Sumários

Ainda o conceito de ARTWORLD.

12 Fevereiro 2020, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

Redefinições do conceito de MUNDO DA ARTE, a nossa casa, o lugar onde toda a arte habita, como um espaço sem fronteiras e sempre em aberto. Discussão sobre o conceito a partir das teses, ministradas na aula, de A. C. Danto, H. Becker, R. Moulin, G. Dixie, Umberto Eco e outros autores. O ARTWORLD e a luta pela sua humanização. A ARTE como última grande UTOPIA.



Redefinições: o carácter artístico de «movimento permanente».

10 Fevereiro 2020, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

O programa desta disciplina visa redefinir o objecto ARTE com as suas (im)precisões e dinâmicas, os seus poderes indizíveis e também fragilidades, a partir do estudo de textos, ideias e obras de duas dezenas de autores, que se recapitulam:

Teóricos da IDEA: Léon Battista Alberti -- Francisco de Holanda -- Benito Arias Montano -- Giovanpietro Bellori.
Teóricos do FORMALISMO: Winckelmann -- Giovanni Morelli
Definição AURÁTICA: Walter Benjamin
ICONOLOGIA: Aby Warburg -- Erwin Panofasky -- Ernsr Gombrich -- Georges Didi Hubermann -- Hans Belting
INCONSCIENTE CRIATIVO / PSICOLOGIA DA ARTE: Prinzhorn -- J. Dubuffet
Teóricos da SOCIOLOGIA DA ARTE / MARXISMO: Frederick Antal -- Theodor Adorno -- Nicos Hadjinicolaou
Teóricos do FEMINISMO: Griselda Pollock -- Linda Nochlin -- Filipa Lowndes Vicentre
ARTE TRANS-CONTEMPORÂNEA: Artur C. Danto -- G. Dickie -- Howard Becker -- Raymonde Moulin -- Umberto Eco.


Arthur C. Danto e o conceito de Artworld.

5 Fevereiro 2020, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

Visto que a criação ex-nihilo está reservada aos deuses - categoria em que o artista não se enquadra --- o homem comum não cria a partir do nada. Como tal, existe toda uma história por detrás de toda a criação artística. Sendo o nosso foco temporal de reflexão o período contemporâneo, e, principalmente, a arte realizada nos dias que correm, abrimos a abordagem vendo a posição que a arte tem neste mesmo período, partindo do conceito de Artworld, o “mundo da arte”, tal como o definiram e caracterizaram Arthur C. Danto e que noutros autores é completado, procurando definir a natureza da obra de arte, ou seja, chegar às determinações que vigoram hodiernamente.

“Entendo aqui, por útil, o conceito operatório (Artworld) utilizado pelo antropólogo e crítico de arte Arthur C. Danto para caracterizar as teias relacionais entre artistas, agentes, galeristas, mecenas, críticos de imprensa, fotógrafos, leiloeiros e demais promotores da indústria e do mercado das artes, técnicos de conservação e restauro, museólogos, curadores de exposições, sociólogos, historiadores de arte e os públicos.” (Serrão, 2016: 585). A partir de Danto percebemos que não existe, a priori , nenhuma barreira formal à apresentação de obras ao mundo. A categoria de Artworld tem importância maior do que as concepções de outros autores. Ela engloba em si todas as formas de arte, pois não há nada que impeça teoricamente o cruzamento das artes. A divisão de George Dickie (Public Artworld) diz-nos que cada área tem elementos e regras específicas, o que não é de todo mentira. Contudo, no pensamento hodierno essa divisão cada vez se torna mais ultrapassada. Certo está Howard Becker (Mundos da Arte) quando realça a carga de cooperação entre os vários Mundos da Arte, e através dele conseguimos vários elementos para pensar a produção artística. Ao ponto na vida prática do artista, ponto em que decide expor, chamamos: momento de exposição. O juiz só falará depois de exposto o caso; para o réu se defender tem de contratar advogado e em cooperação terão de construir os seus argumentos. O artista, antes de sair para o mundo, forma a sua identidade, busca, obtém parcerias, procura formação, desenvolve técnicas. De forma leviana se afirma que o artista pode fazer o que bem entender e só depois terá sucesso em função do mundo da arte. Interessa-nos explorar esse tempo que o artista percorre até chegar ao momento de exposição.

