Sumários

Estaremos a caminho de reintegrarmos em nós o céu que nos contempla?

16 Fevereiro 2017, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

1º Módulo: Nuvens

 

É pouco comum entre nós escrever-se sobre nuvens fora da área da meteorologia. Nos últimos tempos, porém, tem havido diversas manifestações artísticas dedicadas a este assunto. Recordo uma exposição, a que acompanhei os alunos no ano passado, dos artistas Manuel Valente e Clara Cabanas intitulada Andar nas nuvens – duas propostas para um diálogo entre a terra e os céus, na Casa-Museu Medeiros e Almeida. Mais recentemente na Culturgest, a companhia de teatro-dança Circolando apresentou um espectáculo intitulado Climas que tomava como inspiração a pequena obra O Jogo das Nuvens de Goethe. Na altura o programa do espectáculo referia o seguinte: «Um espaço feito de cruzamentos foi tomando forma: estação meteorológica, sanatório, estância termal, laboratório artístico. O repto que ali prevalece foi lançado por Goethe no seu Diário das Nuvens: reintegrar o céu na paisagem humana. Improvisa-se uma espécie de hipersensibilidade climática e explora-se a força e imprevisibilidade de nos deixarmos atravessar pelas mais variadas forças naturais. O corpo transformado em paisagem submete-se à ação de um potente imaginário climático e deixa-se viajar. Aderimos ao encontro entre poesia e estudo da natureza defendido por Goethe e somos seduzidos por essa sua ideia que a observação atenta da natureza poderá desenvolver no homem uma espécie de novo órgão, uma outra forma de lucidez.»

Na altura fixei da citação a seguinte passagem: «reintegrar o céu na paisagem humana.» O espectáculo era confuso, algo pretensioso, mas este objectivo foi artisticamente conseguido. O que quererá dizer que o céu anda arredado de nós e nós dele? Como poderemos através da observação com disponibilidade repor uma ordem que afinal sempre existiu desde há muitos milhões de anos e que continuará a existir se o planeta não se tresmalhar ou se nós não o tresmalharmos?

O que tem o céu de tão particular que nos atrai, nos pacifica mas também nos inquieta?

Quando chegar a nossa convidada Sara Anjo ela virá dançar sob inspiração goetheana. Antes dela teremos outros convidados que nos atrairão para os seus discursos sobre nuvens e céus, discursos esses que serão permeáveis tanto à Ciência como à Arte.

Afinal parece haver qualquer coisa que nos liga às nuvens e que nos pode inspirar. Dos benefícios desse relacionamento fala-nos Gavin Pretor-Pinney que bem se esforça por nos explicar as vantagens de sermos contempladores de nuvens e de a elas estarmos atentos, quando a Natureza resolve abalar-nos com a sua potência e capacidade de destruição ou antes com o seu esplendor e bonomia.

Muitas são as histórias que podemos acompanhar no livro de Pretor Pinney, à medida que vamos tomando conhecimento do carácter mais científico e técnico com que as nuvens se apresentam aos olhos dos humanos e se deixam catalogar. Perante as características de cada género, espécie, variedade e aspectos suplementares o infinito conjunto das nuvens é uma realidade que está muito para lá da vontade de catalogação dos cientistas. Ao designarmos as nuvens como baixas, médias ou altas, por exemplo, estamos a partir de um ponto de vista que nos coloca como observadores no nível-base da superfície terrestre. Se por qualquer razão estivermos a uma altitude superior a esse plano, numa montanha ou dentro de um avião, a perspectiva altera-se. Teremos de construir novas tabelas? Julgo que não. Há até nuvens que estão fora do catálogo e a que Gavin Pretor-Pinney designa por As outras nuvens (259-331). Basta-nos considerar que uma taxonomia existe para nos apoiar no arrumo da casa, se bem que uma casa arrumada possa assemelhar-se à ideia de um museu anquilosado no tempo e no espaço. Ora as nuvens são todas fugidias e irrepetíveis. Nem uma bela fotografia ou uma tela as conseguem verdadeiramente aprisionar. Eis um desafio interessante para a nossa observação.

