Algumas posições sobre Antropologia Filosófica
26 Outubro 2018, 10:00 • Adriana Veríssimo Serrão
Algumas posições sobre Antropologia Filosófica
A necessidade de um saber sobre o Homem
“O mais útil e o menos avançado de todos os conhecimentos humanos parece-me ser o do homem”. [1]
“Todos os progressos na cultura, mediante os quais o homem faz a sua formação escolar, têm o propósito de usar esses […] conhecimentos soltos [Kenntnisse] e aptidões adquiridos para o uso do mundo, mas, neste mundo, o objecto mais importante a que ele os pode aplicar é o homem, pois ele é o seu próprio fim último.” [2]
A posição de Kant
“O campo da Filosofia nesta acepção cosmopolita pode reconduzir-se às seguintes questões:
1) O que posso saber? (Was kann ich wissen?)
2) O que devo fazer? (Was soll ich tun?)
3) O que me é lícito esperar? (Was darf ich hoffen?)
4) O que é o Homem? (Was ist der Mensch?)
À primeira pergunta responde a Metafísica, à segunda a Moral, à terceira a Religião e à quarta a Antropologia.
No fundo, poder-se-ia contar tudo isto como Antropologia, uma vez que as três primeiras questões se referem à última." (Kant, Logik, A 25).
[…] “Contudo, a todas as tentativas de alcançar uma tal ciência bem fundamentada opõem‑se consideráveis dificuldades que pertencem à própria natureza humana:
1. O homem que nota que o observam e o tentam examinar parecerá embaraçado (incomodado) e, nesse caso, não pode mostrar‑se tal como é; ou então dissimula‑se, e com isso não quer ser conhecido tal como é.
2. Mas se quiser examinar‑se a si mesmo, sobretudo no que diz respeito ao seu estado em situação de afecção, chega a uma situação crítica que habitualmente não permite nenhuma dissimulação, a saber: quando os móbiles estão em acção, ele não se observa, e quando se observa, os móbiles são neutralizados.
3. Quando são duradouras, as circunstâncias de lugar e de tempo provocam hábitos, que, como se costuma dizer, são uma segunda natureza e dificultam o juízo do homem sobre si mesmo, sobre o que deve pensar de si, mas mais ainda sobre o conceito que deve fazer de um outro homem com quem está em relação; com efeito, a alteração da situação em que o homem está colocado pelo seu destino ou que ele, como aventureiro, também coloca a si mesmo, torna muito difícil à Antropologia elevar‑se ao estatuto de uma ciência estrita.
Por fim, existem sem dúvida, não fontes, mas meios auxiliares para a Antropologia: história universal, biografias, e mesmo peças de teatro e romances. Pois, se bem que aos últimos não subjaza propriamente experiência e verdade, mas apenas seja permitido apresentar aqui efabulação e exagero dos caracteres e situações em que os homens são colocados, à semelhança de imagens oníricas, e portanto pareçam não trazer nada para o conhecimento do homem, aqueles caracteres, tal como foram esboçados por um Richardson ou um Molière, tiveram de ser extraídos nos seus traços fundamentais da observação do que o homem realmente faz e deixa fazer; porque se é certo que em grau excedem a natureza humana, na qualidade porém têm de ser coincidentes com ela.