“…temos uma noção da organização dos mundos da arte que parte do mero bom senso: eles existem de tal modo que alguns dos seus membros são considerados pela maioria das pessoas interessadas como mais habilitados que outros para falar em nome desse mundo da arte. As pessoas interessadas são as que participam nas actividades cooperativas onde as obras desse mundo são produzidas e consumidas. Os membros deste modo habilitados podem ser considerados como tais em virtude da sua experiência, porque possuem um dom inato para reconhecer a arte, ou porque aquele é o seu trabalho e porque devem estar bem preparados para o saber. Pouco importa a razão. O que lhes permite estabelecer e afirmar a distinção é a autoridade que os participantes lhes reconhecem de comum acordo.” (Becker, 2010: 142)… Mas Howard S. Becker não deixa de seguir a mesma linha de pensamento, atribuindo a responsabilidade da reputação de um artista ao trabalho coletivo no seio dos mundos da arte: Para que as reputações se imponham duradouramente, os críticos e os estetas devem estabelecer teorias da arte e critérios que permitam reconhecer a arte, a arte de qualidade e a grande arte. Sem tais critérios, ninguém poderia formular juízos acerca das obras, dos géneros e das disciplinas que, por sua vez, determinam os juízos dos artistas. (Becker, 2010: 293).

A filosofia da arte, a estética e a teoria da arte em geral desempenham um papel de relevo no estabelecer dos critérios de Becker. No entanto, falam só do que é visto, abordam aquilo que, em diferentes intensidades, já existe e se encontra no mundo da arte. A sua teoria é muito interessante por tentar chegar ao pano de fundo do mundo da arte. Ao contrário de Danto, que filosoficamente define uma categoria universal para compreender o estado da arte no mundo contemporâneo, Becker fá-lo sociologicamente, dividindo e analisando cada parte desse mundo artístico nesta mesma era. Dessa forma, surge a pluralização: mundo(s) da arte, analisada com carga empírica forte. Para ele não existe só um mundo da arte. Becker encaixa nos mundos da arte o fabricante de lápis, o crítico, o fabricante de tintas, o pintor, o cineasta; fazendo variar o grau e o impacto da intervenção de cada entidade. Os Mundos da Arte não são só os intervenientes directos, também os indirectos têm papel relevante (Becker, 2010). O importante destas ideias é a interação entre os indivíduos e entidades que formam estes mundos, as relações que fazem a arte surgir e evoluir, como processo constante, acrescente-se: dialético, englobando muitas contradições, sendo o progresso o resultado da resolução dessas contradições.

Outro nome relevante da teoria institucional, paralelamente a Danto, George Dickie define o mundo da arte como o framework, o contexto, ao qual a obra de arte é submetida ou criada para. Ao contrário de Danto, para Dickie, o artworld é dividido em vários mundos da arte também não se pode dizer que esta divisão é a mesma de Becker. Contudo, também este autor ressalva a importância de um mundo exterior ao artista para a validação da obra de arte. Ou seja, a própria definição de obra de arte decorre dessa realidade e existe em função desse mundo: «A work of art is an artifact of a kind created to be presented to an artworld public» (Dickie, 1989: 204). E reforça a ideia: «Whenever art is created there is, then, an artist who creates it, but an artist always creates for a public of some sort» (Dickie, 1989: 201).

“Os filósofos tendem a argumentar a partir de exemplos hipotéticos, e o ‘mundo da arte’ de que falam Dickie e Danto só tem consistência necessária para garantir as suas demonstrações. Nenhum dos que participou neste debate abarcou os mundos da arte em toda a sua complexidade organizacional como se faz aqui, mesmo se o nosso ponto de vista não é incompatível com aquela tese.” (Becker, 2010: 141).O capitalismo tornou banal o conceito de “arte”: falar de mundo da arte é falar de mercado da arte. Passa a ser neste que a vida do artista se desenvolve, ou desaparece. As concepções filosóficas de Danto e Dickie são relevantes para pensar em função da teoria da arte os artistas e obras que surgem. Porém, a vida real é o mundo do homem que produz bens para sobreviver. Becker percebeu este aspecto: o artista não é excepção à regra, precisa de beber, comer, dormir, abrigar-se, comprar tintas ou rolos para a máquina fotográfica. Para o fazer na sua actividade artística, a obra ganha carácter de mercadoria.  A hierarquia da obra de arte contemporânea começa no mercado e acaba igualmente neste. Ao abranger a totalidade das determinações do mundo da arte, não nos podemos desligar de critérios mercantis e economicistas. Mesmo a teoria da arte e a crítica estão envoltas nesse espectro financeiro – não tivessem os seus agentes o poder de elevar ou rebaixar um artista.

Diga-se que a arte é uma mercadoria; feita pelo homem (Dickie e Hadjinicolaou), resultado de cooperações várias (Becker), com o intuito de integrar um mundo da arte onde é reconhecida ou não como parte do mesmo (Danto e Dickie). Não é de todo redutora esta concepção. Ao pensarmos a obra de arte como mercadoria, estamos a trazer a obra de arte para um esquema complexo, cujas regras são de

difícil percepção. O que leva à concepção de uma obra e ao reconhecimento como tal não é de todo linear, e seguem-se critérios vários consoante a posição ocupada na hierarquia dos mundos da arte. Esta hierarquia é feita, principalmente, segundo princípios financeiros. Esses princípios é que dão o estatuto e poder às várias entidades. Contudo, o inverso também não se pode afirmar como falso. Os estatutos sociais e culturais da obra de arte misturam-se com o seu estatuto económico. É em função do mercado – logo na obra de arte como mercadoria – que as liberdades e restrições artísticas devem ser refletidas, esta relação complexa dita a sua forma fenoménica, a forma como elas nos aparecem na imediatez...

