Sumários

O saque de Roma e Agostinho: o nascimento da filosofia política medieval.

10 Outubro 2023, 15:30 Rodrigo Furtado


  1. Um homem do seu tempo (354-430):
    1. De Tagaste a Milão: aristocracia local; região densamente cristianizada; professor de retórica: Tagaste (373-4), Cartago (374-84), Roma (384-6), Milão (386-7). O baptismo: 387. Bispo de Hipona: 397.

 

2.     O saque de Roma de 24 de Agosto de 410.

a.      Orbis terrarum ruit;

Chega-me um terrível rumor do Ocidente: Roma foi cercada, a vida dos cidadãos resgatada com ouro e de novo os espoliados foram cercados, de tal modo que, depois dos seus bens, também perderam a vida. Embarga-se a voz e os soluços entrecortam as palavras quando dito esta carta. Foi tomada a Cidade que tomou todo o orbe; morre com fome antes de morrer pela espada; e dificilmente se encontram uns poucos para serem capturados: Ó vergonha, o círculo da terra desmorona, mas os nossos pecados não desaparecem. A ínclita Cidade e cabeça do poder romano foi consumida por um único incêndio. Não há região que não tenha refugiados vindos de lá. Em cinzas e em brasas caíram igrejas outrora sagradas. E, ainda assim, teimamos na avareza. (Hier. ep. 128.5).

 

3.     Reconsideração da História e a origem do mal.

a.      O mal para Agostinho entra/concretiza-se na História; não existe extrinsecamente.

b.     Deus cria o ser humano dorado de liberdade e de vontade.

c.      O mal advém da vontade+liberdade humanas. Os homens são, pois, responsabilizáveis como agentes morais.

d.     O pecado original, a origem do mal e a explicação da história.

 

4.     Então não é possível ser feliz? O Cristianismo e a procura da sabedoria=felicidade.

a.      Confissões (396-7):

                                               i.     Procurar ser feliz é procurar ser sábio, porque Deus é sabedoria (Logos). Logo ser sábio é conhecer Deus. Como se atinge a sabedoria? Através da Filosofia. Logo, o cristianismo é a verdadeira filosofia.

                                              ii.     O processo de conversão: a ascensão do intelecto: As confissões pretendem mostrar a ascensão da alma até à contemplação da verdadeira Sabedoria.

                                             iii.     Quando contemplarei a Sabedoria? Depois da morte. Só depois da morte poderei talvez ser feliz.

                                             iv.     A incapacidade de, sozinho, chegar à felicidade. Porquê? Pecado origem e o mau uso da vontade e da liberdade.

5.     Repensar a escatologia: o sentido da história para lá da morte: a resposta a 410 e a Cidade de Deus.

a.      A cidade de Deus e a cidade do Homem: duas comunidades não materializadas em termos institucionais (e.g. a pertença à Igreja não é condição de salvação).

b.     História de duas cidades: sobrepõem-se e misturam-se; todos pertencem à cidade da terra durante a vida na terra.

c.      Como explicar o saque de Roma? A ausência de felicidade na terra.

d.     Eventualmente, a história levará depois da Parúsia à separação entre as duas cidades. A maioria: condenada; minoria será salva pela Graça.

Rodrigo furtado

Bibliografia sumária:

O’Daly, G. (1999), Augustine’s City of God. A reader, Oxford, 1-38.

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Agostinho, A cidade de Deus. Trad. J. Dias Pereira, Lisboa, 20002.

Agostinho, Confissões. Trad. A. Espírito Santo, C. Pimentel, J. Beato, Lisboa, 2000.

Agostinho, Diálogo sobre o livre-arbítrio. Trad. P. Oliveira e Silva, Lisboa, 2001

Bonner, G. (2007), Freedom and necessity. St. Augustine's Teaching on Divine Power and Human Freedom, Washington DC.

Brown, P. (1968), Augustine. A biography, London.

Kotze, A. (2004), Augustine's Confessions: Communicative Purpose and Audience, Leiden.

MacDonald, S. (2002), ‘Augustine’, A companion to philosophy in the Middle Ages, Malden, MA-Oxford-Melbourne-Berlin, 154-171.

Marrou, H.-I. (1938), Saint Augustin et la fin de la culture antique, Paris.

O'Donnell, J. J. (1992), Augustine: Confessions. Text and Commentary, 3 vol., Oxford.

Vessey, M. (2012), A companion to Augustine, Malden, MA, Oxford, Victoria.

O românico e o gótico.

10 Outubro 2023, 09:30 Angélica Varandas


A abadia de Saint-Denis e o surgimento do gótico. As teorias de Panofsky e Conrad Rudolph.

O românico e o gótico.

