Rudold Wittkower e a transmigração das imagens.

11 Fevereiro 2021, 15:30 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

RUDOLF WITTKOWER (Berlim, 1901-Nova York, 1971) foi um grande historiador de arte alemão, que se destacou como profundo conhecedor da arte do Renascimento  e do Barroco; também se dedicou à Psicologia da Arte, ao inconsciente criativo e aos traumas ligados à criação artística; orientou os seus estudos segundo a iconologia de Aby Warburg, e de Panofsky, e as formas simbólicas de Ernst Cassirer, tendo desde sempre rejeitado uma leitura formalista das obras de arte. Estudou um ano Arquitectura em Berlim, para seguir depois História de Arte na Universidade de Munique, com Heinrich Wölfflin, e em Berlim, com Adolph Goldschmidt. Perito em arte italiana, recebeu a influência crescente da Iconologia warburghiana, e demarcou-se cedo do Formalismo de Wölfflin. 

No livro Born Under Saturn (de 1963) desenvolveu um dos melhores tratados sobre a Psicologia da Arte, sobre o humor merencoricus, a psique criadora e a evolução da condição social do artista, assim como o seu carácter e a sua conduta. Um pioneiro da Psicologia da Arte foi o Dr. Robert Burton (1577-1640). Era bibliotecário do Colégio de Christchurch, em Oxford, e dedicou toda a sua vida a escrever um único livro, The Anatomy of Melancholy (1621), sucessivamente acrescentado, sobre os comportamentos merencorosos do homem, as suas causas, sintomas, derivas criadoras, tipologias, génio, etc. O tema é o chamado humor melancholicus como sinal de utopia e fonte de criação desenfreada. «A melancolia amorosa, a que Avicena chama ilishi, e a licantropia, a que chama cucubuth, incluem-se por hábito na melancolia da cabeça. Mas falarei em separado da última, a que Gerardo de Solo chama amorosa, e das melancolia cavalheirescas, com a melancolia religiosa, e outros tipos de melancolia amorosa. Estes três tipos são o tema deste discurso, que dissecarei através das suas causas, sintomas, curas, juntos e em separado; de modo que todos os que estiverem afectados de algum modo por esta doença possam saber como examiná-la em si e aplicar-lhe o remédio». Considerado um clássico em língua inglesa, a Anatomia da Melancolia é um livro «filosófico, médico e histórico» sobre a natureza da melancolia e os estados da depressão. Pese a natureza da matéria, Burton é muitas vezes irónico («escrevo sobre a melancolia por estar ocupado a evitar a melancolia»), garantindo que uma das fontes da melancolia é a ociosidade. A obra descreve e classifica diferentes tipos de melancolia, as curas para a melancolia como estado clínico, e os tipos de melancolia abordados pela literatura, como os de natureza amorosa ou religiosa.

Trabalhou no Instituto Warburg, em Hamburgo e em Londres. Entre outras publicações, cabe destacar: Principios arquitectónicos na época do Humanismo (de 1949), Arte e Arquitectura em Italia 1600-1750 (de 1958), Born Under Saturn (1963) e Gian Lorenzo Bernini, o escultor barroco romano (de 1955).Segundo o grande iconólogo Rudolf Wittkower, na sua obra Allegory and the Migration of Symbols (ed. Londres, 1977), colectânea de estudos realizados entre 1937 e 1972, as obras de arte dão corpo, e transformam sempre, os códigos e símbolos das diversas experiências humanas ao longo dos tempos. Seguindo a lição de Aby Warburg, com quem Wittkower conviveu em Roma e Florença em 1927, antes de trabalhar no Warburg Institute, a lição iconográfica das alegorias e símbolos «em migração» permitiu-lhe abraçar consciente e vantajosamente a Iconografia para melhor entender o sentido das imagens. Cabe de facto à lição iconológica, estádio mais avançado da História da Arte, o desvendar das perenidades temáticas, das constantes codificadas, das trocas culturais entre Ocidente e Oriente, dos confrontos entre paganismo e racionalismo, e das permanentes retomas de linguagens formais através dos códigos artísticos -- mesmo que, efectivamente, os símbolos em apreço possam estar tão afastados no espaço geográfico e no tempo histórico... Assim, por exemplo, os temas mais explorados pela arte e pelo humanismo do Renascimento revelam-se, muitas das vezes, ecos de longínquas culturas, desde o Oriente pagão ao mundo greco-romano, e retomam os seus motivos sem que, apesar da óbvia mudança contextual, algo da sua primitiva identidade não continue a perdurar no seu discurso simbólico. Segundo o iconólogo Rudolf Wittkower, nessa sua obra póstuma, colectânea de estudos realizados entre 1937 e 1972, as obras de arte dão corpo, e transformam sempre, os códigos e símbolos das diversas experiências humanas ao longo dos tempos. Seguindo a lição de Aby Warburg, com quem Wittkower conviveu em Roma e Florença em 1927, antes de trabalhar no Warburg Institute, a lição iconográfica das alegorias e símbolos «em migração» permitiu-lhe abraçar consciente e vantajosamente a Iconografia para melhor entender o sentido das imagens. Os temas desse livro são os seguintes: 1. East and West: The Problem of Cultural Exchange 2. Eagle and Serpent 3. Marvels of the East: A Study in the History of Monsters 4. Marco Polo and the Pictorial Tradition of the Marvels of the East 5. 'Roc': An Eastern Prodigy in a Dutch Engraving 6. Chance, Time and Virtue 7. Patience and Chance: The Story of a Political Emblem 8. Hieroglyphics in the Early Renaisssance 9. Transformations of Minerva in Renaissance Imagery 10. Titian's Allegory of 'Religion Succoured by Spain' 11. El Greco's Language if Gesture 12. Death and Resurrection in a Picture by Marten de Vos 13. 'Grammatica' from Martianus Capella to Hogarth 14. Interpretation of Visual Symbols.

Cabe à lição iconológica, estádio avançado da História da Arte, desvendar as perenidades temáticas, as constantes codificadas, as trocas culturais (entre o Ocidente e o Oriente, p. ex.), os confrontos entre paganismo e racionalismo, as permanentes retomas de linguagens formais através dos códigos artísticos -- mesmo que estes símbolos possam estar afastados no espaço geográfico e no tempo histórico. Por exemplo, os temas mais explorados na arte do tempo do Humanismo do Renascimento revelam-se, muitas vezes, ecos de longínquas culturas, do Oriente pagão ao mundo greco-romano, e retomam os seus motivos sem que, apesar da mudança contextual, algo da sua primitiva identidade não deixe de perdurar no seu discurso formal, iconológico e simbólico.