Damásio, os sentimentos, a cultura e as artes. Exemplo de uma sociedade homeostática: Os Bijagós

17 Abril 2018, 14:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

ABRIL                          3ª FEIRA                                        14ª Aula

 

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Saída de campo:

Assistência ao espectáculo PAIAÇÚ (Pai Grande), inspirado nos Sermões do Padre António Vieira, em encenação de Miguel Abreu e João Grosso, com João Grosso e Sílvia Filipe. Igreja de São Roque, dia 14 de Abril 19:00-20:00, seguido de visita guiada pela igreja.

 

Detivemo-nos hoje no comentário a algumas passagens do capítulo 10 Culturas – da Parte III – A Mente Cultural em Acção do último livro de António Damásio, A Estranha Ordem das Coisas.

Tendo inicialmente ficado com a sensação de que esta leitura e o estilo de escrita em que foi produzida não tinha sido acessível às alunas e aos alunos, naturalmente para os poucos que a tinham realizado, e não para aqueles que pelo seu mutismo pareciam estar alheados da mesma, propus que partíssemos daquilo que não tinha sido compreendido e não de uma análise sequencial dos diversos momentos textuais do capítulo.

Resultou felizmente esta estratégia que pelo menos serviu para compreendermos que havia uma tese no pensamento de Damásio e que era a seguinte: «Limito-me a concentrar-me nos afetos – e, sobretudo, nos sentimentos, -, na esperança de que possam vir a ser mais claramente incorporados na ligação entre biologia e as culturas. Para isso devo insistir no papel da homeostasia e do seu representante consciente – os sentimentos – no processo cultural.» (Damásio, 2017:230-231)

Nesta passagem, o horizonte de espectativa situa-se no estabelecimento de relações conscientes, regulares e criativas entre o que é o nosso corpo e a sua mente e de como ele é produtor de conhecimento próprio e extensivo ao domínio societário. Tudo isto, que é muitíssimo, pressupõe na óptica damasiana, que o processo seja gerador de homeostasia (a capacidade de criar regulação interna e externa nos seres vivos, em particular, nos seres humanos), fenómeno facilitado pela acção dos sentimentos e suas manifestações, pela aceitação da dimensão subjectiva dos mesmos, quer na construção de uma cultura, quer na constituição da mesma através de crenças religiosas, diversos tipos de arte, fundamentações ético-morais, recurso à normatividade, reconhecimento de costumes e usos como suporte da presença e acção humanas no contexto social.

O facto de se passarem a entender os sentimentos, de um ponto de vista actual e comprometido, como factor de criação de equilíbrio ao longo da História humana, reserva-lhes um papel indissociável e gerador de «novas formas de resposta» (235). Damásio salienta a sua função de «árbitros» (235) desse processo cultural.

Comentámos ainda a função terapêutica da arte, especificamente das artes performativas, reconhecendo nela outras possibilidades de em nós criarem prazer e benefício, isto é de contribuírem para a valorização da nossa condição homeostática. Numa perspectiva positiva, a arte pode «aliviar o sofrimento alheio e [proporcionar] prazer em descobrir como consegui-lo; a alegria que resulta de encontrar maneira de melhorar a vida dos outros, da oferta de bens materiais às invenções que resultem em felicidade; o prazer de observar os mistérios da natureza e a tentativa de os solucionar.» (239) Escolho a perspectiva que atribui à arte uma função propedêutica, mas o autor não exclui a herança de violência que nos modela e que resulta de um quadro genético de muitos milhares de anos. (239-240)

Propus a seguir o visionamento de alguns excertos disponíveis na Internet dedicados à observação da etnia Bijagó (Guiné -Bissau) com características particulares entre povos antigos. Esta etnia organiza-se segundo padrões sociais matriarcais, pratica uma religião animista e possui um sentimento comunitário muito forte, tendo em conta a prioridade grupal das novas gerações. Os Bijagós não foram escravizados durante a vigência do colonialismo.

 

Leitura recomendada:

- DAMÁSIO, António 2017, A Estranha Ordem das Coisas. A vida, os sentimentos e as culturas humanas, Lisboa: Temas e Debates/Círculo de Leitores (excertos), Parte III, A mente cultural em acção, Capítulo 10, Culturas, pp. 225-263.

 

 

FERREIRA ALVES, Clara (texto), BARRA, Luís (fotografias), A Vida dos Sentimentos, in: Jornal Expresso, E-A revista do Expresso, 27 de Outubro de 2017, pp. 26-34.

http://expresso.sapo.pt/sociedade/2017-11-05-A-vida-dos-sentimentos#gs.OGv9rTg

 

Vídeos visitados:

https://vimeo.com/69622548

https://www.youtube.com/watch?v=udegEFdcZmQ