Vamos ao encontro à teoria de Becker que nos diz que a produção artística depende de uma cooperação no seio dos Mundos da Arte. Esta cooperação nem sempre é pacífica, e depende de imensas condicionantes que vão fazer a obra vir à luz do dia de uma maneira e não de outra… «Também nos apercebemos de que os mundos da arte acabam frequentemente por aceitar obras que haviam rejeitado num primeiro momento. De onde se pode deduzir que a diferença não reside nas obras em si, mas sobretudo na capacidade que um mundo da arte tem de acolher as obras e os seus autores” (Becker, 2010: 196).


O conceito de Aura.

3 Fevereiro 2020, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

Walter Benjamin, o conceito de aura e a História crítica das artes

 

A autenticidade de uma coisa é a suma de rudo o que desde a sua origem nela é transmissível, desde a sua duração material ao seu testemunho histórico. Uma vez que este testemunho assenta naquela duração, na reprodução ele acaba por vacilar, quando a primeira, a autenticidade, escapa ao homem e o mesmo sucede ao segundo; ao testemunho histórico da coisa. Apenas este é certo, mas o que assim vacila é exactamente a autoridade da coisa e o que murcha na era da reprodutibilidade da obra de arte é a sua aura»…

 

Walter Benedix Schönflies Benjamin (Berlim, 1982-Portbou, 1940), crítico, jornalista, historiador de arte, cientista, filósofo, tradutor, icionólogo e sociólogo, é uma das figuras mais prestigiantes no campo da Estética, que dinamizou através do conceito de AURA para uma nova percepção teórica e sensitiva das artes. Associado desde sempre à Escola de Frankfurt, tal como George Lukács e Bertold Brecht, recebeu a influência do místico judeu Gershom Scholem. Era um profundo conhecedor da língua e cultura francesas, tendo traduzido para alemão obras como Quadros Parisienses de Charles Baudelaire e Em Busca do Tempo Perdido de Marcel Proust. Mas é no campo da Estética que o seu contributo é original. "Há um quadro de Klee intitulado Angelus Novus. Representa um anjo que parece preparar-se para se afastar de qualquer coisa que olha fixamente. Tem os olhos esbugalhados, a boca escancarada e as asas abertas. O anjo da história deve ter este aspecto. Voltou o rosto para o passado. A cadeia de factos que aparece diante dos seus olhos é para ele uma catástrofe sem fim, que incessantemente acumula ruínas sobre ruínas e lhas lança aos pés". (Gesammelte Schriften, I, 2, "Über den Begriff der Geschichte", p. 697 (O Anjo da História, Obras escolhidas de Walter Benjamin, trad. João Barrento, Assírio & Alvim, Lisboa, 2010).

Sobre a famosa aura, escreveu na A Obra de Arte na Era da sua Reprodutibilidade Técnica: «A singularidade é idêntica à sua forma de se instalar no contexto da tradição. Esta tradição, ela própria, é algo de inteiramente vivo, de extraordinariamente mutável. Uma estátua antiga de Vénus, por exemplo, situava-se num contexto tradicional diferente, para os gregos que a consideravam um objecto de culto, e para os clérigos medievais que viam nela um ídolo nefasto. Mas o que ambos enfrentavam da mesma forma era a sua singularidade, por outras palavras, a sua aura»…O talento analítico de Benjamin expressou-se no modo como soube entrever relações entre tudo o que parecia disperso e amalgamado, numa capacidade de perceber as relações, afinal estreitas e clarificantes, entre a matéria bruta e o imaginário da produção de bens de consumo. São valores de longa sobrevivência, que interessam à prática da História e da Crítica das Artes e que explicam os mecanismos paragonais de gosto e de repulsa, de marginalidade e de massificação, de deriva repressiva e de ruptura vanguardística.

As novas gerações de historiadores e críticos de arte da era da globalização aprendem com estas lições oriundas da esfera da sociologia da arte, a psicologia, a antropologia e a filosofia marxista e que se tornam de utilidade para a definição da disciplina. A História-Crítica da Arte, ao mostrar utilidade perene, ao falar das obras em aberto (como as definiu Eco), progrediu de modo significativo no contexto de um mundo em globalização. Alargou capacidades de análise, recentrou interesses regionais, atraiu jovens investigadores, disponibilizou apoio dos poderes instituídos, redefiniu objectos de estudo no enfoque micro-artístico, amadureceu a visão patrimonialista sem antigas peias auto-menorizadoras, e reforçou esse seu entendimento (que só ela pode ter…) do discurso da arte como um fenómeno que é em todas as circunstâncias inesgotável e por isso trans-contemporâneo.

