Ainda Panofsky e a Iconolpogia.

5 Abril 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

No livro Through the Looking-glass and what Alice found twere, Lewis Carroll narra o fascínio de Alice, junto ao gato negro Kitty, pelo grande espelho que a intriga, onde se reflecte o quarto em que está encerrada, até ao momento em que finalmente atravessa o espelho e penetra na sua aventura. Aí, dentro, tudo é igual à imagem que Alice podia ver reflectido na superfície, mas tudo o que não era entrevisto na imagem reflectida é, pelo contrário, muito diferente do imaginável... É o mundo da fantasia, todavia com regras precisas, um mundo que Alice tem de percorrer para o poder compreender na sua globalidade...

Através do espelho... Através da imagem... A abordagem iconológica encontra nesta dimensão de entrega ao total descobrimento as suas mais  puras raízes, o seu inflamado desejo de flanquear a superfície das coisas (e das obras de arte) para poder descobrir o seu lado escondido, a sua face oculta... A História da Arte passou o tempo’vasariano’  das biografias e o tempo ‘morelliano’ das leituras formais dotadas da maior cientificidade, aprendendo nas várias vertentes – histórica, documental, laboratorial, sociológica, semiótica – um pouco da sua especificidade como disciplina dotada de fascínios no modo sempre irrepetível de saber ver em globalidade as obras de arte.

Eis que a ICONOLOGIA ultraopassa a sua dimensão de ramo operativo da História da Arte e, passando pelo bom uso da Iconologia, é capaz de apontar sentidos, descodificar programas, entretecer mistérios que as imagens oferecem aos espectadores, ao longo dos tempos. Depois do uso do termo no dicionário de símbolos que Cesare Ripa editou em Roma (Iconologie, 1593) e reeditou, ilustrado, em 1603, a Iconologia ressurge em Roma, em Outubro de 1912, no X Congrès International d’Historiens d’Art, por palavras de Aby Warburg (1866-1929), ao expôr a sua «leitura iconológica» dos frescos do Palazzo Schifanoia em Ferrara, em oposição às leituras formais e estritamente descritivas dos seus colegas. Na sua biblioteca de Hamburgo, Warburg reunirá materiais de approche interdisciplinar da H. Arte com a Astrologia, a História das Religiões, a Antropologia, a Sociologia, a Literatura, o Folclore, etc, assim nascendo o Instituto Warburg, que o regime nazi obrigará a transferir em 1933 para Londres. Sob direcção de Fritz Saxl, ´o Instituto recebe grande impacto: aí se formarão Ernst Cassirer e erwin Panofsky, entre outros...

Recordando de novo o modo como o estudo do significado das obras de arte foi esquecido, compara a Iconologia com a Geologia e a Iconografia com a Geografia: esta limita-se a registar as coisas terrenas, enquanto que a Geologia estuda as estruturas, a origem, a evolução, a coerência dos diversos elementos e materiais do planeta... A mesma imagem metafórica se pode aplicar à Cosmografia /Cosmologia, à Etnografia /Etnologia, que permitem o mesmo raciocínio: aquelas disciplinas limitam-se a constatar, as últimas a explicar e interpretar... Hoogewerff seguirá o ‘colossal trabalho iconográfico’ de Émile Mâle para traçar as bases de uma iconologia da arte cristã medieval em França. A hagiografia, as crenças e superstições, a história dos Concílios, a patrologia, a himnologia, os apócrifos, os textos sagrados, servem-lhe para compreender ‘iconologicamente’ op sentido da arte românica e gótica francesa.
A introdução, em 1939, aos Studies in Iconology de Erwin Panofsky vai aprofundar estes conceitos e fazer a célebre distinção entre três níveis de leitura das obras de arte:
1. Nível pré-iconográfico, com descrição ‘primária e natural’ dos objectos, acontecimentos e imagens em termos estritos de formas e de estilos;
2. Nível iconográfico, com ‘análise dos temas e conceitos específicos’ expressos pelos objectos segundo as fontes literárias e/ou o seu tipo ou época;
3. Nível iconológico, onde se situa a leitura interpretativa dos significados intrínsecos da Obra de Arte em apreço segundo o quadro contextual (social, ideológico, político, etc) e segundo o quadro mais lacto dos símbolos e códigos que a informam como «tendência essencial do espírito humano».

Observações sobre a Semiótica: Origens e desenvolvimentos: Ferdinand de Saussure e Charles Sanders Pierce –Roland Barthes e Umberto Eco •A crítica semiótica opera uma fusão entre a crítica formalista e a iconologia, procurando a explicação dos mecanismos da significação •Norman Bryson e a «New Art History» anglo-americana: o Historiador tem de dar conta –Não só da perspectiva «arquival» (a obra no contexto do seu tempo) indagando sobre todas as dimensões sociais e culturais do contexto de criação e fruição da obra –Mas também do carácter «projectivo» do signo, interpretando igualmente as diferentes recepções da obra através dos tempos.

Crítkica das Motivações: •Sociologia da Arte–Macro-sociologia de influência marxista (Frederick Antal e Arnold Hauser)–Micro-sociologia – imaginário como instância mediadora (Pierre Francastel)–Perspectivas mais recentes: estudos sobre o Mercado da Arte e sobre o Estatuto Social do Artista•Psicologia da Arte–Psicologia da criação artística – René Huyghe–Psicanálise da Arte – S. Freud e J. Lacan•Antropologia da Arte–Estudos de Género –Multiculturalismo e interculturalidade –Problemáticas do Corpo na Arte