Síntese das Artes - Kandinsky: teoria e prática

18 Outubro 2019, 18:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

OUTUBRO                                      6ª FEIRA                                          10ª Aula

 

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Na esperança de termos suficiente material para discussão sobre esta matéria, pedi aos alunos que registassem em casa, por escrito e em cinco linhas o que entendessem poder expressar o seu acompanhamento de Quadros de uma Exposição de Kandinsky inspirado em anteriores criações (pintura exposta e música).

Houve algumas tímidas respostas, bem-vindas, claro, que nos levaram a equacionar a possibilidade de registo escrito das mesmas e a serem enviadas por e-mail para mim. Chegaram contributos que irei analisar e comentar criando assim substância para que possamos reflectir sobre o que afinal fez Kandinsky (prática artística cénica) e de como se aplicou a sua proposta teórica Sobre a síntese abstracta para palco (1923) à mesma obra.

Optámos então por rever em DVD, alguns dos quadros da Composição para Palco com o firme propósito de atribuirmos sentido a formas geométricas que apareciam e se movimentavam à nossa frente, com cor ou em registo de preto e branco e através das quais se construía cada composição específica. Chamámos a atenção para a importância do desenho de luz, através do qual se operavam modificações em fases anteriores do processo. Este, porém, dependia sempre do ritmo, altura, velocidade e «colorido interior» proporcionado pela partitura de Mussorgsky. E foi perante esta realidade que verificámos, por exemplo, no quadro musical 15 – A cabana de Baba Yaga – que a proposta plástica de Kandinsky cria um dispositivo de formas e de luz que caminha em termos de movimento e ritmo de acordo com a inspiração de Mussorgsky. O contraste esperado entre a independência da música e a expressão da forma plástica de que viria a decorrer a síntese das artes não acontece. Nunca saberemos por que razão Kandinsky se deixou possuir pela música do seu conterrâneo e criou um modo sintónico entre ela e a imagem de um relâmpago (no excerto abaixo). A audição musical precisou de uma referência recuperada do mundo natural afecta à experiência de vida de Kandinsky. Neste exemplo, o concreto mediou o abstracto auditivo e visual dentro do mesmo tom e impulsividade. A síntese das artes não conheceu desta vez o caminho proposto em teoria.

 

«O prospecto consta de três partes: meio – branco, as laterais a preto, nas quais estão recortados buracos (cf. desenho!), através dos quais são iluminados por

lanternas de bolso (como nos Quadros 8 e 9).Escuro total no início, estando a parte central branca oculta por um écran preto invisível. Afigura que aí vai aparecer (IV) já está no lugar masescondida.

 Ao compasso 9º (p. 24; P. 3) a iluminação processa-se como se fosse um relâmpago por detrás das duas partes laterais. Ao compasso 3º (P. 4) acontece a mesma coisa, mas 2 vezes.

Em mf (P. 4) os buracos compridos do lado direito são iluminados de baixo

para cima e detrás, etc. Outras indicações ver a partitura para piano! (Também seria possível iluminar os buracos com cores – como indicado no desenho – o

que poderia ser feito com diversas lanternas de bolso coloridas, se os meios técnicos o permitirem). A parte central só se torna visível com o

andante mosso

 (p. 27; P. 1) Tudo termina com ppp

 (p. 28; P. 4).Para detalhes ver a partitura para piano.

Para as mudanças de cena do Quadro 16 dispomos de 4 minutos, o que é suficiente.» (Kandinsky, 2018: 499)

 

O guião kandinskiano de Quadros de uma exposição fornece preciosa informação para melhor compreendermos o processo de nascimento em palco desta obra e ao mesmo tempo nos situarmos historica e tecnicamente no horizonte de meios artísticos então disponíveis. Quem hoje recorreria a lanternas de bolso para a criação de desenhos de luz que foram essenciais na época de apresentação pública desta obra cénica?

Alguns dos alunos e colaboradores de Kandinsky para esta produção, como Félix Klee (filho do pintor Paul Klee), deitavam as mãos à cabeça de cada vez que era preciso repetir procedimentos de iluminação. A Bauhaus também foi isto.

 

Leituras recomendadas

 

KANDINSKY 1994. Complete Writings on Art, edited by Kenneth C. Lindsay and Peter Vergo, Paris, New York: Da Capo Press

 

http://periodicos.unb.br/index.php/dramaturgias/issue/view/1638/365

https://www.dw.com/en/kandinsky-and-mussorgsky-what-happens-when-artists-inspire-each-other/a-19087823

DVD visionado

Bühne und Tanz | Stage and Dance – Wassily Kandinsky, Edition Bauhaus, 36 min. língua alemã e língua inglesa, 2014.