Atentemos também no que Luke Howard (1772-1824), o primeiro grande estudioso das nuvens, e com quem Goethe se correspondeu, escreve no seu ensaio On the Modification of Clouds (1803)): «If Clouds were the mere result of the condensation of Vapour in the masses of atmosphere which they occupy, if their variations were produced by the movements of the atmosphere alone, then indeed might the study of them be deemed an useless pursuit of shadows, an attempt to describe forms which being the sport of winds, must be ever varying, and therefore not to be defined.

But however the erroneous admission of this opinion may have operated to prevent attention to them, the case is not so with Clouds. They are subject to certain distinct modifications, produced by the general causes which effect all the variations of the Atmosphere: they are commonly as good visible indications of the operation of these causes as is the countenance of the state of a person’s mind or body.»

Aqui fica este breve testemunho, do primeiro meteorologista europeu, em obra que poderão consultar a contento como testemunho do seu trabalho de observador e catalogador de nuvens no séc. XIX.

Referimos em aula a importância do uso de uma língua morta: o latim, para a fixação taxonómica de muitas espécies – animais, plantas, pedras e tantas outras e, claro, as nuvens. Nos séculos XVIII e XIX e ainda hoje, esta opção trabalhada pela primeira vez pelo naturalista sueco Carl von Linné (1707-1778) e reservada a criar entendimento entre cientistas e eruditos acabou por preservar a dinamização da língua latina e da sua extraordinária cultura. O tributo da ciência ao latim como língua franca transformou-a numa embaixadora entre os povos.

 

Leitura recomendada:

PRETOR-PINNEY, Gavin 2007, O Mundo das Nuvens – História, Ciência e Cultura das Nuvens, tradução de Sofia Serra, Cruz Quebrada: estrelapolar, pp. 123-185.

 

Endereços electrónicos sugeridos:

 

https://www.google.pt/?gfe_rd=cr&ei=fFk2Vv6uNpKs8wf4jLqgAQ#q=luke+howard+on+the+modifications+of+clouds+pdf

 

http://en.wikipedia.org/wiki/Cloud_Appreciation_Society

 

http://cloudappreciationsociety.org/

 

https://www.ted.com/talks/gavin_pretorpinney_cloudy_with_a_chance_of_joy   


Boas-vindas

14 Fevereiro 2017, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

Palavras de boas-vindas aos alunos. Apresentação do programa e razões da sua escolha com base na articulação de Ciência e Arte com a Natureza. Comentário ao modo como se irão articular os três núcleos programáticos. Algumas indicações sobre as obras e os autores escolhidos. Apresentação das metodologias de trabalho e de avaliação.

Breve exposição sobre os nossos convidados, datas e confirmação das suas presenças em aula.

Indicações breves para o início de pesquisa e contemplação relacionadas com o primeiro objecto de trabalho: as nuvens.

 

Devido ao elevado número de alunos inscritos na cadeira de Ciência e Arte (64), TP1, as estratégias de avaliação tiveram de ser alteradas. A avaliação escrita presencial, através de dois testes, será a única modalidade considerada neste âmbito. Não haverá a possibilidade de escrita de pequenos trabalhos substitutos do segundo teste. A avaliação oral mantém o seu formato habitual.

 

Datas de realização dos testes de avaliação: nos dias 23 de Março de 2017 (duas horas) e 1 de Junho de 2017 (duas horas). Os resultados dos testes serão, em princípio, apresentados e discutidos respectivamente nos dias 11 de Abril e 22 de Junho de 2017.

 

Leitura recomendada:

PRETOR-PINNEY, Gavin 2007, O Mundo das Nuvens – História, Ciência e Cultura das Nuvens, tradução de Sofia Serra, Cruz Quebrada: estrelapolar, pp. 11-121.