Sumários
I. PREPARAÇÃO DO TRABALHO DE TTF/EF .II. NOÇÕES DE METODOLOGIA: AS CITAÇÕES E AS NOTAS DE RODAPÉ
26 Outubro 2015, 12:00 • Adriana Veríssimo Serrão
– Escolha de 2 autores/ textos, um dos quais do livro Ensinar Filosofia? O que dizem os filósofos, coord. M. José Vaz Pinto e M. Luísa Ribeiro Ferreira, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2013. O 2.º texto pode ser de escolha livre.
– Escolha de um tema que permita estabelecer uma comparação entre ambos.
Este tema será desejavelmente um (ou mais) conceitos ou um problema filosoficamente relevantes e sugeridos pelos textos.
Ex: A concepção de filosofia no texto A e no texto B
A concepção de razão segundo A e B
A utilidade/função do pensar segundo A e B
O método da filosofia segundo A e B
A figura do filósofo: Comparação entre A e B
– O trabalho vai requerer:
1) Estudo do(s) conceito(s) em Obras Instrumentais (pelo menos uma)
- Vocabulários e Dicionários de conceitos filosóficos.
- Enciclopédias de Filosofia.
- Histórias da Filosofia.
2) Apoio de Literatura Secundária / Estudos (pelo menos uma obra ou um artigo).
Exercício: Estudo de conceitos e pesquisa de obras instrumentais. 3 -4 pp.
Entrega: 2 de Novembro
Textos de trabalho na próxima aula:
“Ludwig Feuerbach – O ensino da filosofia como prática dialógica”, op. cit., pp. 174-177.
“Nietzsche – O filósofo como educador”, op. cit., pp. 178-187.
II. NOÇÕES DE METODOLOGIA: AS CITAÇÕES E AS NOTAS DE RODAPÉ
É necessário distinguir entre a questão do método, ou dos métodos da filosofia, que constitui uma questão intrinsecamente filosófica, e a metodologia requerida para a elaboração e apresentação de um trabalho científico, incluindo o trabalho filosófico. Neste caso, trata-se de um conjunto de regras, partilhadas pela comunidade científica, que dotam um texto (seja, um artigo de revista, um capítulo de uma obra colectiva, uma publicação independente, ou, no caso do estudante universitário, os diversos trabalhos temáticos) de um certo número de características formais. Embora não exista um modelo rígido, nem um modelo único, sendo mesmo praticadas e admitidas pequenas variantes – note-se que muitas revistas filosóficas apresentam as suas próprias normas e impõem aos seus colaboradores a obediência estrita às mesmas –, existem alguns critérios fundamentais que o estudante tem de conhecer e deve praticar nos seus trabalhos[1].
Entre estas regras contam-se a referência bibliográfica das obras (livros ou outro tipo de textos), bem como o uso ponderado das citações.
A citação é um procedimento quase indispensável, uma vez que trabalhamos com textos, a partir de textos e "sobre textos", num contínuo exercício de explicação-interpretação, que é, no fundo, uma forma de diálogo. Através da citação de frases ou pequenos excertos dos filósofos, estamos a dar-lhes a palavra, salientando as passagens mais relevantes, ao mesmo tempo que vamos também confirmando que a nossa interpretação é fiel ao seu pensamento.
O número de citações não tem regra fixa. Depende sobretudo do critério da pertinência (não usar citações desajustadas), da necessidade (não usar citações repetidas e desnecessárias) e do bom-senso.
As citações devem ser sempre identificadas como tal, isto é, separadas por aspas, para que não haja a menor confusão com o nosso texto.
As notas de rodapé (segundo Umberto Eco)[2]
- as notas servem para indicar a fonte das citações.
- as notas servem para acrescentar a um assunto discutido no texto outras indicações bibliográficas.
- as notas servem para introduzir outras referências (cf. = confrontar).
- as notas servem para ampliar afirmações feitas no texto.
- as notas servem para confrontar afirmações (teses nossas) no texto com outras posições diferentes.
- as notas servem para fornecer o original de uma citação.
