Sumários

Revisitações

1 Março 2021, 10:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

MARÇO                                2ª FEIRA                               5ª AULA   

 

 

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1. Regressámos à ronda de resumos alargados sobre o estado em que se encontram as dissertações de cada um dos alunos nesta fase dos trabalhos em curso. Ao estabelecermos uma metodologia que se baseia no questionamento dos documentos disponíveis, e por pessoas que ora encontram afinidades com as suas próprias investigações, ora descobrem que há mais mundo para além do seu, tornámos este exercício num modo de coesão e de bom funcionamento do Seminário.

Debruçámo-nos hoje sobre a investigação de Paúl Sanmartin que o próprio intitulou como Noción de “kamaq” como matriz andina de creación escénica para la dirección teatral.

A presença da palavra “kamaq” no título proposto, com significado à partida desconhecido para nós, justificou uma clara explicação da parte do autor do texto e que envolve um dos centros da sua investigação na língua andina como matriz de vida. “Lo Kamaq es un agente de vida que alude en el idioma Aymara al soporte de existencia de las cosas en su ser”

Outros, que não o Paúl Sanmartin, fizeram do termo “kamaq” o nome de uma firma de maquinaria agrícola de dimensão internacional e certamente com distintos propósitos dos do investigador. O que os reunirá?

Josefina Fuentes que vem de paragens próximas de Paúl, do Chile, disserta em inquirição com o colega sobre cosmologias e é chamada à colação a pergunta:  filosofar para os Andinos poderá ser uma forma de pensar natural? É esse o sentido que Paúl defende acrescentando que esse processo deriva de uma visão prática da existência. Pergunto-me se não poderíamos considerar que em outros povos exista também semelhante atitude e formas de pensamento directamente relacionadas com cosmologias embora noutras geografias? Josefina e Paúl debatem a seguir a transposição desta ideologia para um cenário teatral na perspectiva de que pôr em acção a matriz andina implica pensar as coisas com e sem corporalidade. Ocorre-me registar aqui transposição de como Paúl explica o que está na origem do modelo que o inspira: «(…) la idea de matriz funciona como una red de relaciones. Mas que un pensamiento, entiendo lo andino como una forma de impresión de la vida. La noción de matriz andina en este sentido, a mi entender, se sintetiza en el principio de relación entre los seres y este principio se manifiesta a su vez, como una fuerza creadora que da vida a todo lo que existe.»

Patrícia Anthony questiona-se sobre como nasce o conceito de “kamaq” no espaço da língua aymara, sabendo nós que a «matriz andina» está contida numa transcultura e que é nessa consciência que abrange vários povos e etnias de um território supra-comum. Eu questiono-me sobre a mediação do quéchua como língua reticular e berço de diferentes populações na América do Sul e o aymara. Deverá o aymara ser considerado uma especificidade do quéchua que acolhe em si o “kamaq”?

Paúl sintetiza na sua resposta à Patrícia a ideia de que “kamaq” é «um princípio criador» abrangido por diferentes linguajares, já que estamos em pleno diálogo com o domínio oral e que este em nada deve ser confundido com o que quer que tenha a ver com o exótico. E a questão sobre o exótico abre uma outra linha de reflexão. Na verdade, o exotismo é característico não dos povos locais, mas de todos aqueles que cheguem do exterior à região. São esses estrangeiros que transportam consigo uma visão cultural e política com marca ocidental e, portanto, usam esses padrões como primeira referência de empatia, antipatia, estranhamento. Exótico é aquilo que se estranha e que vem de fora ou que está de fora das nossas referências. O que é inabitual requer um tempo de pausa mesmo a nível neuronal para que se ajuste ou não a novos padrões.  O que faz desenvolver o” kamaq” é um conjunto de expressões e manifestações comunitárias que lhe subjazem e que encontram na mostração cénica proposta de exequibilidade.

Patrícia Anthony referiu a este propósito exemplos da prática cénica brasileira afins à experiência equatoriana.

Maria João Vicente centrou-se na capacitação do modelo geográfico organizado na relação espácio-temporal e que adquire directa influência no desenvolvimento da “matriz andina”, sublinhando o efeito causado neste processo pela cordilheira dos Andes. Esta é uma questão central na História dos povos andinos e que o estudo de Paúl Sanmartin não descurará. Sendo um elemento aparentemente exterior ao processo cénico, não o é com certeza ao viver comunitário das populações ao longo de muitos séculos e cuja relevância identifica o próprio “kamaq” como instância central em estudo.