Uma Antropologia em abordagem pragmática, sistematicamente esboçada e no entanto popular (com recurso a exemplos que cada leitor pode além disso descobrir), traz consigo uma vantagem para o público leitor: graças à exaustividade das rubricas sob as quais pode ser colocada a observação de tal ou tal propriedade humana retirada da prática, oferece‑se ao leitor a oportunidade e o desafio de fazer de cada uma delas um tema próprio e de a colocar na secção a que pertence; assim, nesta Antropologia, os trabalhos repartir‑se‑ão por si mesmos entre os amadores deste estudo e serão reunidos num todo exactamente pela unidade do plano; deste modo, o desenvolvimento desta ciência de interesse geral será favorecido e acelerado.”[3]
Algumas posições de pensadores do século XX
“toda a asserção sobre o homem implica sempre uma afirmação sobre si mesmo, o que significa uma afirmação deste homem na sua situação. Toda a vida humana seria, por isso, hermenêutica em si mesma.” [4]
"A visão do homem (Mensch-Anschauung) reflecte-se involuntária e voluntariamente em tudo o que pensamos, fazemos e produzimos. Todos os domínios culturais de um povo e de uma época contêm uma auto-compreensão humana não expressa e multi-fragmentada, uma ´antropologia implícita’, como se poderia dizer, e têm nela um dos aspectos determinantes da sua configuração. Cada filosofia deixa-se circunscrever em uma antropologia."[5]
“Não há problema filosófico cuja solução reclame o nosso tempo com mais peculiar premência do que o problema de uma antropologia filosófica.” Pela qual entendo “uma ciência fundamental da essência e da estrutura essencial do homem”, compreendendo: a relação com os reinos da natureza; da sua origem metafísica e do seu início físico no mundo; das forças e poderes que movem o homem e o homem move; das direcções e leis fundamentais da sua evolução (biológica, psíquica, histórico-espiritual e social; das suas possibilidades e das suas realidades. Este ambicioso projecto forneceria “um fundamento filosófico último” que daria um rumo às investigações científicas dispersas sobre o objecto “homem”. Ora, a falta de uma perspectiva unitária não decorre somente de uma dispersão epistemológica … . Ela marca, pela primeira vez na História, uma total falta de consciência de si, de saber de si.
[…]
“Ao cabo de uns dez mil anos de “História”, a nossa época é a primeira em que o homem se tornou plena, inteiramente ‘problemático’; já não sabe o que é, mas sabe que não o sabe.”[6]
Noções de metodologia: as referências bibliográficas
Referência bibliográfica de uma obra com um só autor:
Pelo sistema autor/ título
Leonel Ribeiro dos Santos, Linguagem, Retórica e Filosofia no Renascimento, Lisboa: Edições Colibri, 2004.
Júlio Fragata, Noções de Metodologia para a Elaboração de um Trabalho Científico, Porto: Livraria Tavares Martins, 1973.
Pelo sistema autor/ data / título
Leonel Ribeiro dos Santos, 2004, Linguagem, Retórica e Filosofia no Renascimento, Lisboa: Edições Colibri.
José H. Silveira de Brito (2001), Introdução à Metodologia do Trabalho Científico, Braga, Universidade Católica de Braga.
Referência bibliográfica de uma obra com dois autores:
M. Ribeiro Sanches e A. Veríssimo Serrão, A Invenção do “Homem”. Raça, Cultura e História na Alemanha do século XVIII, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2002.
Referência bibliográfica de uma obra com editor, director ou organizador:
Pedro Calafate (dir.), História do pensamento filosófico português; vol. II. Renascimento e Contra‑Reforma, Lisboa: Caminho, 2001.
Referência bibliográfica de uma obra com vários editores, directores ou organizadores:
Ensinar Filosofia? O que dizem os filósofos, coord. M. José Vaz Pinto e M. Luísa Ribeiro Ferreira, Lisboa, Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2013.
ou:
M. José Vaz Pinto e M. Luísa Ribeiro Ferreira (coords.), Ensinar Filosofia? O que dizem os filósofos, Lisboa, Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2013.
Ensinar e Aprender Filosofia num mundo em Rede, coord. M. Luísa Ribeiro Ferreira, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2013.
ou:
M. Luísa Ribeiro Ferreira (coord.), Ensinar e Aprender Filosofia num mundo em Rede, Lisboa, Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2013.
[org.= organizador; ed.= editor: dir.= direcção de…]
Referência bibliográfica de uma obra com vários autores:
AA. VV., História del Mundo Contemporáneo, Madrid: Anaya, 1979.
