dos acontecimentos.

Pensara esta aula como um fim feliz mas sob a consciência de que a felicidade alcançada com o trabalho artístico de outros não significava leviandade de pensamento.

Foram poucos os alunos presentes, o que entendo dada a semana exaustiva de testes. Ressalvo, no entanto, que os que optaram por vir e ficar em aula o fizeram em boa hora. Não tendo sido possível abranger o regular número de alunos em presença, demos a oportunidade a umas poucas alunas de descobrirem o que não conheciam, de poderem cantar as letras disponibilizadas, de balancearem os seus corpos juntando-os aos dos cantores-bailarinos e músicos que do ecran nos fascinavam. Foi através deles que celebrámos o que existiu no íntimo de milhões de escravos e que apenas raramente o podiam exprimir.  

 

Obra visionada em DVD:

SAVALL, Jordi 2015, The Routes of Slavery (1444-1888), K. M. Diabaté, I. García, M. J. Linhares, B. Sangaré, B. Sissoko, LA CAPELLA REAL DE CATALUNYA, HESPÈRION XXI, 3MA, TAMBEMBE ENSAMBLE CONTINUO.

Espectáculo apresentado ao vivo, a 17 de Julho de 2015, na Abadia de Fontfroide, Narbonne, França, no âmbito do X Festival de «Música e História para um Diálogo Intercultural», Aliavox. Tempo de duração: 2h08’30’’

 

 

"Be the change you want to see in the world" (M.K. Gandhi)

 

 

 

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