No campo das determinações geográficas como elemento de fundo de um processo antropológico, etnográfico, cénico, portanto, que contribui para a caracterização de um lugar que se impõe como referência incontornável (o caso da cordilheira dos Andes), verificamos que tal factor natural se torna decisivo para a investigação. Menciono neste contexto o caso da cultura Bijagó (Guiné-Bissau) em que a insularidade é desde há séculos a razão de ser da sua identidade e diferença.

A consciência de que o levantamento e tratamento de aspectos caracterizadores de culturas autóctones muito antigas e vivas é uma forma de refrescar e revitalizar a cultura e as artes equatorianas da contemporaneidade e parece ser um objectivo essencial do trabalho do aluno Paúl.

Eliane Ramin questiona-se com o colega sobre a «presença da forma simbólica» e sua relação com o domínio cognitivo no processo investigativo e naturalmente também de natureza cénica. Para Paúl Sanmartin é o próprio “kamaq” que serve de orientação ao conhecimento empírico e à sua validação ao realizar e avaliar aspectos concretos da investigação como, por exemplo, algumas das narrativas que menciona na recolha no terreno e em directo contacto com as populações em estudo.

A Rocio Perez, mulher de Paúl Sanmartin, foi pedido que nos relatasse alguns dos aspectos da investigação do marido, dada a sua presença regular junto do mesmo. Quisemos saber aquilo que normalmente nos está vedado. O testemunho de Rocio sobre investigação de campo de Paúl e que inclui, por exemplo, o acompanhamento de rituais, foi para nós muito rico e concluiu o primeiro módulo de trabalho deste seminário.

 

2.  Encerrámos o nosso tempo com a apresentação de dois vídeos de Maria-Josefina Fuentes dedicados ao seu trabalho sobre voz e que integra a sua investigação doutoral.

Os vídeos, segundo a própria, vieram em vez de trabalho sobre voz que não conseguiu realizar com participantes escolhidos, optando por ser ela o alvo directo da nossa apreciação. Não conversámos sobre este “fracasso”, mas fá-lo-emos na próxima sessão de seminário.

Voltaremos, claro, aos dois vídeos e interrogaremos a protagonista.

 

Daremos finalmente espaço a Lambarena e ao quanto nos emocionámos ou não com esta produção artística.

 

3. Conversámos sobre nova proposta de trabalho para levarmos por diante neste semestre.

 

Cada aluno escolhe um objecto de trabalho que tenha em curso neste momento para nos surpreender.

Possibilidades:

- Leitura comentada de um capítulo de livro

- Exposição orientada de um livro já lido agregado à investigação em curso

- Comentário a um artigo essencial e como ele poderá ser integrado numa parte da dissertação

- Cruzamento de 2 artigos pertinentes com idêntico objectivo

- Articulação de parte de uma experiência prática que se possa transmitir por escrito e oralmente, com uso de vídeos, fotografias, gráficos, guião, etc.

 

É intenção desta experiência contribuir para um exercício intelectual de preparação de um capítulo ou partes de capítulo da dissertação em andamento. Esse será o alvo final deste seminário. Pode ainda dar-se o caso de haver em curso um pequeno artigo para publicação. Se for essa a hipótese, a finalização do artigo pode ser a meta.

 

Leituras sugeridas em especial para Paúl Sanmartin, mas não só:

Anabela Mendes | Gabriela Fragoso (Org.), Garcia de Orta e Alexander von Humboldt – Errâncias, Investigações e Diálogo entre Culturas, Lisboa: UniEditora, 2008.

Anabela Mendes (Org.), Garcia de Orta and Alexander von Humboldt – Across the East and the West, Lisboa, UniEditora, 2009.

Anabela Mendes et altri (Org.), Qual o tempo e o movimento de uma elipse? – Estudos sobre Aby M. Warburg, Lisboa: UniEditora, 2012.

Anabela Mendes (Org.), Viagens de Longo Curso: Roteiros e Mapeações | Long-Distance Travels: Routes and Mappings, Lisboa: UniEditora, 2016.

 


Ronda pela ideia de uma dissertação de doutoramento em curso

22 Fevereiro 2021, 10:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

FEVEREIRO                        2ª FEIRA                               4ªAULA

 

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Tomámos em mãos os trabalhos que ainda precisam de discussão para melhor clarificação das ideias de quem os apresenta.

