Ballet Triádico - duas versões a partir de Oskar Schlemmer

22 Novembro 2019, 18:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

NOVEMBRO                        6ª FEIRA                               19ª Aula

 

 

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Por uma questão de recuperação da memória do que antes visionáramos das três coreografias de O Ballet Triádico que Oskar Schlemmer concebera, em 1922, tomei a liberdade de voltar a propor aos alunos o mesmo visionamento. Estaríamos assim mais atentos não apenas aos efeitos causados pela surpreendente concepção de figurinos, seu uso e enquadramento espacial, mas passaríamos a dedicar mais tempo ao movimento dos intérpretes e à sua interacção.

Esta revisitação permitiu-nos salientar o modo como a concepção cenográfica se apresenta na qualidade de um espaço cúbico abstracto (apenas indiciado pela mudança de cor em cada ballet apresentado), e como apesar dessa característica inerente à espacialidade, conseguimos olhar para os bailarinos como construtores de movimento e em directa relação com esse lugar despojado ou onde pontuam estruturas cénicas de utilização variada. Olhamos então para os bailarinos reconhecendo neles a capacidade de transformarem o espaço abstracto em espaço organicamente biológico através dos seus corpos, experiência e acção.

É de Schlemmer a ideia de que como espectadores somos capazes de criar um imaginário mental (e fizemo-lo várias vezes), emocional, também espiritual, que constrói um espaço próprio com função mediadora entre o espaço cénico e o trabalho em cena dos bailarinos. Quer isto dizer que o tema schlemmeriano que articula «o homem e o espaço»

No caso da revisitação de Margarete Hasting, constatámos uma fidelidade muito expressiva mas sem grande liberdade de criação relativamente à proposta de Oskar Schlemmer. Os bailarinos-figurinos iam preenchendo o espaço e dele se apropriando em solos e contracenas que utilizavam o trabalho em pontas, o salto coreográfico, ou o pas de deux, embora também a pantomima, ou a dança popular.

A perspectiva schlemmeriana que tematiza preferencialmente a «relação do homem com o espaço» tem aqui uma proposta clara de síntese entre o espaço abstracto (a cena) e o espaço orgânico (o dos bailarinos), sendo que a articulação entre ambos resulta de uma construção que se propõe assimilar o espaço orgânico e emocional (bailarinos e espectadores) em busca de uma nova unidade entre «intelecto, corpo e alma». Neste contexto, o entendimento do duplo espaço adquire uma condição dinâmica que aproximava Schlemmer dos neo-românticos, na medida em que para ele a relação do homem com espaço pressupunha a ligação ao espaço cósmico.

A sua concepção da arte, mesmo inspirada por princípios de imaterialidade inerente ao Cosmos, não abdicou nunca das características da modernidade artística do seu tempo. E é por isso que o palco era para ele uma espécie de laboratório onde as «figuras artísticas» desempenhavam uma tripla função: ocupavam progressivamente um espaço que lhes era em princípio estranho, interagiam com ele corporalmente e expressavam uma dimensão simbólica também contida nesse programa artístico.

Tendo como orientação estas linhas condutoras da estética de Oskar Schlemmer, podemos agora interrogar-nos se a versão de 1989 do coreógrafo e bailarino Gerhard Bohner de O Ballet Triádico (1922) manteve com o material de arquivo do Mestre da Bauhaus uma relação simbiótica.

Em aula verificámos que havia nesta versão, relativamente à anterior, uma maior liberdade de concepção e até de arrojo na representação. Verificámos que a música composta para esta versão (Hans-Joachim Hespos) era causadora de incómodo e mesmo irritação para alguns. No anterior caso (Erich Ferstl) nada fora assinalado.

A autonomização do desempenho dos bailarinos não significa que este novo artista tenha posto em causa os princípios básicos de Oskar Schlemmer na sua concepção das artes de palco. Provavelmente a sua interpretação foi entendida, por um lado, como possibilidade de actualização dos pressupostos conceptuais criados durante o tempo da Bauhaus, o que não significa rejeição, e, por outro lado, os bailarinos como seres que constroem um espaço biológico puderam fazê-lo com mais intimidade, mais emoção, não deixando por isso de se recriarem com o próprio espaço cénico.

Chamo a atenção para a primeira cena da parte preta (1ª reconstrução) e a mesma cena (2ª reconstrução). Em ambos os casos temos uma única bailarina em palco. A diferença entre as duas propostas é abissal, o que não quer dizer que qualquer uma delas tenha de trair o espírito e a forma originais do que Oskar Schlemmer criou.

Estamos a poucos minutos da conclusão do visionamento do DVD proposto.

Faremos certamente breve discussão sobre o trabalho deste artista residente da Bauhaus.

 

DVD visionado

Bühne und Tanz | Stage and Dance – Oskar Schlemmer, Edition Bauhaus, 30 min. The Triadic Ballett (1970) Objectos fílmicos reconstruídos por Margarete Hasting (1969, 1970), 72 min. The Triadic Ballett (1989) objecto fílmico reconstruído por Gerhard Bohmer Língua alemã, língua inglesa na legendagem inicial de cada coreografia, 2014.

 

Endereços electrónicos sugeridos

https://www.bauhaus100.com/the-bauhaus/people/masters-and-teachers/oskar-schlemmer/

https://performatus.net/estudos/oskar-schlemmer/