Sumários

As artes murárias: a pintura a fresco e a têmpera.

22 Outubro 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

Breves noções sobre: 1) Materiais, técnicas, metodologia de abordagem. A pintura mural: definição, materiais, técnicas e processos criativos. 
2)Os diferentes modus operandi: da Pré-História ao período Clássico. 
3)Contexto histórico e artístico da pintura mural europeia: do Românico ao Gótico. Principais fontes e bibliografia. 

4) Contexto histórico e artístico da pintura mural europeia: do Renascimento ao Barroco. Principais fontes e bibliografia.

5)  A pintura mural na historiografia da Arte Portuguesa e a sua importância no contexto do património artístico nacional;

6)  A Pintura Mural em Portugal: delimitação espacial e temporal; principais temáticas e funções;

7) A Pintura Mural em Portugal: influências e intercâmbios com a Pintura Mural europeia. Estilos e tipologias.

8) Iconografia e Iconologia na pintura mural portuguesa: modos de ver a pintura mural.

9)Evolução  da Pintura Mural em Portugal: da Pré – história à Época Clássica. 

10)  Evolução da Pintura Mural em Portugal: a Época medieval. Principais núcleos no território português.

11) O fresco em Portugal no final da Idade Média e no dealbar do Renascimento. Relações da pintura a fresco com a de cavalete.

12)A Pintura Mural em Portugal nos períodos Maneirista e Barroco (a ligação ao azulejo, à talha e ao estuque). 

13) A pintura mural em Portugal no período maneirista: o conjunto de frescos aristocráticos de Évora e Vila Viçosa;


As 'artes da cal', o mundo das artes da decoração, e a dimensão da Micro-História da Arte.

18 Outubro 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

A nossa História da Arte precisa aprofundar o estudo sobre os saberes artísticos que são próprios da tradição vernácula portuguesa e que começam a ser agora reabilitados. Tudo é fruto das novas visões abrangentes que a Micro-História da Arte veio introduzir na análise da produção artística, ao iluminar com uma mais ampla perspectiva de saberes as ‘zonas’ de periferismo e as modalidades de produção que eram até há pouco consideradas 'menores'. Descobre-se um inequívoco sopro de originalidade em tantas decorações murárias com uso da cal e de 'materiais pobres', com valências expressivas que justificam, por certo, um estudo atento. E não só estudo -- também medidas de salvaguarda, conservação e revalorização.

O olhar micro-artístico sobre estes temas vem justamente no sentido de destacar esta vertente do património artístico nacional, visto à luz da Micro-História da Arte: o esgrafito, o fresco, os fingimentos murários, os marmoreados, a escaiola, as obras de massa... E o conceito ajuda a devolver consciência plural aos fenómenos de criação e recepção artística, justificando a prática de um olhar microscópico sem arrogância nem preconceito para com todas as obras de arte, eruditas ou populares. Reavalia-se assim, no campo da prática artística doméstica, uma série de intervenções geralmente menorizadas e, afinal, tão significativas para caracterizar as especificidades do nosso património. Opõe-se essa visão global à de uma historiografia assente nas «narrativas grandiosas», quase sempre alheada, porém, de qualquer dimensão antropológica ou da atenção que é devida às remanescências. Este olhar vem revalorizar este 'mundo de artes da cal', desde sempre menorizado, conferindo-lhes uma importância que a falta de enfoque havia esquecido por completo. Uma muito boa iniciativa, que vivamente se recomenda !


A Cripto-História da Arte e o estudo das 'obras de arte mortas'.

15 Outubro 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

No corpo de instrumentos de trabalho de que dispõem a História da Arte e as Ciências do Património conta-se o conceito operativo de Cripto-História de Arte, que assenta precisamente no estudo das obras de arte fragmentárias e mortas, ou seja, no papel que cabe aos indícios (mesmo de todo desaparecidos) para a caracterização histórica, artística, cultural, e estilística, dos vários «tempos» patrimoniais. Parte-se do princípio de que esta disciplina científica não deve ser restringida ao estudo das obras vivas, ou seja, os grandes monumentos, edifícios classificados e peças de valia museológica, mas também ao estudo daquelas muitíssimas obras que já desapareceram, por incúria ou destruição.