O fio de pensamento une os textos, que se agrupam sob o título O Anjo da História relaciona-se com a paixão de Benjamin por um quadro de Paul Klee, Angelus Novus. Gershom Scholem, seu amigo e biógrafo, conta que Benjamin adquiriu a obra de Klee em 1921 e diz que o amigo considerava a obra como uma sua possessão. O quadro de Klee tornou-se imagem obsessiva, expressão de uma certa visão da História, sem falar nas implicações talmúdicas da angelogia judaica, alegorizava a ideia da ruína e catástrofe. Essa concepção benjaminiana da catástrofe já aparece na obra A Origem do Drama Barroco, como percepção lúcida da falência do paradigma da concepção da História como progresso, insuflada pela visão contínua da temporalidade dos factos históricos. O olhar de Benjamin desespera nessa percepção falseada da realidade, em que a ilusão do progresso norteia toda a concepção da História na sua época. Para WB é preciso interromper a catástrofe, romper com a ilusão do Progresso e despertar para outra concepção da História, capaz de redimir a injustiça e despertar a débil força messiânica que existe em cada geração: despertar para outra dimensão da História, em que o passado surja metamorfoseado pela luz da redenção messiânica, mas também para outra dimensão da temporalidade, a do instante do Agora (Jetzt). Ora, esse é precisamente o "momento revolucionário", que rompe o contínuo da história e da visão da história entendida como sucessão e continuidade, a única, assim, capaz de interromper a catástrofe imparável.

No textos Sobre a crítica do poder como violência e Fragmento teológico-político, de 1919/1920, o que é claramente anunciado é o poder revolucionário e instaurador de uma nova ordem de valores que a interrupção messiânica comporta a partir de si. No primeiro é a interrupção do Direito humano a favor da instauração violenta do Direito divino, pois só esse funda a verdadeira justiça." Também no texto "Fragmento teológico-político", é a interrupção da ordem profana e o seu contínuo que opera a restitutio in integrum espiritual, isto é, fazendo surgir, através da dissolução do profano, a verdadeira ordem messiânica. Essa ideia, de uma ordem messiânica, é algo que se esbaterá nos anos seguintes da obra de Benjamin, que descobre o materialismo dialéctico em 1924, ao conhecer Asja Lascis. Só mais tarde regressará à sua visão messiânica da História. A obra deste genial pensador judeu de formação marxista combina ideias só na aparência antagónicas, desde o idealismo alemão ao materialismo dialéctico e ao misticismo judaico, e constitui um contributo fundamental para a Estética, com títulos como A Obra de Arte na Era da Sua Reprodutibilidade Técnica (1936), as Teses Sobre o Conceito de História (1940) e a inacabada Paris, Capital do século XIX, enquanto A Tarefa do Tradutor constitui desde sempre referência incontornável dos estudos literários. O Projeto de Arcades (Passagenwerk), mais de mil pp. (1927-1939) com notas, citações, artigos curtos, recortes, imagens e fragmentos em justaposição sobre os Arcades parisienses do século XIX (centros comerciais cobertos) é também uma obra de referência.

Walter Benjamin faleceu em 1940, em Portbou, na fronteira espanhola, fugitivo da barbárie nazi. Suicidou-se após recusa de obter passaporte após passar pela França ocupada. A sua epistolografia final sintetiza bem o modo como a análise marxista e o misticismo se interligam para entender os modos de intersecção das artes e tecnologia, a luta de classes e a consciência libertária dos homens, incluindo a dimensão de transcendência. WB analisou de modo pioneiro o Cinema e a Fotografia, os media, e deixa obra imensa, só postumamente publicada. «Para se ser feliz, há que ser capaz de tomar consciência de si mesmo sem medo», escreveu… WB tinha o ensaio A Obra de Arte na Época de sua Reprodutibilidade Técnica na conta de primeira grande teoria materialista da arte. O texto centra-se na análise das causas e consequências da destruição da aura que envolve as obras enquanto objectos individualizados, únicos. Com o progresso das técnicas de reprodução, sobretudo do Cinema e da Fotografia, a aura dissolve-se nas várias reproduções do original, destituindo a obra de arte do seu status de raridade. Para Benjamin, a partir do momento em que a obra fica excluída da atmosfera aristocrática / religiosa que a tornam uma peça de eleição e objecto de culto, a dissolução da aura atinge dimensões sociais. Essas dimensões são o resultado da estreita relação existente entre as transformações técnicas e as da percepção estética.