- as notas servem para “pagar as dívidas”, localizando as referências, os autores, as ideias de outrem.
EXEMPLOS:
Exemplo 1: As citações, como afirma Júlio Fragata, "são notas em que se apela para a autoridade de outros autores ou das fontes para ilustrar e, sobretudo, para documentar ou comprovar o texto"[3].
Exemplo 2: A definição da Estética como disciplina da filosofia tem variado muito ao longo das épocas históricas. Recentemente, o filósofo americano Allen Carlson oferece a seguinte definição: "A Estética é a área da filosofia que diz respeito à nossa apreciação das coisas na medida em que elas afectam os nossos sentidos, e especialmente na medida em que os afectam de uma maneira agradável."[4] O autor pretende mostrar como a Estética não se resume a uma filosofia da arte.
Exemplo 3: A importância das citações num trabalho científico é reconhecida por todos os autores de livros sobre metodologia. José Silveira de Brito, entre outros, refere a este propósito:
"Se é habitual apresentar em nota de rodapé as citações no original, as citações integradas no texto [...] devem ser escritas no idioma em que o trabalho está redigido. [...] Além disso, o esforço de tradução feito pelo autor do trabalho revelará também o domínio da matéria [...] e, por outro lado, o leitor terá uma mais fácil compreensão [sublinhados nossos/ meus]."[5]
Exemplo 4: O grande número de teorias sobre o valor estético da natureza que se têm desenvolvido nos últimos anos testemunham uma verdadeira "revolução" na atitude filosófica[6]. A saber, a filosofia volta a preocupar-se com o valor estético dos seres naturais, seja individualmente considerados, seja integrados em conjuntos naturais, designados de paisagens[7], demonstrando como a visão estética é indissociável da atitude ética.
Exemplo 5: Filosofia (gr. φιλοσοφια; lat. philosophia; ingl. philosophy; franc. philosophie; alem. Philosophie; ital. filosofia).
Exemplo 6: Analisando o texto em que Kant expõe a sua concepção do ensino da filosofia, o termo que maior dificuldade levanta à interpretação é o de Einsicht. Os tradutores não concordam numa tradução única para este termo, que tanto pode significar uma "perspectiva orientadora", como uma "intuição" ou uma "visão de conjunto"[8].
[1] Existem, em língua portuguesa, os seguintes livros dedicados à metodologia do trabalho filosófico: Júlio Fragata, Noções de Metodologia para a Elaboração de um Trabalho Científico, Porto: Livraria Tavares Martins, 1973 [existe uma outra edição publicada pelas Edições Loyola de São Paulo, em 1981]; José H. Silveira de Brito, Introdução à Metodologia do Trabalho Científico, Braga: Universidade Católica de Braga, 2001. Muito útil para este tema, e de fácil acesso, é o livro de Umberto Eco, Como se faz uma tese em Ciências Humanas, trad. port., Lisboa: Editorial Presença, 1980.
[2] Ibid. /Ibidem, pp. 163-165 (selecção do ponto V. 4.1 “Para que servem as notas”).
[3] Júlio Fragata, op. cit., p. 94.
[4] "Aesthetics is the area of philosophy that concerns our appreciation of things as they affect our senses, and especially as they affect them in a pleasant way." Allen Carlson, Aesthetics and The Environment, London and New York: Routledge, 2000, p. xvii.
[5] José H. Silveira de Brito, Introdução à Metodologia do Trabalho Científico, cit., p. 91.
[6] Refira-se, entre os mais importantes: Arnold Berleant, Living in the Landscape. Towards an Aesthetics of Environment, Univ. Press of Kansas, 1997; L. Bonesio, Oltre il paesaggio. I luoghi tra estetica e geofilosofia,. Casalecchio: Arianna Editrice, 2002; Paolo D’Angelo, Estetica della natura. Bellezza naturale, paesaggio, arte ambientale, Roma-Bari: GLF, Editori Laterza, 2000.