A cristianização do eremitismo pagão: o microcosmo monástico e a configuração da sociedade cristã

3 Outubro 2023, 15:30 Rodrigo Furtado


  1. A filosofia pagã dos séculos I-IV d.C.: filosofia e modo de vida.
    1. Pitagóricos; Estóicos; Neo-platónicos: a contemplação do Uno e a fuga ao mundo distractivo;
    2. Ataraxia (tranquilidade); ascetismo (ἄσκησις: treino, exercício do gymnasium); mortificação; purificação; contemplação;
    3. A fuga à cidade; a fuga à política; a fuga ao artifício; a fuga ao mundo material; o eremitismo (ἐρημίτης: o que vive no deserto)/anacoretismo (ἀνακορέω: retirar-se) pagãos.

 

2.     Antão (ca. 251-356).

a.      o controlo de si tão caro aos filósofos: o deserto como o lugar da luta contra as tentações; o controlo do corpo e das paixões;

b.     a atracção: os seguidores do deserto – discipulado, peregrinações e aldeamentos.

 

 

3.     O anacoretismo.

a.      A expansão do modelo de Antão e as comunidades de anacoretas: Pacómio (†348) e a ‘vida comunitária’: o nascimento do cenobitismo.

b.     Jerónimo e o ascetismo em Roma e na Palestina.

c.      O monaquismo episcopal e os precedentes das comunidades de canónigos regulares.

                                               i.     Martinho de Tours; Ambrósio de Milão; Agostinho de Hipona; Isidoro de Sevilha;

d.     O êxito da Regra de São Bento (ca. 530 d.C.).


Bibliografia sumária:

Humphries, M. (2018), Christianity and paganism in the Roman Empire, 250–450 ce’, A companion to religion in Late Antiquity, Malden, MA, 61-80. 


Brakke, D. (2006), Demons and the making of the monk: spiritual combat in early Christianity, Cambridge.

Brown, P. (1971),  ‘The rise and function of the holy man in Late Antiquity’, Journal of Roman Studies 61, 80–101.

Brown, P. (1971), O fim do mundo clássico, de Marco Aurélio a Maomé, Lisboa.

Brown, P. (2013rev.),  The rise of Western Christendom. Triumph and diversity. AD 200-1000, Malden, MA-Oxford, West Sussex.

Caner, D. F. (2002),  Wandering, begging monks: spiritual authority and the promotion of monasticism in Late Antiquity, Berkeley.

Dunn, M. (20032), The Emergence of Monasticism: From the Desert Fathers to the Early Middle Ages, Malden, MA, Oxford, Victoria.

Goehring, J. (1999), Ascetics, society and the desert: studies in early Egyptian monasticism, Harrisburg, PA.

Harmless, W., SJ,  (2004), Desert Christians. An introduction to the literature of early monasticism, Oxford.

Hitty, D. (19993), The desert a city: an introduction to the study of Egyptian and Palestinian monasticism under the Christian Empire, Oxford.

Marrou, H. I. (1963), Nouvelle histoire de l’Église. 2. L’église de l’Antiquité tardive (303-604), Paris.

Rousseau, P. (1999), Pachomius: The Making of a Community in Fourth-Century Egypt, Berkeley. 

A teologia de Pseudo-Dionísio.

3 Outubro 2023, 09:30 Angélica Varandas


A teologia de Pseudo-Dionísio, o Areopagita. Teologia afirmativa, negativa e mística.

A centralidade da luz na teologia de Pseudo-Dionísio.

Ciceronianus e/ou Christianus? ‘Onde estiver o teu tesouro, aí está também o teu coração’.

28 Setembro 2023, 15:30 Rodrigo Furtado


1.     A educação clássica e a doctrina christiana.

1.1   Educação e novos desafios.

                                               i.     A educação clássica ao serviço da vida política: o triuium.

                                              ii.     Saberes úteis e inúteis : em função da cidade.

1.2   As ‘escolas’ cristãs de Alexandria e de Antioquia no século III; o direito dos Cristãos poderem aceder à educação;

‘Quero pedir-te que extraias da filosofia dos Gregos o que pode servir como um plano de estudo ou uma preparação para o cristianismo, e da geometria e astronomia o que servirá para explicar as Sagradas Escrituras, para que o que todos os filhos dos filósofos costumam dizer sobre geometria e música, gramática, retórica e astronomia, como companheiros auxiliares da filosofia, possamos dizer nós, sobre a própria filosofia, em relação ao cristianismo. Talvez algo deste tipo esteja suposto no que está escrito no Êxodo, da boca de Deus: que ele ordenou aos filhos de Israel que pedissem aos seus vizinhos e àqueles que habitavam com eles, vasos de prata e ouro e vestes, de modo a que, ao espoliarem os egípcios, eles pudessem ter material para a preparação das coisas que pertencem ao serviço de Deus’. (Orígenes, Carta a Gregório)

‘Não devemos errar em defender que todas as coisas necessárias e proveitosas para a vida nos vieram de Deus, e que a filosofia foi mais especialmente dada aos Gregos, como uma aliança especial com eles - sendo, como é, um degrau para a filosofia que existe de acordo com Cristo’. (Clemente de Alexandria, Stromata 8)

‘Apresentarei os melhores contributos dos filósofos dos Gregos, porque tudo o que há de bom foi dado aos homens de cima por Deus’ (João Crisóstomo, Capítulos Filosóficos, Prefácio).

