As 'artes da cal', o mundo das artes da decoração, e a dimensão da Micro-História da Arte.

18 Outubro 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

A nossa História da Arte precisa aprofundar o estudo sobre os saberes artísticos que são próprios da tradição vernácula portuguesa e que começam a ser agora reabilitados. Tudo é fruto das novas visões abrangentes que a Micro-História da Arte veio introduzir na análise da produção artística, ao iluminar com uma mais ampla perspectiva de saberes as ‘zonas’ de periferismo e as modalidades de produção que eram até há pouco consideradas 'menores'. Descobre-se um inequívoco sopro de originalidade em tantas decorações murárias com uso da cal e de 'materiais pobres', com valências expressivas que justificam, por certo, um estudo atento. E não só estudo -- também medidas de salvaguarda, conservação e revalorização.

O olhar micro-artístico sobre estes temas vem justamente no sentido de destacar esta vertente do património artístico nacional, visto à luz da Micro-História da Arte: o esgrafito, o fresco, os fingimentos murários, os marmoreados, a escaiola, as obras de massa... E o conceito ajuda a devolver consciência plural aos fenómenos de criação e recepção artística, justificando a prática de um olhar microscópico sem arrogância nem preconceito para com todas as obras de arte, eruditas ou populares. Reavalia-se assim, no campo da prática artística doméstica, uma série de intervenções geralmente menorizadas e, afinal, tão significativas para caracterizar as especificidades do nosso património. Opõe-se essa visão global à de uma historiografia assente nas «narrativas grandiosas», quase sempre alheada, porém, de qualquer dimensão antropológica ou da atenção que é devida às remanescências. Este olhar vem revalorizar este 'mundo de artes da cal', desde sempre menorizado, conferindo-lhes uma importância que a falta de enfoque havia esquecido por completo. Uma muito boa iniciativa, que vivamente se recomenda !