PLATÃO: Uma teoria da arte : Ideia e Imagem

11 Fevereiro 2020, 14:00 Adriana Veríssimo Serrão

PLATÃO:

Uma teoria da arte e uma metafísica do Belo

 

1. O conceito platónico de arte (technè).

Um conhecimento aplicado, saber fazer, um fazer orientado por um saber. Distingue-se da epistèmè, saber teorético, puro, contemplativo, conhecimento intelectual das essências.

Capacidade comum a todos que possuem uma determinada technè, mas não capacidade individual: ex: tecelagem, marcenaria, governação, pilotagem, política ….

A interpretação da teoria platónica da arte tem de ser integrada nesta significação (=técnica, actividade baseada em conhecimentos e correctamente orientada para um fim), distinta da concepção moderna das belas-artes. Possui regras gerais; pode ser aprendida e ensinada.

 

… porque se a justa medida existe, as technai também existem, e se as artes existem, a medida existe também, mas se uma delas não existir, então não existirá nenhuma delas (Político 284c).

Com efeito, todos os produtos da technè participam de uma maneira qualquer da medida” (Político 284 e).

 

 São poesia, pintura, escultura, música, arquitectura…. technai ?

 

2. A concepção platónica da mimèsis.

República III (392a ss) e X (595 c e ss).

Sofista 219 a- 221 c; 232 b-235 c; 264 c.

 

Questão: São poesia, pintura, escultura technai? Possuem um modelo? Possuem logos?

2.1. No livro III da República (República III (392 a ss): análise dos modos do discurso poético:

·         diegesis (diegese) - “o poeta fala em seu nome e não procura fazer-nos crer que é um outro diferente dele que fala” /“ele introduz, quer os diversos discursos pronunciados, quer os acontecimentos intercalados entre os discursos”

·         mimèsis (mimese) – “esforça-se por nos dar a ilusão de que não é Homero que fala, mas sim o ancião, sacerdote de Apolo” / “quando ele pronuncia um discurso sob o nome de um outro, ele procura adequar a sua linguagem à de cada personagem à qual vai conceder a palavra”

·         Modos:

·         Diegético – narrativo (narrativa do poeta, o ditirambo)

·         Mimético – imitativo (tragédia e comédia)

·         Misto: epopeia

 

Condenação da poesia mimética:

“porque lhe são necessárias todas as harmonias, todos os ritmos, a fim de encontrar uma expressão apropriada, visto que ela comporta variações de toda a espécie”

 

 

“vamos admitir no nosso Estado os dois géneros? Vamos ficar apenas com a narrativa simples que imita a virtude”; “a excelência do discurso, da graça e do ritmo provêm da simplicidade da alma […] dessa simplicidade verdadeira de um carácter onde se aliam a verdade e a beleza”

398 a

 

 

 

 

Continuação do tema na República X

 

A hierarquia das technai

segundo o duplo critério da mimèsis o bom modelo e a boa imitação.

 

 

 

No livro X (República 595 c e ss): Exemplificação dos graus do ser

 

 

Ideia

 (inteligível, una)

“no que diz respeito à Ideia não existe nenhum artífice que a possa executar”

 

Entes sensíveis

múltiplos, particulares, mas referidos ao modelo, como produções múltiplas (da unidade).

O artesão “fixa os seus olhos na Ideia para fazer, a partir dela, as camas, as mesas e os objectos de que nos servimos” (technè)

 

 

Imagens

 (eidolon, pl: eidola)

Coisas aparentes (phainomena) mas sem qualquer verdade (aletheia)

“este mesmo artesão não tem apenas o talento de fazer todos os móveis,

mas ainda todas as plantas e modela todos os seres vivos e a si mesmo; faz a terra, o céu, os deuses, tudo o que existe no céu e tudo o que existe na terra…”

 

 

Pergunta:

“imita as coisas como são ou como parecem? (598a)

- alteração do ângulo de visão, multiplicação das perspectivas,

diferenças de estilo, produção de irrealidades (phantasma/ pl: phantasmata)

“os poetas só criam phantasmata e não entes (to onta)”

 

 

 

“Mas vê agora que nome dás ao artesão que te vou dizer […], que faz todas as coisas que os diversos artesãos fazem cada um no seu género”.

 

Analogia com o espelho: Pintor

 

 

 

Ser (inteligível)

Aparecer (sensível)

Parecer – sombras / imagem

 

 

 

O primado da filosofia (pensamento) sobre a poesia e pintura (produções de imagem)

 

Livro III: critério pedagógico e moral; critério político

Livro X: fundamentação ontológica

 

 

 

 

A mimèsis em O Sofista

219 a - 221 c

 technai → da aquisição →troca / captura →caça

     → da produção (poiètikè)

 

 

264 c- 268d

artes da produção (poiètikè)→ produção divina → realidade (mundo)

                        → imagens (sonhos)

              → produção humana → realidade (coisas, entes)

                        → imagens (eidolon / pl. eidola)

 

232 b-235 c

produção humana de imagens (arte mimética)

               → cópia (eicastikè technè). icástica

               → simulacro (phantastikè technè)

 

Cópia: eikôn (ícone)

Simulacro (phantasma)

 

 

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-- São as produções de imagem technai?

 

-- Technai da medida: - astronomia, arquitectura, música, geometria

 

 

Leituras complementares

 

Walter Benjamin, A obra de arte na era da sua reproductibilidade técnica (1936) “aura”

Jean Baudrillard, Simulacros e Simulação (1981)

José Saramago, A Caverna (2000)

 

 

 

 

 

 

Obras de carácter geral e introdutório

France Farago, L'art, Paris, Armand Colin, 1998, trad, port. A Arte, Porto, Porto Editora, 2002.

Raymond Bayer, Histoire de l'Esthétique, Paris, Armand Colin, 1961, trad. port. História da Estética, Lisboa, Ed. 70, diversas edições.

David Cooper (ed.), A Companion to Aesthetics. Oxford/Cambridge (USA), Blackwell, 1996.

Dizionario di estetica. A cura di Gianni Carchia e Paolo d’Angelo, Roma-Bari, La­terza, 1999, há trad. port.: Dicionário de Estética.

Jean Lacoste, La Philosophie de l'art, Paris, PUF, 1981

 

Sobre Platão

Pierre‑Maxime Schuhl, Platon et l'art de son temps, Paris, F. Alcan, 1933 / Platão E A Arte De Seu Tempo, Lisboa, Almedina.

Léon Robin, La théorie platonicienne de l'amour. / A teoria platónica do amor/ Paris, PUF, 1964.

Erwin Panofsky, Idea. Ein Beitrag zur Begriffsgeschichte der älteren Kunsttheorie. Berlin, W. Volker Spiess, 1985, 5ª ed; trad. franc.; Idea. Contribution à l'histoire du con­cept de l'ancienne théorie de l'art. Paris, Gallimard, 1983 / Idea a Concept in Art Theory; múltiplas traduções.

José Pedro Serra, Pensar o Trágico. Categorias da Tragédia Grega, Lisboa, Gulbenkian, 2006.