A perda da aura e as consequências daí resultantes são muito sensíveis no Cinema, onde a reprodução de uma obra de arte carrega a possibilidade de uma radical mudança qualitativa na relação das massas com a arte. Embora o cinema, diz WB, exija o uso da personalidade viva do homem, este priva-se de sua aura; se, no Teatro, a aura de um Macbeth, p. ex., se liga indissoluvelmente à aura do actor que o representa, tal como essa aura é sentida pelo público, o mesmo não ocorre no Cinema, onde a aura do intérprete desaparece com a substituição do público pelo aparelho. Na medida em que o actor se torna acessório da cena, não é raro que os próprios acessórios desempenhem o papel de actores. Benjamin considera que a natureza vista pelos olhos difere da que é vista pela câmara: esta, ao substituir o espaço onde o homem age por outro onde sua acção é inconsciente, possibilita a experiência do inconsciente visual, tal como a prática psicanalítica possibilita a experiência do inconsciente instintivo. Exibindo a reciprocidade de acção entre a matéria e o homem, o Cinema seria de valia inestimável para o pensamento materialista. Adaptado adequadamente ao proletariado, que se prepararia para tomar o poder, o Cinema tornar-se-ia, em consequência, portador de uma extraordinária esperança histórica.

A análise de Benjamin mostra que as técnicas de reprodução das obras de arte, ao provocarem a queda da aura, promovem a liquidação do elemento tradicional da herança cultural; mas, por outro lado, esse processo contém um germe positivo na medida em que possibilita um outro relacionamento das massas com a arte, dotando-as de um instrumento eficaz de renovação das estruturas sociais e da sua consciência. Trata-se de uma postura optimista, objecto de reflexão crítica por parte de Adorno.

Actualmente a obra de Benjamin exerce grande influência, p. ex., em G. Agamben, no que toca ao conceito de Estado de excepção. O texto Teorias do Fascismo Alemão, de 1930, pressente a iminência do nazismo na Europa. A sua visão da História pretende-se como um antídoto face ao que pressente, pois percebeu que o optimismo da visão progressista oculta o hediondo rosto do fascismo alemão. Por isso, a visão benjaminiana da História, o seu pessimismo, associa-se ao sentimento de uma melancolia revolucionária que procura uma saída de emergência: "Marx diz que as revoluções são a locomotiva da história universal. Mas talvez as coisas se passem de maneira diferente. Talvez as revoluções sejam o gesto de accionar o travão de emergência por parte do género humano que viaja nesse comboio." (Arquivo Benjamin, mss. 1100). Trata-se de procurar um gesto ético que interrompa a catástrofe e abra passagem para uma outra compreensão da História: redespertar a força do passado no presente e devolver a glória aos vencidos da História. O Anjo espera esse momento redentor, pese o vendaval do Progresso que o arrasta "imparavelmente para o futuro“...

A obra de Benjamin reúne conceitos que têm provocado uma série de respostas, incluindo as de Jacques Derrida que, como nas suas leituras onde cuidadosamente reproduz textos de Benjamin, se destacam os aspectos místicos e a afirmação magnífica da alteridade absoluta. O princípio messiânica de Derrida defende que cada momento do tempo apresenta oportunidade única, revolucionária. Franz Rosenzweig, Gerschom Scholem, Hannah Arendt, Franz Kafka, Paul Celan, Emmanuel Levinas, Jacques Derrida, assumiram papel importante na tradição do pensamento judaico no século XX. A concepção materialista da História enriquece a perspectiva marxista de Benjamin e, bem assim, de Theodor Adorno e Max Horkheimer (e a Escola de Frankfurt, em geral), bem como de Georg Lukács e Bertold Brecht, com protagonismo na tradição da estética do século passado. A tradição da Filosofia alemã de Immanuel Kant, incluindo os românticos alemães (de Goethe aos irmãos Schlegel), FWJ Schelling e GWF Hegel, sem esquecer Edmund Husserl e o seu discípulo Martin Heidegger, mostra paralelos com o trabalho de W. Benjamin. As principais preocupações de Benjamin giraram em torno da compreensão dos problemas sociais e culturais da chamada era do alto capitalismo, consequência imediata da passagem do capitalismo industrial no início do século XX. Por isso, os temas tratados por si dão ideia da modernidade (com início na Renascença); a passagem da cultura burguesa do século XIX para o urbanismo do século XX; as problemáticas da arte e dos seus mercados e gostos (clássico, capitalista, burguês); a escrita (de crítica à jornalista); as minúcias do mundo quotidiano que emerge da 1ª grande guerra; a tecnologia no contexto da guerra; a urbanidade e o urbanismo; a infância; os sonhos; os anúncios e cartazes da publicidade, os panfletos, jornais, espaços (quartos, ruas, mapas) e edifícios em franca relação com a cidadania. Por close-ups das coisas que estão em nosso redor, concentrando-se em detalhes ocultos de objectos familiares, explorando ambientes comuns, sob a orientação engenhosa da câmara, o filme amplia, por um lado, a nossa compreensão das necessidades que governar as nossas vidas; por outro lado, consegue assegurar-nos um imenso campo de acção. Os nossos bares e as nossas ruas metropolitanas e os nossos escritórios e quartos mobilados, as estações de trem e as fábricas das cidades parecem ter-nos irremediavelmente presos. Depois veio o filme e explodiu nesta prisão-mundo em pedaços através da dinamite do décimo de segundo, pelo que, agora, no meio de longínquas ruínas e destroços, calmamente reaprendemos a viajar. Com o close-up, o espaço expande-se em câmara lenta, o movimento é ampliado. O alargamento de um instantâneo torna mais preciso o que, em qualquer caso, já era visível mas menos claro; revela inteiramente as novas formações estruturais de um tema qualquer… (Walter Benjamin, Illuminations, 236).