Estão neste caso o pequeno ensaio de Patrícia Anthony que desenvolveu a sua tese intitulada Migrações na cena – Influências e Desdobramentos das Migrações na criação teatral entre Portugal e o Brasil e que se encontra ainda em fase preliminar.

A aluna voltou a ser interpelada pelas colegas Maria João Vicente e Maria-Josefina Fuentes. A primeira considera o projecto de Patrícia Anthony próximo de anteriores experiências suas, no que diz respeito à relação artística com estrangeiros, ao uso de diferente línguas e culturas e às diferentes soluções então encontradas. Já Maria-Josefina Fuentes refere as dificuldades em manter contacto com estrangeiros no âmbito de um dificuldades que um projecto de investigação pode encontrar justamente nos contactos a estabelecer com colaboradores estrangeiros. Patrícia Anthony reconhece essas dificuldades, mas não parece temê-las por enquanto. Eliane Ramin e Rocio Perez questionam também a colega. A primeira pretende ser esclarecida sobre a ideia de “teatro liberatório”, no sentido de um tipo de teatro que tem uma função colaborativa no bem-estar dos seus intérpretes. A segunda refere experiências próprias na área artística, tal como Maria João Vicente antes o fizera, associadas à sua experiência no Equador. Paúl Sanmartin tomou a seguir a palavra para se manifestar sobre um aspecto de relevo, num trabalho como o da Patrícia    Anthony e que diz respeito à ideia de que migração tem de ser apropriada de diferentes perspectivas.

Coloquei à Patrícia Anthony questões relacionadas, entre outras, com o que distingue migrante de exilado, de refugiado, de exilado interior, pois considero importante manter estas distinções numa investigação que tem como centro as migrações, embora em determinadas circunstâncias possamos considerar haver pontos de contacto entre as referidas categorias.

O avanço das auscultações prosseguiu com a questionação ao trabalho de Rocio Perez com o título Cuerpo sensible, primer instante sensitivo, dejarse topar por los sentidos.  Josefina Fuentes inquiriu Rocio Perez sobre a função das palavras e dos seus significados no contexto do que a autora define como Corpo Sensível. Eliane Ramin salientou a qualidade e a capacidade da experiência do corpo na proposta de Rocio Perez, o que levou a esta a expor algumas das experiências e exercícios que tem vindo a fazer com os seus alunos na Universidade onde trabalha.

Verificou-se que até ao presente a investigação de Rocio Perez é de natureza mais prática e que o pensamento teórico, já requerendo a sua atenção, deverá ser desenvolvido com mais consciência e sistematicidade. A questão de Patrícia Anthony foi neste sentido. Maria João Vicente levantou a questão dos migrantes de diferentes gerações, o que é sem dúvida um elemento a ser considerado sob várias perspectivas neste contexto.

A ronda pelas propostas dos alunos já desenhadas e em estudo concluir-se-á, nesta fase, na próxima 2ª feira, com a questionação ao trabalho de Paúl Sanmartin apresentado com o título Noción de “kamaq” como matriz andina de creación escénica para la dirección teatral.

Retornaremos à proposta de Maria-Josefina Azócar Fuentes, Cuerpos vocales nomádicos revelando formas de habitar para sermos esclarecidos sobre como se realizam os exercícios práticos que ajudam a calibrar a ideia de corpo vocal. Interessa à nossa questionação uma passagem da sua apresentação escrita: «atender a la materialidad sonora como espacio de reflexión y construcción de sentidos posibles más allá de la palabra. Como corporalidad sonora que permite agenciar mundos y que no pretende necesariamente significar.»

Maria João Vicente encontra-se em busca de um novo tema para dissertação, uma vez que se desgostou do anteriormente escolhido. A aluna está plenamente consciente da necessidade de resolver este assunto. Mostrei a minha disponibilidade para a ajudar no que for necessário. O seu tempo oficial está controlado.

 

De acordo com a extensão e valor das discussões, daremos então espaço à proposta artística já enunciada e recomendada.

 

https://www.youtube.com/watch?v=EyNTCyPFFJA

 

Aulas previstas em Fevereiro – 4

Aulas dadas em Fevereiro – 4

Saídas culturais – 0

Saídas cá dentro - 1


Tempo dedicado ao estudo de materiais distribuídos para a primeira unidade curricular.