[7] Sobre o interesse actual da filosofia pelas qualidades da natureza, devem consultar-se: Alain Roger, Court Traité du Paysage. Paris: Gallimard, 2001; Augustin Berque, Cinc propositions pour une théorie du paysage, Seyssel : Champ Vallon, 1994; Martin Seel, Eine Ästhetik der Natur, Frankfurt am Main, Suhrkamp, 1996; Fernando Guerreiro, O caminho da Montanha. Braga: Angelus Novus, 2000. E ainda o conjunto de artigos reunidos em Finisterra. Revista Portuguesa de Geografia, vol. XXXVI, n.º72 (2001).
[8] Cf. sobre a dificuldade em verter para português o termo Einsicht, os comentários de L. Ribeiro dos Santos, in A Razão Sensível. Estudos kantianos, Lisboa: Colibri, 1994, p. 188 nota.
A filosofia e as suas questões
21 Outubro 2015, 14:00 • Maria Leonor Lamas de Oliveira Xavier
Aula nº5 (21/ 10/ 15)
A filosofia e as suas questões. Da questão da origem das ideias à questão dos princípios da acção.
Exercício prático de recensão crítica. A filosofia e as suas questões: A formulação kantiana, da pergunta trivial à questão filosófica segundo Fernando Savater. Apresentações orais de: CARMO FERREIRA, “O Socratismo de Kant”, in José BARATA-MOURA (Dir.), KANT. Comunicações apresentadas ao Colóquio “Kant” organizado pelo Departamento de Filosofia em 25/ 11/ 1981, Lisboa, 1982, pp.35-37; Fernando SAVATER, História da Filosofia. Sem medo nem pavor, trad. Pedro Vidal, Lisboa, Planeta, 2011, pp.15-16.Visita de Estudo
19 Outubro 2015, 12:00 • Adriana Veríssimo Serrão
A filosofia e as suas questões
14 Outubro 2015, 14:00 • Maria Leonor Lamas de Oliveira Xavier
Aula nº4 (14/ 10/ 15)
A filosofia e as suas questões. Amplitude da questão kantiana: o que posso saber?
O exercício de recensão crítica: participação no VI International Seminar on Aristotle: Energeia and Dunamis in Aristotle.
VIAS PARA A COMPREENSÃO DE UM TEXTO. EXEMPLIFICAÇÃO A PARTIR DO TEXTO DE EPICURO, Carta a Meneceu
12 Outubro 2015, 12:00 • Adriana Veríssimo Serrão
VIAS PARA A COMPREENSÃO DE UM TEXTO
I. EXPLICAR
- O sentido do texto é imanente ao texto.
- Limitar-se ao texto e não sair dele (não introduzir elementos estranhos).
- Explicar todo o texto, mas apenas o texto.
- Explicitar todas as noções, conceitos, temas e teses centrais (apresentá-los por palavras nossas).
- Mostrar a articulação dessas noções e teses numa síntese completa (“um todo ordenado”, segundo Kant).
- Redigir em linguagem clara e concisa.
- Recordar que a sequência dos enunciados (a "ordem da exposição") pode não coincidir com a “ordem das razões”.
II. COMENTAR
O comentário aplica-se geralmente:
- a teses (afirmações centrais).
- a curtos excertos de texto.
- pode incidir ainda sobre noções e conceitos (ou outros elementos) que permanecem ainda obscuros após a explicação e carecem de esclarecimento "fora do texto".
Segundo Pierre-Jean Labarrière, o comentário pode ser entendido como simples paráfrase ou já como um processo de invenção:
"O 'comentário' então – e entendo esta palavra que aqui surge, pela primeira vez, na sua acepção mais banal – recebe a forma de uma 'pará-frase' que duplica o texto, inscrevendo-se nas suas margens, propondo, em relação a ele, uma outra expressão, cuja forma mais simples é a tradução-transposição de língua para língua, mas que pode deslizar já na figura de uma obra original, excedendo os limites de uma repetição melhorada, para prolongar a pesquisa que se encontra aí inaugurada.