1.3   A Doctrina Christiana de Agostinho de Hipona.

1.4   Claudiano : um poeta egípcio em Roma ao serviço de Estilicão. O maravilhoso pagão como adereço.

1.5   A recuperação do passado.

i.       As edições de luxo autores antigos:

1.     Tito Lívio patrocinada por Símaco e por Nicómaco Flaviano em 401;

2.     As edições de luxo de Vergílio: o Virgilius Mediceus (Firenze, Laur. 39.1 + Vaticano, lat. 3225) – a subscrição de Túrcio Rufo Aproniano Astério (f. 76).

3.     Os comentários: Sérvio, Tibério e Élio Donato.

ii.     Os Saturnalia de Macróbio: ambiente simposiástico que pretende recuperar os modelos clássicos: discussão em torno de Vergílio;

1.6   As bases de uma cultura de segunda mão: manuais, breviários e comentários. O triunfo de uma visão enciclopédica da cultura clássica, de segunda mão, baseada em manuais e em repertórios de exemplos.

 

2.     Roma: uma cidade que deixou de ser capital.

2.1   O círculo feminino de Jerónimo.

2.2   A tradução da Vulgata.

2.3   Ciceronianus, non Christianus

Jerónimo, Epístola XXII a Eustóquio, 30: ‘Há já muitos anos, embora tivesse, por causa do Reino dos Céus, cortado todas as relações com a minha casa, os meus pais, irmã, parentes e, o que é mais penoso do que isto, com o hábito dos lautos banquetes [...], não podia passar sem a biblioteca que coligira para mim, em Roma, com grande zelo e trabalho. Assim eu, infeliz, antes de ler Cícero, jejuava. Depois das ininterruptas vigílias nocturnas [...], tomava Plauto nas minhas mãos. Se porventura, caindo em mim, começava a ler um profeta, a linguagem rude horrorizava-me [...].

Quase a meio da Quaresma, uma febre, infundida nas minhas entranhas mais recônditas, invadiu o meu corpo esgotado e, sem qualquer descanso [...], devorou os meus infelizes membros ao ponto de eu mal permanecer preso aos meus ossos. [...] De repente, arrebatado em espírito, sou arrastado até ao tribunal do Juiz, onde era tanta a luz e tanto o brilho oriundos do esplendor dos que se encontravam de pé ao meu redor, que, lançado por terra, não ousava olhar para cima. Interrogado acerca da minha condição, respondi que era Cristão. Mas aquele que presidia disse: «Mentes. És Ciceroniano, não Cristão; «onde estiver o teu tesouro, aí está também o teu coração» [Mat. 6, 21].

                  Calei-me de imediato e, entre vergastadas – efectivamente, tinha ordenado que eu fosse flagelado – era ainda mais torturado pelo fogo da minha consciência, reflectindo para comigo naquele versículo, ‘no inferno porém, quem te louvará?’ [Ps. 6, 6b]. Comecei então a gritar e a dizer entre lamentos: ‘Tem piedade de mim, Senhor, tem piedade de mim’ [Ps. 56, 2]. [...] Fui libertado, voltei à superfície e, perante a admiração de todos, abro os olhos, inundados por uma tamanha chuva de lágrimas que convenciam da minha dor os incrédulos. [...] A partir de então li os livros divinos com um empenho maior do que aquele com que antes tinha lido os livros dos mortais.

 

3.     Tradição literária e novos conteúdos : pseudomorfose cultural.

3.1   Juvenco e os Euangelii libri.

3.2   Proba e o centão de Vergílio In laude Christi.

 

4.     Os grandes pensadores (s. V-VI)

4.1   Boécio (ca. 480-524).

                                               i.     Conhecedor da filosofia clássica: comentários a Aristóteles, Porfírio, neoplatonismo, Agostinho. Sabia Grego; alma é anterior ao corpo; plano de traduzir toda a obra de Platão e Aristóteles.

                                              ii.     Consolatio Philosphiae: Cristianismo + Literatura + Filosofia.

 

4.2   Cassiodoro (ca. 485-ca. 585).

i.       Filho de um Prefeito do Pretório para a Itália.

ii.     Vários cargos da administração de Teodorico. Prefeito do Pretório (533-536). As Variae: cartas públicas e privadas (507-537): mostrar que o reino ostrogodo era imperial na sua prática: desejado por Deus. O modelo do ‘Romano colaborador’. Impressão de uma mesma cultura literária entre o passado e o presente; entre Romanos e Godos.

iii.    O Vivarium e as Institutiones como regra de estudo: um mosteiro para as letras no sul de Itália (Squilace). A importância da biblioteca.                

 

4.3   Gregório Magno (ca. 540-604).            

i.        Senador; patricius; prefeito da Cidade com 33 anos; monge; diácono; todas as irmãs fazem votos;

ii.       Embaixador em Constantinopla (579-585/6);

iii.     Papa (590-604): representa o imperador em Itália

iv.      Enorme influência na vida espiritual: Regula pastoralis (sobre os bispos); Dialogi (sobre o monaquismo).