15 Fevereiro 2021, 10:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

Tempo dedicado ao estudo de materiais distribuídos para a primeira unidade curricular.


Atravessando a escrita de cada um em conjunto

8 Fevereiro 2021, 10:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

FEVEREIRO                        2ª FEIRA                               3ª AULA

 

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Leitura do testemunho sobre Messiah/Komplex da Companhia Against the Grain por Maria João Vicente. A vivacidade da apresentação da aluna despertou recorrente empenho em diálogo dos colegas, voltando todos assim ao espectáculo antes visionado.

Seguiu-se o comentário à proposta escrita de Maria-Josefina Azocar Fuentes, Cuerpos vocales nomádicos revelando formas de habitar, que suscitou ampla participação de todos os alunos. Pedi à mestranda que nos trouxesse para a aula de 22 de Fevereiro exemplos das suas actuais pesquisas e exercitações para melhor compreendermos o alcance do seu estudo sobre a voz.

Tivemos ainda a oportunidade de iniciar o comentário ao trabalho de Patrícia Anthony, Migrações na cena – Influências e Desdobramentos das Migrações na criação teatral entre Portugal e o Brasil. A questionação do trabalho desta aluna prosseguirá na aula de 22 de Fevereiro.

Nesse dia dedicaremos ainda aos trabalhos dos nossos alunos equatorianos Rocio Perez e Paúl Sanmartin um tempo de questionação aos seus projectos de Doutoramento nesta fase de trabalho.

 

Retomando o projecto de natureza cultural e artística que iniciámos com a audição e visionamento do Oratório Messias de Händel com produção canadiana, faremos agora outra incursão musical e de canto em território africano.

Mantemos como criador Johann Sebastian Bach e deslocamo-nos para a cidade de Lambarena, a capital da província de Moyen-Ogooé no Gabão. Aí iremos ao encontro de uma população grata ao médico alemão Albert Schweizer, prémio Nobel da Paz em 1952, e que tratou até à sua morte todos os doentes da região. Schweizer amava Bach. Tinha um gira-discos que colocava à entrada da sua casa e nele punha a tocar todo o repertório de Bach que aprendera em jovem. Os povos locais ouviam com espantoaquela música que desconheciam a gostar de Bach como o Dr. Schweizer.

O que proponho é que escutem bem o que músicos e cantores de várias partes do mundo, incluindo naturalmente e em primeiro lugar os habitantes de Lambarena, conceberam como louvor a Schweizer em 1993.

 

https://www.youtube.com/watch?v=EyNTCyPFFJA


Um Messias de Händel pela reconciliação

1 Fevereiro 2021, 10:00 Anabela Rodrigues Drago Miguens Mendes

 

 

FEVEREIRO                        2ª FEIRA                               2ª AULA

 

1

 

Tal como havíamos planeado, foi possível a todos ver o espectáculo Messiah/Complex da Companhia Against the Grain Theatre, sediada em Toronto no Canadá. A escolha deste Oratório de Händel mereceu o aplauso de todos dado ser uma partitura muito conhecida e amada pela sua extraordinária musicalidade em coros e solos, em particular, o 42º movimento – Aleluia – talvez o mais apreciado entre todos os movimentos. Também é verdade que para os cristãos o Messias de Händel tem conotações religiosas e espirituais de grande riqueza poética e musical ocupando-se da vida de Cristo desde o seu nascimento até à ressurreição. Mas o mais interessante desta obra musical de Händel é que ela ultrapassa de longe as específicas dimensões como e porque foi criada, alargando o seu âmbito ao mais sensível espectador e auditor, independentemente de questões de fé ou de erudição musical. Esta obra atravessa os séculos sempre viva e aberta a uma dimensão universal que a torna por isso também indatável.

Não sabemos o que levou a Companhia Against the Grain a optar pelo Messias de Händel para o seu espectáculo. Mas talvez possamos pensar no título que foi dado ao espectáculo: Messiah/Komplex. A complexidade da obra em si não terá criado aos músicos e cantores problemas extra atendendo ao facto de que todos eram profissionais. Se quisermos ler mais além da evidência, poderemos questionar-nos sobre o introito com que abre o filme-performance. Este espectáculo procura homenagear todos os povos que viveram e vivem no Canadá, todos sem excepção. Num gesto simbólico de pedir perdão àqueles que pereceram sob a bota do poder branco associado ao exercício de domínio colonialista passa a ser informação para todos nós.