 

"The uniqueness of a work of art is inseparable from its being embedded in the fabric of tradition. This tradition itself is thoroughly alive and extremely changeable. An ancient statue of Venus, for example, stood in a different traditional context with the Greeks, who made it an object of veneration, than with the clerics of the Middle Ages, who viewed it as an ominous idol. Both of them, however, were equally confronted with its uniqueness, that is, its aura. Originally the contextual integration of art in tradition found its expression in the cult. We know that the earliest art works originated in the service of a ritual – first the magical, then the religious kind. It is significant that the existence of the work of art with reference to its aura is never entirely separated from its ritual function. In other words, the unique value of the “authentic” work of art has its basis in ritual, the location of its original use value. This ritualistic basis, however remote, is still recognizable as secularized ritual even in the most profane forms of the cult of beauty. The secular cult of beauty, developed during the Renaissance and prevailing for three centuries, clearly showed that ritualistic basis in its decline and the first deep crisis which befell it. With the advent of the first truly revolutionary means of reproduction, photography, simultaneously with the rise of socialism, art sensed the approaching crisis which has become evident a century later. At the time, art reacted with the doctrine of l’art pour l’art, that is, with a theology of art. This gave rise to what might be called a negative theology in the form of the idea of “pure” art, which not only denied any social function of art but also any categorizing by subject matter. (In poetry, Mallarme was the first to take this position.)

An analysis of art in the age of mechanical reproduction must do justice to these relationships, for they lead us to an all-important insight: for the first time in world history, mechanical reproduction emancipates the work of art from its parasitical dependence on ritual. To an ever greater degree the work of art reproduced becomes the work of art designed for reproducibility. From a photographic negative, for example, one can make any number of prints; to ask for the “authentic” print makes no sense. But the instant the criterion of authenticity ceases to be applicable to artistic production, the total function of art is reversed. Instead of being based on ritual, it begins to be based on another practice – politics."   (Walter Benjamin - The Work of Art in the Age of Mechanical Reproduction (1936).

 

O saldo de trabalho de Benjamin atinge, muitas vezes, resultados paradoxais, com tensões entre os aspectos da experiência: as experiências simultaneamente do tarde demais e cedo (muito cedo) na dimensão temporal (cf Hamlet: "o tempo é fora do comum") e ser ao mesmo tempo distante e close (dimensão espacial...; o conceito de "aura", uma das contribuições mais influentes de Benjamin, é melhor compreendido em termos destas tensões ou oscilações. Ele diz-nos que aura é uma "teia estranha de espaço e tempo" ou "uma distância tão próxima quanto possível."

A ideia principal é de algo inacessível e esquivo, algo muito valorizado, mas que é enganosa e fora do alcance. Aura, nesse sentido, está associada às noções das arte do século XIX, e é assim que Benjamin defende, com o início da fotografia, a perda gradual desse conceito. Fotografia, uma primeira tentativa de imitar a pintura, por causa da natureza da fotografia tecnologia, tomou a sua própria direcção contribuindo para a destruição de todas as noções tradicionais das artes plásticas. O selo e o livro formam as duas imagens que talvez melhor indiquem o que está em jogo. O valor enigmático de um selo para o colector é substituído pelo valor mais comum e crítico sugerido pelo conhecimento do livro, embora os livros também sejam objectos para o coleccionador. Ambos devem ser imputadas à nota de banco, que circula  num sistema de troca e não tem nenhum valor para além desse seu sistema. Por isso, o Cinema e o Filme são o que mais existe de sugestivo para Benjamin

