Sumários

Nós, a Natureza e a Arte

20 Setembro 2018, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

SETEMBRO                         5ª FEIRA                               2ª Aula

 

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1. Obra plástica, poética e cénica de Wassily Kandinsky

 

Demos início ao estudo do primeiro núcleo programático propondo uma sensibilização prévia à obra plástica de Wassily Kandinsky e tendo em conta a sua evolução artística no período entre 1911 e 1944, sendo este último ano o da morte do artista.

Mais do que um processo evolucionista que se ocupe de cada obra e sobre ela produza interpretação, interessou-me confrontar os alunos com aquilo que designamos por abstracto e por figurativo. E foi a partir dessa compreensão que tomámos em mão um objecto para o apreciarmos com sentido lúdico.

Cada aluno escolheu de um conjunto de conchas da minha colecção-mundo, um exemplar que passou a observar como um todo com identidade própria. Na sequência da observação, em muitos casos minuciosa, escreveram-se algumas linhas que pedi fossem o mais espontâneas possível. Em pequenos grupos de quatro alunos cada, foi trocada informação, numa espécie de diálogo apaziguador das sensações despertadas em cada um anteriormente. Passámos depois ao registo oral de cada contributo, o que permitiu diálogo, discussão, alargamento do campo experimental.

E afinal o que pretendíamos comprovar? De que modo a nossa procura identificava em cada concha o figurativo e o abstracto?

Cada concha em si, cada búzio (também os havia) dava concretude a um objecto a que nós chamávamos concha ou búzio e que mais não era do que um pequeno elemento da Natureza. Mas a sua pertença ao mundo natural, enquanto figuração do mesmo, contemplava também a forma abstracta em desenhos irrepetíveis, em cores que nos maravilhavam, em movimento que passámos a atribuir ao que estando fixado atraía a nossa imaginação, a nossa sensibilidade, as memórias que individualmente convocámos.

Foi sobre esta Arte da Natureza que nos detivemos, sobre a sua depuração e estilização que nos fez ir mais além do que uma simples observação de superfície dos objectos escolhidos.

A materialização desta experiência permitiu que a gestualidade de cada um operasse de forma directa na criação de um percurso laboratorial como processo investigativo, fazendo do toque o instrumento primordial. Apalpar uma concha ou um búzio não se compara a termos na mão um telemóvel. O liso, o polido e o espelhado do aparelho tecnológico nada têm a ver com a rugosidade, a irregularidade, o carácter único e singular destes pequenos objectos que nos ajudaram em ambiente de sala de aula, na aproximação pontual à Natureza como produtora em nós da capacidade de a interpretarmos como Arte.

O que foi escrito e dito correspondeu então à nossa aproximação à Natureza que transformámos em discurso sobre Arte em cada um, cruzando os dois universos. A expressão do nosso pensamento sobre este assunto foi por isso múltipla e singela nos seus modos particulares de descoberta em cada objecto de uma ordem estética. Desse ponto de vista fomos criadores. E fomo-lo também porque aceitámos jogar de improviso.

 

Kandinsky referia, em 1939, que os visitantes de exposições e os críticos de arte «davam demasiada importância à questão da forma (…) e que em princípio, a questão da forma não existe.» Para o artista, o conceito de abstracto deveria ser substituído pelo conceito de concreto, «uma vez que cada arte possui os seus próprios meios de expressão (a forma) e uma “tradução” exacta de uma arte para outra não é possível.»

O que é relevante é «o modo como escutamos uma peça musical “pura” ou como vemos uma obra de pintura “concreta”.»

E o artista prossegue: «A composição musical sem palavras apresenta um mundo puramente musical – sem uma narrativa literária. Esta narrativa (o objecto) também não existe numa obra pictórica “concreta” – ela apresenta um mundo pictórico puro.

Para permitir que este primeiro mundo entre no “interior” de cada um, basta que sejamos capazes de abrir os ouvidos. No segundo caso, o que importa é que sejamos capazes de abrir os olhos. Esses acessos têm de ser mantidos de modo absolutamente livre, e jamais deverão existir quaisquer barreiras “filosóficas” impostas à obra e ao interior de cada um. Numa palavra: cada um tem de ser “ingénuo”.

Façamos nossa a seguinte frase: “Sejamos simples como as crianças.”

 

A aluna Bruna Brissos apresentou obra plástica de Kandinsky, uma Improvisação, a que voltaremos na próxima aula.

 

Obra consultada:

Wassily Kandinsky, Abstract and Concrete Art, London Bulletin, (London), 1939 in: Kenneth C. Lindsay and Peter Vergo (Ed.), Kandinsky – Complete Writings on Art, New York, Paris: Da Capo Press, pp. 840-841.


Do particular para o universal. Até à ideia de composição para palco em Kandinsky

18 Setembro 2018, 16:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

Abertura

Apresentação do programa e seus objectivos.

Metodologias de aprendizagem.

Processo de avaliação. Comprometimentos.