.Acresce a utilidade de se estender esta análise dialéctica assente na noção de fragmento à essência de todo o património visto na sua máxima globalidade, ao estudo daquele que persiste truncado e, até, a projectos artísticos que quedaram inacabados ou não chegaram mesmo a realizar-se. Conceito com útil verificação prática pela comunidade científica, insere-se dentro de um quadro de pesquisa definido em vários níveis de abordagem (cripto-analítico, dedutivo, reconstitutivo, ‘encreativo’). Trata-se de visão alargada em termos teórico-metodológicos, assente na base de dados inventariais como instrumento maior, integrando as perdas patrimoniais no ‘corpus’ exaustivo de bens, ainda que fisicamente já não existam  . Tal como a prescrutação micro-artística integrada (recorrendo-se a Carlo Ginzburg), à dimensão de existências em contexto periférico, o conceito alarga este esforço de revalorização ao atentar na valência específica das franjas da paisagem construtiva em espaços de periferismo, incluindo a esfera dos patrimónios a preservar na dimensão desvalorizada das micro-produções artísticas e evitando muitas das inexoráveis perdas que se sucedem no tempo.

Enquanto noção operativa provida de franca utilidade para o alargamento das práticas da H. Arte, a CRIPTO-HISTÓRIA DE ARTE assenta as suas bases de pesquisa cripto-artística em cinco vertentes simétricas e convergentes, a saber:

1 --- a abordagem criptoanalítica;

2 --- a abordagem dedutiva;

3 --- a abordagem reconstitutiva;

4 --- a abordagem incriativa;

5 --- e a abordagem cripto-iconológica.


A ideia de Renascimento e o nascimento da teoria da arte: Alberti, Filarete, Leonardo.

11 Outubro 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

Dos princípios de Vitrúvio à teoria da arquitectura no Renasdcimento do século XV em Itália. A Utopia Edificatória de L. B. Alberti, a Sforzinda: A Cidade Ideal de Filarete, a  Cidade Ideal de Leonardo da Vinci, a Hypnerotomachia Poliphili: A Utopia Insular de Citerea, as Imagens Pictóricas de Cidade Ideal do Séc. XV.  A existência de aspectos utópicos na Teoria da Arquitectura da Idade Moderna,  que  em  meados  do  século  XV  se  começou  a  gizar  com  L.  B.  Alberti  (1404-72),  Filarete (c. 1400-c. 1465), Leonardo da Vinci (1452-1519), e na Hypneroto-machia Poliphili (ed. 1499) não é novidade, tendo-a já abordado [1].  A utopia anuncia-se logo no Prologo do De re aedificatoria ao ser outorgada à  Arquitectura,  assim  como  às molte  e   svariate  arti…  dai  nostri  antenati  inda- gate, a  missão  de  render  felice  la  vita, além  de  que  a  Arquitectura, ou  melhor,  a   res  aedificatoria,  seria  quanto  mai  vantaggiosa  alla  comunità  come  al  pri vato, particolarmente gradita all’uomo in genere e certamente tra le prime (ou seja, entre as principais artes) per importanza. Em Vitrúvio a missão da Arquitectura era contribuir para propiciar uma vida boa, com saúde e em  segurança, como  se  explicita na  história do recinto  fortificado  transferido  por  M.  Hostílio  de  um  lugar  insalubre  para  outro  saudável. A salubridade, nomeadamente a defesa em relação aos ventos e climas agressivos (na tradição hipocrática, o  ar era visto como causa de todas  as doenças),  a  par  da  segurança,  que  levava  a recintar as cidades com muralhas, são dos principais e primeiros aspectos tratados no De architectura, ocupando os caps. 4 a 6, do Livro I.



Actualidade dos valores renascentistas: liberalidade, humanismo, sentido e consciência patrimonial, liberdade criadora.

8 Outubro 2018, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

     O longo tempo do Renascimento é analisado a partir da cultura artística portuguesa do século XVI, à luz das suas pluralidades e à luz do Humanismo, herdeiro de valias antropocêntricas que radicam na afirmação da liberalità, da virtù, da dignità, da felicità e da utopia como conceitos fundamentais de viragem histórica. Analisam-se casos de de estratégias de afirmação das artes nesse largo tempo do Renascimento que, com suas extensões e continuidades, foi vivenciado à luz, tanto do humanismo cristão, como do novo fenómeno de globalização mundial.

