Caminhar no Gelo - uma superação de si
11 Maio 2017, 16:00 • Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes
3º Módulo: O frio dos frios, oceanos, Antárctida
Optámos por uma deriva pelas páginas do diário de Werner Herzog Caminhar no Gelo a partir de sugestões de leitura dos alunos e também de uma questão que propus: Como é que alguém se apropria ou não de um lugar?
Juntámos a esta questão uma outra que também nos pareceu importante: Como é formulado o ponto de vista de quem escreve? A este propósito recuperámos o ponto de vista do prefaciador Pedro Mexia que defende esta obra de Herzog como representativa da «iconografia do romantismo: os quadros de Caspar David Friedrich, com personagens solitárias no meio de paisagens inóspitas mas sublimes.» (11)
Contrariámos a posição do prefaciador exemplificando com passagens de Caminhar no Gelo que exprimem antes a presença de um espaço desolador, invernoso e abandonado que o protagonista atravessa como um mártir. As descrições de cenário e o contacto com esparsas pessoas ao longo da viagem nada têm de sublime nem nesse sentido se projectam.
Completámos a nossa argumentação mostrando e comentando uma representação de um quadro de Caspar David Friedrich – O Monge à beira-mar (1808-1810) - escolhido de entre as propostas feitas pelos alunos, e que se encontra na Alte Nationalgalerie de Berlim (óleo sobre tela, 110 X171,5 cm).
As conclusões pareceram-nos óbvias. A plenitude e a relação cosmogónica expressa na relação entre o ser humano e a natureza no quadro de Friedrich distanciava-se abissalmente da experiência dolorosa e sacrificial que Herzog empreende como processo de regeneração interior e acto de fé em nome de uma amizade extraordinária.
Reforçámos ainda esta posição citando passagens do diário em que o narrador-protagonista desenvolve discurso de proximidade ao absurdo, recupera memórias de infância e outras, numa tentativa de as integrar num pensamento por vezes desconexo e que se relaciona com a exigência física da travessia territorial.
Leitura recomendada:
HERZOG, Werner, 2011, Caminhar no Gelo, tradução de Isabel Castro Silva, prefácio de Pedro Mexia, Lisboa: Tinta-da-China.
http://www.openculture.com/2012/08/portrait_werner_herzog.html