Um balanço crítico sobre os conceitos de ARTWORLD.

22 Abril 2021, 15:30 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão


Arthur C. Danto: ainda um balanço crítico sobre os conceitos de ARTWORLD.

Neste dealbar de milénio, acompanhando os efeitos da globalização à escala planetária, desenham-se novos quadros de referência no chamado mundo da arte. Entendo aqui, por útil, o conceito operatório utilizado pelo antropólogo e crítico de arte Arthur C. Danto para caracterizar as teias relacionais entre artistas, agentes, galeristas, mecenas, críticos de imprensa, fotógrafos, leiloeiros e demais promotores da indústria e do mercado das artes, técnicos de conservação e restauro, museólogos, curadores de exposições, sociólogos, historiadores de arte, e os públicos . Face a um quadro global que altera relações de domínio, esbate paradigmas e dilui fronteiras, tanto a produção artística como a própria fruição e consumo das artes e, também, o papel actuante da História da Arte -- disciplina inserida nesse vasto mundo em mutação com as suas teorizações críticas, a sua capacidade de interrogar sentidos e a sua metodologia de análise das obras artísticas --, vêem o seu papel interventivo substancialmente alterado nos seus pressupostos.É uma análise parcelar e uma reflexão sem fim: percebem-se contornos, diagnosticam-se problemas, mas é difícil definir rumos no dealbar sob a realidade da globalização. Quais os quadros de referência e bases instituídas que possam dinamizar o ‘mundo das artes’ ? A análise de Eric Hobsbawm, pelo que contém de polémico (mas, por essa mesma razão, luminoso), pareceu uma abertura plausível para ensaiar uma reflexão sobre o sentido das vanguardas activas nas artes de hoje e, principalmente, sobre o grau de intervenção da História-Crítica da Arte, submetida a um mundo globalizado . 
Face a inusitada ascensão da História global, dispomos hoje de bases genuínas para analisar a especificidade da civilização europeia ou atlântica, realidades decorrentes do pós-colonialismo, a ascensão do capitalismo ultra-liberal agressivo e sem regulação, num mundo desideologizado e, por isso, mais vulnerável aos efeitos da exploração sem peias. As artes, todavia, continuam a fluir. Nunca o ‘mundo da arte’ se mostrou um espaço tão interventivo, globalizado, apto a repensar o papel de identidade-memória e intervenção-sinal. Se pensarmos em termos de que são «os homens (que) fazem a sua própria história», verificamos que durante gerações, foram muitas as comunidades e sistemas sociais que buscaram a estabilização e a reprodução criando mecanismos para prevenir o futuro, acautelando os perigos do desconhecido (os grandes saltos nas brumas do futuro incerto) e criando a resistência às transformações. A globalização veio agitar, com as suas contradições, riscos, ‘etapas’ desreguladas e consumismo insano, novos ‘saltos no escuro’ que estimulam o auto-conhecimento, a criação artística e as dinâmicas que podem criar uma cidadania de valores. Quero crer que a produção artística ganha novos estímulos, os equipamentos de crítica nova frescura de debate, os objectos de estudo novas possibilidades de investigação, as incidências do mercado das artes novas dinâmicas de crescimento. Principalmente, esse Artworld definido por Danto ganha um espaço plural de redefinição. Face à imprevisibilidade dos amanhãs, a produção das artes, e a História-Crítica que a analisa, estuda, valoriza e promove, continuam firmes. Criam obra, exprimem ideias, agitam o ‘mundo das artes’, conferem-lhe qualidade. Oferecem a imagem de um espaço operativo reforçado – porque útil, socialmente interventivo, capaz ainda e sempre de gerar emoções. 

BIBL. •DANTO, Arthur C., After the End of Art. Contemporary art and the Pale of History, Philadelphia, 1987. •IDEM,  The Transfiguration of the Commonplace, Cambridge, Harvard University Press, 1981.