[AA. VV.= autores vários]
Referência de um artigo de uma Antologia (ou capítulo de um livro):
Pierre-Jean Labarrière, "Textos sobre texto ou como silenciá-lo?" em [in]: Texto, Leitura e Escrita. Antologia, coord. de Irene Borges Duarte et alii [et al.] (org.), Porto: Porto Editora, 2000, pp.185-192.
[em = in]
[et al.] = e outros
Referência de um artigo de revista:
Cristina Beckert, "A estética do invisível na natureza", Philosophica, Lisboa, n.º 29 (2007), 7-17.
Pedro Alves, "A ideia de uma filosofia primeira na Fenomenologia de Edmund Husserl", Philosophica, 7 (1996), pp. 3-37.
ou: Pedro Alves, "A ideia de uma filosofia primeira na Fenomenologia de Edmund Husserl", Philosophica, 7 (1996), 3-37.
ou: Pedro Alves, "A ideia de uma filosofia primeira na Fenomenologia de Edmund Husserl", Philosophica, Lisboa, Revista do Departamento de Filosofia, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 7 (1996), pp. 3-37.
Referência de uma tradução:
I. Kant, Crítica da Razão Pura, trad. port. de Manuela Pinto Ribeiro e Alexandre Fradique Morujão. Introdução e notas de Alexandre Fradique Morujão, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 3.ª edição, 1994.
ou:
Kant, Kritik der reinen Vernunft / Crítica da Razão Pura /, trad. do alemão de M. Pinto Ribeiro e A.Fradique Morujão. Introdução e notas de A. Fradique Morujão, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 3.ª edição, 1994.
Ou: .... 31994.
Umberto Eco, Como se faz uma tese em Ciências Humanas, trad. De …….. de Come si fà una tesi di laurea, Lisboa: Editorial Presença,1980.
ou:
Umberto Eco, Como se faz uma tese em Ciências Humanas, Lisboa: Editorial Presença,1980.
Referência de uma entrada de dicionário ou enciclopédia:
A. Coxito, "Cartesianismo em Portugal" em [in]: Logos. Enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia, Lisboa-São Paulo, Ed. Verbo, vol. 1, 1989, cols. 849-857.
[col. = coluna; cols. = colunas]
[1] Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a desigualdade, 1755; Discours sur l'origine et les fondements de l'inégalité parmi les hommes; Oeuvres Complètes, Paris: Seuil, 1971, vol. 2, p. 208.
[2] Kant, Antropologia numa Abordagem Pragmática, publicada em 1798, “Prefácio”, trad. port. de Adriana Veríssimo Serrão, in A Invenção do “Homem”. Raça, Cultura e História na Alemanha do século XVIII, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2002, pp. 50-52.
[3] Kant, Antropologia numa Abordagem Pragmática, publicada em 1798, “Prefácio”, trad. port. de Adriana Veríssimo Serrão, in A Invenção do “Homem”. Raça, Cultura e História na Alemanha do século XVIII, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2002, pp. 50-52.
[4] Wilhelm Dilthey, Gesammelte Schriften, vol. 7, 4ª ed. 1965, p. 279.
[5] Michael Landmann, De Homine, Der Mensch im Spiegel seines Gedankens, Problemgeschichte der Wissenschaft in Dokumenten und Darstellungen, Freiburg / München: Orbis Academicus, 1962, pp. XI-XII.
[6] Max Scheler, “Mensch und Geschichte”, Die Neue Rundschau, Berlin 37 (1926); Gesammelte Werke. Späte Schriften, Bern und München: Francke Verlag, 1976, Bd.9, 120-144; trad. espanhola in El porvenir del Hombre, La Idea del Hombre y la Historia (pp.19-52), El puesto del Hombre en el Cosmos, Buenos Aires / México: Espasa-Calpe, 1942.