Materiais em análise

15 Fevereiro 2019, 14:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

FEVEREIRO                        6ª FEIRA                               3ª AULA

 

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Dedicámos a aula a comentário de materiais específicos, no âmbito da investigação de cada um, e que, parecendo de somenos importância, poderá imprimir à pesquisa novos direccionamentos.

Tal foi o caso da observação de diversas capas de exemplares da Revista Teatral maranhense A FLECHA (1879-1881) propostos por Marineide Câmara. Com ela estabelecemos alinhamento e posicionamento das imagens em função do falso lugar de destaque atribuído ao indígena; confirmámos a opção sexista que tornava protagonistas apenas homens e nenhumas mulheres enquanto artistas; contemplámos as divisões de classe na sociedade maranhense a partir do lugar que ocupavam no teatro. Este conjunto de aspectos agora comentados poderá servir de ponto de partida para a avaliação do periódico dedicado prioritariamente à crítica de espectáculos, mas que revela uma componente antropológica, sociológica e cultural na orientação das próprias capas e que acentua o carácter conservador de tratamento de conteúdos.

Com Isabel Leitão fomos ao encontro de outros aspectos relacionados com a sua pesquisa dedicada à dramaturgia portuguesa entre 2000 e 2018, à teorização e compreensão do que será abrangido por pós-dramático e estará para além dele (Hans-Thiess Lehmann) mas também pela História de conceitos como dramaturgo/a e dramaturgista. Foram indicadas algumas leituras pela aluna que as comentou no espaço da exposição. Juntei ao seu contributo um fundamental testemunho que diz respeito a Gotthold Ephraim Lessing, o primeiro criador in nuce do termo dramaturgista. A prática do autor alemão no Teatro de Hamburgo, onde trabalhou em diversas áreas (dramaturgo, tradutor, crítico, investigador histórico, polemista, director do teatro, defensor de um teatro patriótico para o seu país, etc.) permitiu-lhe com a Dramaturgia de Hamburgo deixar diversos exemplos da prática artística teatral que viriam a marcar o entendimento do drama como género na sua distinta posição enquanto texto cénico.

A Isabel interrogou-se ainda sobre o talvez “lugar-comum” de que a dramaturgia portuguesa contemporânea não alcança uma representatividade muito positiva em teatros e espaços cénicos do país. Considerámos diferentes premissas à medida que íamos construindo pensamento: qualidade do texto, adaptabilidade do mesmo a uma realidade teatral muito heterogénea e que exactamente por essa razão nem sempre antevê adaptabilidade, criação de equipa artística e técnica adequada, sujeição do texto a pequenos nichos de mercado (teatro para amigos e entre amigos), orçamentação de projecto, apoios por concurso e outros. Talvez seja este contexto parte daquilo sobre o qual a Isabel se interroga quando se refere a dramaturgia portuguesa contemporânea. A discussão não ficou fechada, embora lhe reconheçamos a pertinência e ao mesmo tempo a fraqueza que começa por ser genológica.

Tentei defender que talvez a questão não esteja no género mas no assunto, embora reconheça que a escrita para teatro, para além de uma história que seja capaz de agarrar o espectador requer um trabalho de linguagem que não deixe fugir a história cunhando-a em várias direcções e pontos de vista. O enriquecimento textual é uma opção que torna normalmente exigente o trabalho cénico e de representação. Oficinas de escrita criativa e semelhantes actividades não garantem a qualidade de uma boa peça de teatro. Matéria sensível que provavelmente só poderá encontrar, em primeiro lugar, na qualidade da linguagem o seu verdadeiro atributo estético (estamos a falar de teatro de texto e não de outro) que vinculará o seu autor também a uma ética de que este tipo de obras terá de ser portadora.

 

Recomendo à Isabel Leitão o seguinte endereço electrónico:

https://expresso.pt/cultura/2017-09-10-As-duas-mortes-de-Miguel-Rovisco#gs.BNfVScGk

 

Iniciou Andrés Jurado Uribe a sua apresentação sobre investigação que prossegue já há algum tempo e que se ocupa de diferentes formas de mapeamento do mundo e do que para além dele possa existir. A leitura das imagens propostas por Andrés tem vindo a organizar-se em função de cada vez mais pormenores que, por isso, alargam o horizonte interpretativo e relacional entre conteúdos e formas, mas também como construção de memória sempre em arquivação e em desarquivação. Esta mobilidade intra-imagética que gera interpretação histórico-antropológica, política e social mas que é também o garante autónomo de que um mapa possui uma estética e uma ciência próprias de que derivam todas as camadas que se lhe sobrepõem. Este é o caso dos materiais seleccionados pelo pesquisador Andrés Jurado e que integram Novo Orbis (1570) do cartógrafo flamengo Abraham Ortelius.

A exposição e discussão deste projecto prosseguirá na próxima aula.