     As várias faces do Renascimento abrem-se ao olhar para a Antiguidade e para os Novos Mundos, alteram relações de trabalho e de mercado no campo das artes e afirmam o estatuto social do artista a outras luzes, bem como as estratégias do pensamento, da criação escrita e da representação do Outro. A abordagem proposta segue os princípios da análise trans-comparatista e trans-contextual do facto artístico, aplicada à conjuntura renascentista nacional, seguindo o princípio da conjuntura larga para analisar os fenómenos de persistência, de revitalização e de ruptura na lenta evolução dos comportamentos histórico-artísticos.

     Para além de um Renascimento histórico que tem suas referências grosso modo durante a primeira metade do século XVI, existiu uma situação renascentista com prolongamentos naturais que tem ressonâncias até ao século XVII. Recorre-se também ao polémico ensaio de Claude-Gilbert Dubois Le Bel aujourd’hui de la Renaissance (2001), que nos veio revelar a persistência, no coração dos nossos dias, de várias mal pressentidas valências epi-renascentistas que persistem, sejam os sinais de representação mimética, a valorização da estética do Belo clássico, da natureza e da memória patrimonial, a perduração da consciência da liberalitá dos artistas e o sentido da última e grande utopia da individualidade partilhada e do ecumenismo fraternal a partir da prática artística -- valores esses sob cuja óptica vivemos, criamos e avaliamos as coisas segundo graus de consciência mais ou menos diluídos.

     O grande humanista, teólogo e latinista Benito Arias Montano (1527-1598), uma das mais notáveis personalidades da cultura europeia de Quinhentos, contribuíu muito, com as suas ideias e escolhas, para a sedimentação de uma Teoria da Arte em nome da felicità, ao defender a harmonia, o rigor doutrinária, a carga pedagógica e a força da emotividade nas representações artísticas, em nome de uma concepção neoplatónica dotada de largo sentido de trans-contextualidade. Explorou as relações meta-textuais e imagéticas através da emblemática e um sentido profundo da Ut pictura poesis. Ao asdmirarmos a gravura que fez editar em Roma em 1577, chamada A verdadeira Inteligência (Idea) inspira o Pintor, aberta por Cornelis Cort (1533-1578) segundo desenho de Frederico Zuccaro, com poesia latina de Arias, lemos neste poema ilustrado todo um discurso sobre o papel emotivo e pedagógico das artes. Num tempo gravemente marcado pelas guerras de religião, Arias defende que as artes são remédio para os males que afligem a humanidade, recorrendo à imagem de um Olimpo onde a Caritas, a Prudentia, a Benignitas e a Fortituto têm valência qualificante do verdadeiro sentido da criação artística. Eis toda uma síntese da teoria estética de Arias Montano e dos princípios que o Humanismo cristão defendia.

     É à luz destes pressupostos que trazemos à discussão alguns temas de pintura, de escultura e de arquitectura dos séculos XV e XVI que podem ser vistos como testemunhos de uma nova mentalidade, sejam de manutenção de cânones (exemplos de arquitectura senhorial), de trans-memória (os mecenatos de D. Miguel da Silva em Viseu, de Frei Brás de Barros em Coimbra, do arcebispo D. Teotónio em Évora), de efusivo exotismo de «novos mundos» (o mecenato de D. Álvaro de Castro na Penha Verde ou o dos Condes de Basto em Évora), de formulação teórica (o tratado de Félix da Costa Meesen, Antiguidade da Arte da Pintura, de 1696), de retoma de modelos (casos de «filo-rafaelismo», p. ex.), ou de revitalização de módulos neo-renascentistas, entre muitos outros exemplos de arte portuguesa que se poderiam citar. Como diz o humanista André de Resende no Oratio pro Rostris (1534), « Agora  que,  por  onde  quer  que  se  estenda,  quase  toda  a  Europa  renasce, agora que todas as terras, até outrora  mais  bárbaras, aspiram  à  antiga  felicidade do século mais culto», ou seja, existe uma consciência de liberalidade artística que aspira às utopias construtivas, à consciência da defesa dos patrimónios e à criação das artes como remédio para os males da humanidade.