Questões a considerar na prática lectiva e de estudo dos alunos: diversidade de cursos, criação de nexos entre a sala de aula e o fora da aula, aproveitamento de experiências de cada um a integrar no colectivo.

 

Saídas de campo integradas.

Ideia de uma comunidade experimental.

 

 

·         Data de realização do 1º teste de avaliação: dia 30 de Outubro de 2018 (sala 2.13). Duração da prova com consulta: duas horas. O resultado e a correcção desta prova serão apresentados no dia 15 de Novembro de 2018, salvo se houver qualquer imponderável.

·         Data de realização do 2º teste de avaliação: dia 20 de Dezembro de 2018 (sala 2.13). Duração da prova com consulta: duas horas.

·         Os resultados do 2º teste, sua correcção e toda a avaliação final de cada aluno serão apresentados e discutidos no dia 8 de Janeiro de 2019, em horário de aula.

·         A haver trabalhos individuais como substituição do 2º teste, estes serão entregues impreterivelmente até ao dia 20 de Dezembro de 2018.

 

 

 

 

1. Obra plástica de Wassily Kandinsky – Obra cénica de Wassily Kandinsky

Como abordar obras artísticas, seus conteúdos e formas, numa relação que se propõe pôr em prática um horizonte de trabalho que parte do particular para o universal? Que ideia de particular? Que ideia de universal? Será a obra de arte um possível sujeito?

Trabalharemos com um arquivo inesgotável, adequado às nossas capacidades e possibilidades, adquirindo, através dele, uma consistência progressiva, intermitente, aberta, em função das obras escolhidas de Wassily Kandinsky (1866-1944).

Daremos prioridade a alguns exemplares de obra plástica que se nos atravessem no caminho, tendo sempre em conta que o alvo das nossas cogitações é a obra cénica e o modo como o artista transforma a ideia de tela num objecto tridimensional. Apresentaremos Kandinsky como poeta. Não descuraremos o seu fazer teórico. Tentaremos chegar a uma condição de depuramento dos materiais seleccionados, sem nos deixarmos enredar pelo excesso da sua presença.

Ao convocarmos as artes plásticas para o espaço das artes para palco estamos a desenvolver um processo de reapropriação de parcelas de um todo e do todo enquanto tal, que requer da nossa parte uma disponibilidade de gerarmos pensamento emocional. Quer isto dizer que teremos de aprender a incorporar uma primeira rejeição que possa ocorrer no contacto com as obras porque com elas não nos identificamos. Estes espaços e movimentos que tendem a afastar-nos dos objectos artísticos têm morada antiga nos nossos cérebros. Eles contrariam o fenómeno da empatia que connosco nasce e se desenvolve. Iremos por isso observar objectos naturais que na sua configuração dão resposta a formas abstractas que desde sempre acompanham a presença do ser humano na Terra, também fora dela, e que não têm de alimentar o que considero um falso fosso entre abstracto e concreto, entre abstracto e figurativo. A razão de ser e de permanecer de cada um destes conceitos está sempre associada à rejeição que fazemos do novo em cada estado ou situação. E essa atitude comum é explicável pelo funcionamento do nosso cérebro, como o comprova a Neurociência.

Desejamos criar uma prática de observação e análise de objectos artísticos na área do teatro, da música e da dança que nos proponha um prazer ou, quem sabe, um desprazer reflexivo, ou uma gradação de sensações com as quais venhamos a conviver em função das obras sugeridas. Esta convivialidade estética com as artes plásticas, num primeiro momento do programa, virá a ser também uma porta aberta para outros tipos de nexos, nomeadamente os que associam a organização do espaço pictural à ideia central de Composição para Palco. Este conceito sustenta o princípio de que os elementos constitutivos de um quadro podem ser transpostos e reposicionados em diferentes constelações na perspectiva tridimensional, dando origem a um tipo de obra artística que pode ou não estar associada a modelos de representação teatral concebidos para o espaço cénico tradicional.

Falamos, é claro, de experimentação associada às primeiras décadas do séc. XX, no âmbito das artes visuais e cénicas, mas que ainda hoje operam sobre nós com alguma dificuldade. É essa barreira que gostaríamos de transpor.

A designação de Composição para Palco pressupõe justamente a junção da plasticidade de uma tela ou de um desenho, de um esboço, em processo que articula luz, cor e espaço, bem como a presença de figuração. A materialidade composicional do espaço e da relação com o tempo opera não só a diferença entre bidimensionalidade e tridimensionalidade mas também o resultado desse progressivo compor atribui autonomia à criação.

Dotar de subjectividade uma obra de arte é como equipará-la ao seu criador. O acidental, por exemplo, pode ser incorporado a partir da presença de várias versões de uma mesma composição. Quem decide não é o criador sozinho mas o processo que a obra lhe revela.

Não se trata de uma exclusiva atenção prestada à cenografia, ao desenho de luz, à projecção de cor em particular, mas antes de uma configuração de materiais que no seu conjunto dão origem a uma obra cénica em moldes inabituais.