Benjamin aborda os fenômenos de imagens em movimento no cinema e noticiário em seu ensaio de 1936 "A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica." É altamente recomendado como um dos mais clara e abrangente de todas as obras de Benjamin. É um argumento rigorosamente dialético, claramente influenciado por seu envolvimento contínuo com o marxismo e escrito com uma audiência em mente já está familiarizado com as obras de seu amigo Theodor Adorno. O pensamento dialético envolve mover-se através contrários sem nunca deixar um mandato ganho precedência sobre seu outro ou aparente pensamento oposto como a maioria de oposição tende a fazer. Na dialética cada termo só tem significado em relação ao seu contrário aparente ou outro. Benjamin começa por assumir o princípio essencial do materialismo dialético, que afirma que os meios de produção determinam a natureza da produção cultural, ou, mais tecnicamente, a infra-estrutura determina a superestrutura. No entanto, ele passa a mostrar que a superestrutura muda muito mais lentamente do que a infra-estrutura, com o efeito que os fenômenos culturais sempre atrasadas em relação as condições que os produzem. Por esta razão, ele está observando as condições de cultura presente no momento da sua primeira desenvolvimento e com um olho para o presente estado de produtivos (e reprodutivos) tecnologias. Seu modo de observação (como ele diz) é projetado para chamar a atenção para as mudanças nas condições de produção como forma de intervir no processo. Suas teses são, portanto, considerado como armas na guerra contra o fascismo. Dois modos de observação são considerados como modos de acção, o fascista ou reaccionário e o progressista ou revolucionário Para o modo fascista pertence a tentativa de tornar a política uma estéticas de propaganda (os comícios de Hitler e das massa fanatizadas), com ecos na arte da guerra, expressa por Marinetti e pelos futuristas. Condições técnicas / mecânicas de reprodução substituem condições anteriores de obras de arte, de produtores e consumidores. A fotografia vem a culminar gradualmente nas imagens em movimento do Cinema, e já implica cinema e o antecipa desde o início, assim como a câmara escura prefigurava no século XVI a imagem fixa da fotografia. A destruição da aura em reprodução mecânica sinaliza a passagem da obra de arte como culto (ou seja, como objecto religioso) para a obra de arte como exposição (no museu e, inevitavelmente, no cinema). As transições nesse campo ocorrem ao longo dos tempos históricos, começando pela arte rupestre (a magia), movendo-se através de iconicidade religiosa (os retábulos de altar e as catedrais), para o culto pós-renascentista de beleza. Em cada uma destas etapas o valor de culto da magia (oculto) continua a ser factor decisivo no valor ideológico da obra de arte. A etapa final envolve a transição das associações de culto residuais para o valor de exposição (contribuição gradual do capitalismo para o desenvolvimento da história do mundo). Assim, a Aura implica autenticidade, mas não há autenticidade sem a sua transformação em reprodutibilidade técnica (ou seja, a ideia de arte autêntica só surge quando a autenticidade é uma espécie ameaçada de obras de arte). Arte reprodutível substitui autenticidade com um adicional extra-inédito percepções são possíveis…

 

(notas de Vítor Serrão / 2012-13)

 

NF: Recomendo a leitura de O Passageiro Walter Benjamin, de Ricardo Cano Gaviria, romance de possibilidades, editado em português (Antígona, 2002) com trad. de Jorge Fallorca. Tudo se passa em Portbou em setembro de 1940. Após sete anos de exílio, Benjamin atravessa os Pirenéus num esforço para escapar aos nazis e tenta atravessar clandestinamente a fronteira até Lisboa (por onde passaram outros intelectuais em fuga, como Franz Werfel, Heirich Mann ou Alma Mahler) com visto para os EUA no bolso. Porém, uma trágica combinação de circunstâncias, entre as quais a conversão simbólica dos Pirinéus em muralha política, impede a entrada em Espanha. Vê-se, então, obrigado a pernoitar numa pensão de Port Bou sob vigilância da polícia que tem ordem para o deportar para França. Nessa noite, inicia uma agonia que o levará à morte vinte e quatro horas mais tarde. A tese oficial é a de que se tratou de suicídio com overdose de morfina, mas o relatório médico refere o caso como morte natural. O que terá acontecido realmente? Quién mató a Walter Benjamin? é título de documentário do realizador argentino David Mauas. O Passageiro Walter Benjamin de Ricardo Gaviria reconstitui os seus passos finais, com as sombras que descem sobre o quarto de hotel: permanece lúcido na desgraça final e morre só, sempre como um estrangeiro, mas podemos crer que no último momento viu a luz da saudade que lhe iluminou a vida, a paixão de estar despojado de tudo, a paixão da solidão que sempre o acompanhou e procurou na última morada, a brilhar no instante em que «soltou suspiro de alívio através dos seus olhos de míope»…

 

 

 


Arte, Memória, Desmemória, transmemória: problemas permanentes da teoria e da prática artísticas.

29 Janeiro 2020, 08:00 Vítor Manuel Guimarães Veríssimo Serrão

 TRANS-MEMÓRIAS: UMA NOTA SOBRE ARTE E MAÇÃS.