Deslize imperceptível que nos afasta da simples paráfrase do primeiro género e que delineia outras potencialidades para o comentário. Com efeito, a fecundidade do gesto originário exige este esforço de inovação que se apoia no texto, para dele extrair outras figuras de sentido, em função das exigências de uma situação nova; processo de invenção que não designa nem autoriza qualquer insuficiência do texto fundador."
Pierre-Jean Labarrière, "Textos sobre texto ou como silenciá-lo?", in Irene Borges Duarte et alii (org.), Texto, Leitura e Escrita. Antologia, Porto: Porto Editora, 2000, pp. 185-192.
Para o esclarecimento desses elementos, ser útil consultar um dicionário de língua portuguesa.
Mas é necessário recorrer a bibliografia especializada:
-- OBRAS INSTRUMENTAIS:
- Vocabulários e Dicionários de conceitos filosóficos.
- Enciclopédias de Filosofia.
- Histórias da Filosofia.
(Estas obras têm diferentes níveis de complexidade, sendo conveniente começar pelas mais simples e ir avançando para as mais elaboradas).
-- BIBLIOGRAFIA SECUNDÁRIA:
Estudos especificamente dedicados ao(s) tema(s) e ao(s) autor(es).
Ex: a Contextualização e o Comentário à Informação … de Kant ou à Carta de Epicuro.
Estudos cada vez mais especializados, consoante a exigência da investigação.
III. INTERPRETAR
Restituir o sentido geral do texto, articulando o sentido expresso (manifesto) com outros entidos implícitos.
Níveis de integração
- na obra do autor.
- na época histórico-cultural.
- na problemática filosófica em jogo.
-
EXEMPLIFICAÇÃO A PARTIR DO TEXTO DE EPICURO, Carta a Meneceu
Teses explícitas:
A. Necessidade e utilidade da filosofia.
A filosofia como caminho para a felicidade.
A filosofia como terapia (cura dos males que afectam a busca da felicidade)
Obstáculos à felicidade: temor dos deuses, medo da morte, receio de não ter bens, medo das dores
Os males fundamentais do homem são todos ilusórios.
B. Natureza do prazer
É o princípio (archè) e finalidade/fim (telos)
Ausência de dor física (aponia) e de perturbação da alma (ataraxia).
= ausência de movimento e de dor = estabilidade, equilíbrio de corpo e alma.
= serenidade
C. A prudência ou ponderação (phronesis)
Alcançar saúde do corpo e tranquilidade da alma.
A reflexão indica quais os desejos legítimos e ilegítimos:
· a) Naturais – necessários (conservação da vida)
· b) Naturais – não necessários (excessos, requintes…)
· c) Não naturais nem necessários (artificiais, originados na sociedade)
D. A sabedoria ou a liberdade do sábio
“Vida boa”: não tomar como a) os c); vigiar os b).
Seguir os prazeres naturais.
Não estimular os desejos, dominá-los e extingui-los.
Autarqueia /autarcia (suficiência); (<autarkes / autarca: auto-suficiente)
Phronesis: cálculo da utilidade e escolha do prazer maior (reflexão sobre o fim), sabendo que, por vezes, a dor presente leva a um prazer maior.
· prazer cinético (kinesis, movimento): alegria (hedonè)
· prazer catastemático: ausência de dor; sem mais nem menos. É o bem supremo.
(Epicuro admite os dois, tendo em conta o segundo).
Comentário
“A prudência é mais importante que a filosofia”
Comentar=pensar com
Interpretação geral
Filosofia moral: o bem alcança-se como termo de uma prática equilibrada dos prazeres.
Filosofia como arte de viver ou prática de vida (ou como medicina animae).
Estilo filosófico: a carta.
Níveis de contextualização
Biográfico: vida e obra de Epicuro (séc. IV a C.)
Na obra do autor (outros textos que fundamentem e esclareçam os pressupostos gerais do pensamento de Epicuro:
- a física (o atomismo)
- a metafísica (refutação do espiritualismo e negação da providência)
- a antropologia: inseparabilidade de alma e corpo; a alma não é imortal; a alma é contemporânea do corpo
Na época histórico-cultural: fim da época clássica, fase helenística.
Na problemática filosófica em jogo: o problema ético.