O resgate desta proposta configura-se no uso das diversas línguas que perdidas ou agora recuperadas em modo simbólico são interpretadas pelos solistas. Na pedagogia do espectáculo este é um eixo dominante.

Pessoalmente interessara-me a ideia das diferentes línguas e tentaria descobrir como soaria o Messias em Inuktitut ou em Dene, partindo do princípio que a chegada a esse objectivo só poderia ser alcançada com legenda que anunciasse essa escolha. E aqui interroguei-me para quem afinal seria este espectáculo? Será que a maioria dos canadianos tem conhecimento destas línguas antigas? Que dizer dos cybernautas de outras partes do mundo que se inscreveram via internet para estarem presentes na função? O que prevalecerá? O Messias nos seus diferentes movimentos, a maravilhosa orquestra? O destaque dos solos masculino e femininos que levam de passeio o espectador pelas diferentes paisagens de um Canadá contemporâneo? Os coros recolhidos em igreja ou ao ar livre? Onde cabem aqui as línguas?

Nunca esquecerei um depoimento de um linguista, no filme de Werner Herzog, Encontros no fim do mundo (2007), um filme documental dedicado à Antárctida, em que o entrevistado, melancolicamente a cultivar tomates em estufa entre as neves quase eternas e um forte sentimento de perda, refere que todos os dias desaparecem do planeta cerca de meia dúzia de línguas.

Quem sabe se Messiah/Komplex pretende com a sua estratégia multilinguística de reparação inverter a tendência anunciada pelo linguista solitário do filme de Herzog. Tenho algum cepticismo em relação a essa hipótese. A obra da Companhia Against the Grain ficará em arquivo tecnologicamente preparado. A ela haverá acesso futuro. As línguas em regressão ou já extintas, as línguas minoritárias no Canadá como o árabe, todas aquelas em que os cantores cantam as suas próprias culturas, tradições e memórias continuarão a ter a dominância do francês e do inglês, que também são as suas línguas. Jamais saberemos como falavam e cantavam os Primeiros Povos daquela parte da América. Nunca saberemos o que sentiriam e pensariam se lhes pedissem que cantassem Händel e fizessem de Jesus Cristo o redentor das suas vidas.

Nesta odisseia de canto e música a que à má consciência de um país se sobrepõe o desejo de todos reunir sob uma perspectiva epifânica, é dada à arte a função de conduzir um processo político como forma de apaziguamento.

Foi este o espectáculo que discutimos, chegando à conclusão, e considerando vários pontos de vista, que o mais interessante em Messiah/Complex fora a possibilidade de argumentarmos a partir de um objecto que não reunia unanimidade.

Iniciámos a seguir a questionação de documentos escritos pelo aluno e pelas alunas acerca das suas futuras dissertações de doutoramento. O primeiro óbice surgiu com o tamanho desses documentos. Pedia-se 1 a 2 A4s. Verificou-se que em alguns casos o tamanho do documento precisaria de crescer. Ora o que nem sempre o objectivo do exercício, que era exactamente reduzir ao essencial o que se pretendia apresentar, deixou de suscitar queixas na sua concretização segundo este princípio. Difícil. Sim, mas tratava-se de um trabalho propedêutico através do qual se estruturava o pensamento essencial sobre o assunto

Interessante pareceu ser a vontade que a todos moveu de quererem apresentar com verdadeira alegria aquilo que os move. Este é o bom espírito que será incentivado.

O segundo óbice prendeu-se com a capacidade de síntese na formulação das perguntas, ainda que as questões lançadas pretendessem obter esclarecimento acerca de aspectos gerais do documento.

E os esclarecimentos foram dados por Eliane Ramin, a aluna cujo trabalho esteve em discussão e que se intitula: Corpo emotivo: a neurobiologia da emoção e o ator.

Destacou-se nas intervenções apresentadas a ideia de que o conceito de “corpo emotivo” estará a precisar de clarificação para com ele ser possível operar. A aluna em questão esclareceu-nos que a operacionalidade do conceito está em estudo e requer progressiva verificação. Este é um modo interessante investigativo e que não é muito comum. A criação e estruturação de uma ideia com a qual se parte para a pesquisa e que estando no centro do trabalho a realizar vai ganhando forma e sustentação.

 

A análise destes documentos disponibilizados pelo aluno e pelas alunas prosseguirá nas próximas aulas.