Em 26 de Outubro de 1929 morria em Hamburgo o grande historiador de arte Aby Warburg (1866-1929). O fundador do que se chama vulgarmente Iconologia, que é na realidade uma Antropologia das Imagens entendida como espécie de meta-psicologia das sobrevivências ('nachleben'), anotou nesse seu último dia de vida um fenómeno singular: no jardim da sua casa, uma macieira que ele julgava de há muito seca começava a gerar botões de fruto ! A esse respeito, descreveu no seu diário uma breve nota lírica sobre a sua velha árvore de frutos, cujas flores acabavam de irromper... E morreu, deixando na mesa de trabalho mais essa lição: quando menos se espera, a arte da memória cria por vezes botões, isto é, renova a os seus rebentos frutíferos. Assim se passa com os artista, reinventores de tempos, de aporias, de fábulas crónicas e de fragmentos memoriais perdidos. No ensaio Essayer Voir (2014), tão sugestivo como sempre, Georges Didi-Hubermann evocou as imagens da série 'Apple T', video-projecções de Miroslaw Balka, artista polaco (n. 1958) cuja obra é percorrida pelas memórias traumáticas dos campos de extermínio de Treblinka e Auschwitz. Essas imagens, fragmentos de sítio onde nascem maçãs por entre a vegetação sem memória, são o fermento com que o artista pretende rasgar o sentido dos tempos (mais do que decifrar os sinais históricos), assumindo a busca identitária através de uma criação feita nos limites do teórico e do poético. Mostra-se mais uma vez como as obras de arte -- e a História da Arte que as estuda -- só fazem sentido vistas numa dimensão afectiva, antropológica e trans-contextual. Como diz Didi-Huberman, na senda de Aby Warburg, «la raison, l'art, la poésia, ne nous aident sans doute pas à déchiffrer le lieu d'où ils ont été bannis, mais ils nous démeurent nécessaires, et même vitaux, pour le déchirer». Belo elogio, sem dúvida, sobre esta nossa senda através de parcelas floridas de humanização -- que é a terra em que a arte reside. Tal como esta história de maçãs renascentes ajuda a lembrar...

 

Textos para reflexão:

 

1º texto:

A noção de PROGRAMA ARTÍSTICO é o objectivo fundamental de uma História de Arte moderna, actuante, útil, operativa, socialmente comprometida. Como disse Warburg, «a História da Arte mais não é do que a investigação orientada e sempre interdisciplinar que visa o entendimento globalizante (estético, histórico, ideológico, contextual, etc) das obras de arte particulares à luz da compreensão dos seus ’pontos de vista’ intrínsecos, isto é, das condições culturais, políticas, socio-económicas, laborais, de perdurações e continuidades, de ideologias, etc – numa palavra, «o entendimento iconológico das obras» (ABY WARBURG, 1866-1929)

 

2º texto:

«A SINGULARIDADE é idêntica à sua forma de se instalar no contexto da tradição. Esta tradição é, ela própria, algo de inteiramente vivo, de extraordinariamente mutável. Uma estátua antiga de Vénus, por exemplo, situava-se num contexto tradicional diferente, para os gregos que a consideravam um objecto de culto, e para os clérigos medievais que viam nela um ídolo nefasto. Mas o que ambos enfrentavam da mesma forma era a sua singularidade, por outras palavras, a sua AURA». Pretende-se entrever aqui as relações entre tudo o que parecia disperso e amalgamado, numa capacidade de perceber as relações, afinal estreitas e clarificantes, entre a matéria bruta e o imaginário da produção de bens de consumo. (WALTER BENJAMIN, A Obra de Arte na Era da sua Reprodutibilidade Técnica, 1936).

  

3º texto:

«Diz o gramático indiano ao barqueiro: sabes gramática? E quando este responde que não, ele diz-lhe: perdeste metade da tua vida. Diz o barqueiro ao gramático, quando a barca se vira: sabes nadar? e quando este responde que não, ele diz-lhe: então perdeste toda a tua vida. Mas o que poderia haver de melhor que um gramático que soubesse nadar e um barqueiro que percebesse de gramática?» (UMBERTO ECO, Sobre os Espelhos e Outros Ensaios, Difel, Lisboa, 1989, p. 52). Esta história retomada por Eco serve a abordagem da obra de arte, com base nas imagens artísticas privilegiadas, num autor como OMAR CALABRE, ao longo de sete capítulos reunidos no livro Como se Lê uma Obra de Arte, com olhares complementares incluindo a apreciação estética e o entendimento global das obras de arte, englobando as suas características específicas enquanto objecto estético, as mutações dos valores estéticos e os juízos de valor subjacentes na apreciação do observador/receptor/usufruidor.