António Carmo Gouveia - As minhas plantas

20 Abril 2017, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

2º Módulo: Montanhas, Vegetações, Vulcões, Cavernas, Desertos

 

António Carmo Gouveia

 

As minhas plantas

 

Aula conduzida pelo biólogo e ecologista António Carmo Gouveia, director do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra.

O nosso convidado iniciou a sua palestra apresentando-nos o espaço onde actualmente trabalha. Este Jardim Botânico foi iniciado em 1772, no tempo do Marquês de Pombal, com o intuito de criar uma colecção de plantas que pudesse ser identificada e inventariada como era então frequente noutros espaços europeus. Seguia-se à época um procedimento comum às plantas, aos seres vivos de todas as espécies, às pedras e a tudo o que pudesse ser catalogado. Esta vontade de sistematizar e organizar o mundo natural de modo a melhor poder compreendê-lo fez parte do ideário iluminista disseminado e aplicado pelos estudiosos de cada área em que o conhecimento da Ciência ia sendo revisto, mudado e aumentado como hoje ainda se faz.

O Planeta encontrava-se não só numa fase de descoberta observacional científica, criada muito antes do séc. XVIII, através das viagens intercontinentais realizadas em nome da Ciência, da Religião, da Política e sobretudo das trocas comerciais. Esta nova cartografia entre regiões planetárias, levada a cabo pelo mundo ocidental, não só fez crescer o interesse por cada exemplar estudado e inventariado, como também envolveu a presença de formas de associar cada exemplar a outros com semelhantes características em distintos lugares. O comparativismo nasce então como um modo de reconhecimento de espécies existentes e fenómenos, cuja observação e cujo estudo antecipavam e promoviam.

Se antes havíamos acompanhado descrições de subidas a vulcões e as observáramos em filme (Humboldt, Herzog), se antes tomáramos conhecimento da existência de gigantesca floresta dentro da terra (Gruta de Hang Son Doong no Vietname), agora passáramos a reflectir sobre as diversas funções de um Jardim Botânico que tem 4.000 espécies identificadas e sempre em processo de estudo, porque este espaço, sendo criado pela mão humana e apresentando-se como um lugar de prazer e recreio, continua a ser um dinâmico produto da relação entre Natureza e Ciência.

Como demonstrou o nosso convidado, é preciso que se ultrapasse a visão cega (plantblindness) e antropocêntrica sobre as plantas, valorizando antes as suas características e propriedades como constituintes de um movimento científico, cultural e biológico dinâmico, absolutamente essenciais à nossa sobrevivência.

António Carmo Gouveia teceu ainda algumas considerações sobre imagem da estátua de 1887, existente no Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, a Felix de Avelar Tito Brotero, eminente botanista português do séc. XIX. Mostrando-nos a frente e o reverso dessa estátua, pudemos observar que o botanista estava sentado sobre livros e não hieraticamente apresentado de pé. Esta opção fez-nos perceber a escolha do artista plástico em valorizar um modo de representação mais descontraída, embora sem perder de vista o horizonte científico do retratado.

O nosso convidado estabeleceu posteriormente relação com outros lugares em regiões africanas, onde o estudo botânico tem em conta a presença de exemplares e a sua adaptação endémica relacionados com culturas locais e com práticas ritualísticas. Neste sentido a botânica estabelece nexo com a antropologia e com o estudo de religiões.

Por fim, fomos esclarecidos sobre o misterioso comportamento de plantas e árvores dentro da gruta vietnamita. Nada mais simples do que a abertura por derrocada de uma área suficientemente grande para deixar entrar a luz solar no espaço de envolvência do interior da gruta.

Apesar de invulgar, à primeira vista, a exuberância da gruta de Hang Son Doong, segue os preceitos naturais de surgimento de florestas à superfície da Terra – luz para o processo de fotossíntese, humidade suficiente, temperatura adequada, mineralização do solo.

 

 

 

Leituras recomendadas:

GOETHE, Johann Wolfgang von 1992, Viagem a Itália Prefácio, Tradução e Notas de João Barrento, Lisboa: Círculo de Leitores (excertos)

HUMBOLDT, Alexander von 2007, Pinturas da Natureza – Uma Antologia, selecção, apresentação e tradução de Gabriela Fragoso, posfácio de Hanno Beck, Lisboa: Assírio & Alvim, pp. 21-132.

HUMBOLDT, Alexander von, 1993, Briefe aus Amerika 1799-1804, Ulrike Moheit (ed.), Berlin: Akademie Verlag, pp. 208-214. (para alunos com conhecimento de francês)

MENDES, Anabela | FRAGOSO, Gabriela (ed.) 2008, Garcia de Orta e Alexander von Humboldt – Errâncias, Investigações e Diálogo entre Culturas, Lisboa: Universidade Católica Editora, pp. 69-79.

WULF, Andrea 2016, A Invenção da Natureza – As Aventuras de Alexander von Humboldt, o herói esquecido da ciência, Lisboa: Temas e Debates | Círculo de Leitores, pp. 112-122.

 

 

Endereço electrónico com o currículo científico do nosso convidado:

http://cfe.uc.pt/index.php?menu=18&tabela=pessoaldetail&user=9&language=pt