"A Matter of Life and Death" (Michael Powell e Emeric Pressburger, 1946) - a História e a sua configuração mítica
27 Outubro 2015, 16:00 • Mário Jorge Torres Silva
Conclusão do visionamento comentado de A Matter of Life and Death (Michael Powell e Emeric Pressburger, 1946): a História como metáfora e a revisão da guerra, contestando conceitos como a heroicidade e agraça divina; a apresentação do Céu como matéria dos sonhos e dos desejos; a inscrição complexa numa tradição (sobretudo americana) dos filmes de anjos, fantasmas e criaturas sobrenaturais; a metafísica como motivo e como problema; o tratamento das feridas abertas pela Grande Guerra, enquanto uma fantasia histórica, com ecos da Revolução Americana e com um olhar irónico sobre a predestinação calvinista, logo puritana; a possibilidade de conceber o devir histórico enquanto um corte epistemológico num tecido mais vasto de rupturas filosóficas; a ligação com o war movie, por um lado, e com o conto filosófico de tradição setecentista (de certo modo na linhagem das alegorias de Swift), por outro; o triunfo do amor sobre as leis universais ditadas por sistemas ideológicos e religiosos; parábola, alegoria e metáfora como de transfigurar a modernidade; a utilização de uma estrela britânica com carreira em Hollywood para dar consistência a um filme de concepção artesanal; o cinema como arte puramente imagética, embora incorporando um forte sentido da tradição britânica das alegorias utópicas; o cinematographer Jack Cardiff e a instauração de um look technicolorido, doravante associado à obra fílmica de Michael Powell e a uma certa qualidade pictural do cinema inglês; o freeze como modo de interrogar a noção formal de enquadramento; o filme de estúdio britânico e uma particular forma de complexificar e individualizar o que aparentemente se apresenta como um produto industrial (mas também artesanal e artístico), na origem da tão propalada (e discutida) qualidade britânica.