O que estará por detrás de uma nuvem aprisionada?

21 Fevereiro 2017, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

1º Módulo: Nuvens

 

A propósito de duas experiências artístico-científicas citadas no livro O Mundo das Nuvens de Gavin Pretor-Pinney – O Edifício Blur na Expo da Suíça, em 2002 (88-91) e a Harpa de Nuvens (2004) em Montreal e posteriormente em outras cidades, de Nicolas Reeves (110-111) – constatámos que o espírito de experimentação de alguns cientistas, técnicos e colaboradores na criação de obras que pretendem, de certo modo, aprisionar nuvens pode surpreender pela ousadia e alcance. No entanto o que poderemos depreender verdadeiramente dessas acções?

Atravessar milhões de borrifos de água em série como se estivéssemos a atravessar nuvens não é comparável a estar no cimo de uma montanha e ser-se literalmente atravessado por um conjunto de nuvens que vão ligeiras no seu caminho determinado por vento, grau de humidade, altitude, densidade do ar, temperatura. Esta realidade que a Natureza põe à nossa disposição como experiência requer de nós um envolvimento preceptivo e emocional que não se compara ao atravessamento de um objecto como o Edifício Blur. Isto não significa que esta criação inventada pela mão humana não possa também produzir em nós um efeito qualquer (ficarmos molhados é uma certeza), só que a sua objectivação se consuma na expressão como se, à maneira de, retirando-lhe assim a sensação autêntica que a nuvem, qualquer nuvem pode em nós produzir.

Escutámos quase desinteressados, creio, o efeito sonoro produzido pela Harpa de Nuvens. E porquê? Apesar de termos aprendido que alguém inventou uma estrutura a que chamou instrumento com o objectivo de captar sonoridades a partir de formas de nuvens que se deslocassem por cima desse objecto, não conseguimos compreender o que de facto acontecia. Também não teremos sido sensíveis ao efeito sonoro desejado.

Qualquer destas duas invenções é legítima. Duvido, porém que os resultados alcançados nos possam comover.

Ao contrário do exposto, o facto de nos termos apercebido de que há criações artísticas que invocam a presença da Natureza ou em nome dela se deixam interceptar pela escrita sobre ela (O Jogo das Nuvens de Johann Wolfgang von Goethe), convoca-nos para um outro universo que nasce e se desenvolve a partir de uma relação de respeito integrado entre a Natureza que inspira e a Arte. Esta é, ao mesmo tempo, Natureza em nós, os criadores, nós os observadores, nós os contempladores, nós os fruidores enquanto espécie, e é também Natureza que, considerando ser apreendida de forma mimética, extravasa essa dimensão permitindo que o exercício inspirador para a criação artística seja tão livre quanto é o próprio modelo. Esta relação permite então a existência de obras de arte (desenho, gravura, pintura, instalação, performance, dança, teatro, música e por aí fora) que recusam basear-se no como se mas antes se inscrevem numa estética de autonomia e liberdade.

Esse foi o caso do exemplo que acompanhámos de forma breve no fim da aula dedicado à partitura Clouds, The Mind on the Re(wind) (2013) do compositor e pianista italiano Ezio Bosso.

Agradeço a intervenção de vários alunos na discussão de passagens várias dos capítulos em estudo de O Mundo das Nuvens ~História, Ciência e Cultura das Nuvens de Gavin Pretor-Pinney.

Foi disponibilizado endereço electrónico de acesso ao ensaio de Luke Howard On the Modification of Clouds.

 

Leitura recomendada:

PRETOR-PINNEY, Gavin 2007, O Mundo das Nuvens – História, Ciência e Cultura das Nuvens, tradução de Sofia Serra, Cruz Quebrada: estrelapolar, pp. 186-258.

 

Endereços electrónicos sugeridos:

 

https://www.youtube.com/watch?v=OePtn6mx6fg

 

https://www.google.pt/?gfe_rd=cr&ei=fFk2Vv6uNpKs8wf4jLqgAQ#q=luke+howard+on+the+modifications+of+clouds+pdf

 

http://en.wikipedia.org/wiki/Cloud_Appreciation_Society

 

http://cloudappreciationsociety.org/

 

https://www.ted.com/talks/gavin_pretorpinney_cloudy_with_a_chance_of_joy                

http://cloudappreciationsociety.org/