Representatividade de projecto sobre Bijagós

13 Novembro 2019, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

NOVEMBRO                                   4ª FEIRA                                          16ª Aula

 

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Retomámos a matéria em discussão, iniciada na aula anterior, com uma informação que me pareceu necessária para que os alunos se inteirassem melhor do contexto que propiciara este estudo de caso. Elucidei-os de que oriento um projecto independente sobre a etnia Bijagó e que numa primeira fase realizada entre 9 e 24 de Janeiro deste ano visitei com três investigadores as ilhas de Bubaque e Orangozinho no Arquipélago de Bijagós. Falei da experiência comum muito enriquecedora e das realizações que alcançámos: um filme sobre pesca artesanal que se encontra em fase de montagem, conversas com vários interlocutores de diferentes idades, entrevistas e fotografias, observação e participação em danças tradicionais, visitas a três tabancas (aldeias) e contacto directo com as populações que se saldou, por exemplo, no apoio físico à construção de uma casa tradicional seguido de refeição comunitária. Houve notas esparsas sobre gastronomia Bijagó que resultaram do acompanhamento diário de confecção das nossas refeições.

Produzi um texto de reflexão, logo em Fevereiro, apresentado em colóquio do Centro de Investigação de Filosofia da FLUL sobre o futuro das artes. Este contributo não recolheu o interesse dos presentes na assistência ao colóquio que se manifestaram com estranheza sobre os pontos de vista que defendi. A sociedade sobre a qual falei e nos termos em que o fiz não era representativa dos padrões da arte ocidental. O meu principal argumento era exactamente esse e a defesa que fiz do povo Bijagó ajustava-se a que ele pudesse vir a ser factor de mudança por congregar ancestralidade com contemporaneidade de uma forma harmoniosa.

Referi ainda aos alunos que o projecto investigativo vai entrar numa segunda fase a partir de 2020 com regresso ao Arquipélago em Fevereiro de 2021. Agregaremos novos investigadores a esta etapa que irá considerar a geodança, a insularidade como tema de coreografia, a escrita de peça de teatro e eventual encenação, o estudo do sagrado e rituais, a observação do Carnaval Bijagó associado ao de outras etnias guineenses.

Mantemos assim um projecto artístico de avanço muito lento, o que nos irá permitir não só estudo mais concentrado sobre o que ainda não conhecemos, como também que procuremos as melhores condições possíveis para a nossa acção.

Esclarecido o enquadramento desta última parte do programa, conversámos sobre pequenos excertos do vídeo visionado antes. Houve esclarecimentos breves a propósito de máscaras de animais em madeira maciça usadas por bailarinos em dança tribal e como forma de articulação entre a arte e o quotidiano comunitário, comentámos o material e a altura das saias usadas por mulheres em idêntica dança salientando quem dança desnudada ou não da cintura para cima, referimos a presença artística de mulheres na prática de percussão de tamborins. Este último aspecto indicia um fenómeno comum naquelas paragens e que se reporta ao facto de a arte da percussão poder ser comum a homens e mulheres, ainda que tradicionalmente seja executada por homens em instrumentos de grande porte, fenómeno comum a outros países vizinhos como o Senegal, o Mali e a Mauritânia.

Discutimos ainda um traço milenar que salienta o amor e o respeito que as gerações mais novas têm pelos velhos. Nestes reconhece-se a valorização dos ensinamentos que transitam de geração em geração e a devida protecção que lhes é dedicada como forma de reconhecimento pela atenção e amor devotados à comunidade em que vivem.

O pequeno vídeo permitiu ainda apercebermo-nos dos conhecimentos sobre medicina tradicional e seu uso, bem como escutarmos da boca de homens velhos a importância atribuída às árvores como ligação entre um mundo divino superior e mundo divino inferior. Isto significa que a relação entre os seres vivos e a natureza perde a dimensão hierárquica para se plasmar num universo identificado como uno e provavelmente indivisível.

A questionação damasiana só alcança este nível como proposta e naturalmente como processo com vista à idealização de modelos que não se revêem nem no presente nem no passado da vida na Terra, embora identificados a partir de seres vivos que existiram há milhões de anos e que congregam na sua constituição todas as caracteristicas, por exemplo, de uma homeostasia individual e social.

 

Leitura recomendada

DAMÁSIO, António 2017. A Estranha Ordem das Coisas – A vida, os sentimentos e as culturas humanas, Lisboa: Temas e Debates | Círculo de Leitores. Pesquisa orientada a partir de índice de conceitos no final da obra. O conceito em estudo é homeostasia. A referência no volume em papel é a p. 374.

 

Pequeno vídeo

https://www.youtube.com/watch?v=P9EN8_jvOfI